A indústria de construção naval no Brasil e a importância de uma visão estratégica

1-O início

A indústria de construção naval no Brasil remonta aos tempos coloniais, período em que os portugueses transformaram a empírica “marinharia medieval” em uma ciência que permitia navegar com relativa segurança.

A posição geográfica e estratégica do Brasil em relação à rota da Índia e a grande disponibilidade de madeira de boa qualidade foram os elementos necessários para a instalação de estaleiros tanto para reparação de embarcações como para projeto e construção naval.

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O mais importante estaleiro, até meados do Século XIX, foi o Arsenal da Marinha da Bahia, em Salvador, fundado por Thomé de Souza. Ao ser instalado em 1549, veio de Portugal um grupo de artífices especializados em construção naval.

A construção naval no Brasil beneficiou-se pela padronização estabelecida pela Junta das Fábricas da Ribeira (estaleiro de Lisboa), que estabeleceu proporções e regras simples de construção, facilitando o projeto de peças dos mais variados tipos de embarcação.

Em 1666, surge na ilha do Governador uma Fábrica de Fragatas, situada na ponta do Galeão. Nela foi construída a nau Padre Eterno, por volta de 1670, tida como o maior navio existente no mundo. Crescia a indústria naval brasileira com estaleiros particulares, como o que existia em 1711, em Cananéia e no Rio de Janeiro.

Na transferência da capital federal da Bahia para o sudeste, cria-se em 1763, o Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro até, e cuja primeira construção foi a nau S. Sebastião, de 1767, responsável pelo considerável impulso à construção naval. Outros Arsenais da Marinha foram organizados pelo governo português no litoral brasileiro, em Recife e Belém.

Em 1846, Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, inaugurou o primeiro estaleiro do País, na Ponta da Areia, Niterói (RJ). Construído com capital privado de terceiros em uma modelagem de captação estilo Project Finance.

O estaleiro foi considerado como um marco importante do processo de industrialização do país. Construiu cerca de um terço dos navios de guerra utilizados no conflito com o Paraguai. Em 1905 o estaleiro foi incorporado pela CCN – Cia. Comércio e Navegação.

Formação do parque industrial

A construção naval com parque industrial moderno ocorre no governo do presidente Juscelino Kubistchek (1956-1961) que cria O Plano de Metas, que

implantou a indústria automobilística, construiu a malha rodoviária e implantou a indústria de construção naval.

A política de desenvolvimento da indústria naval brasileira teve seu ponto de partida com a Lei 3.381, de abril de 1958, Lei do Fundo de Marinha Mercante (FMM) , criada com o objetivo de prover recursos para a renovação, ampliação e recuperação da frota mercante nacional; evitar a importação de navios; diminuir despesas com afretamento de navios estrangeiros; assegurar a continuidade das encomendas de navios e estimular a exportação de embarcações.

A indústria naval seria para o Rio de Janeiro o que a indústria automobilística foi para São Paulo. Na época foram criados o Grupo Executivo da Indústria de Construção Naval (GEICON) e a Comissão de Marinha Mercante (CMM) que, viria a se transformar na Superintendência Nacional de Marinha Mercante (SUNAMAM).

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Planos de construção naval

Em 1967 tem início o governo Costa e Silva com um novo ciclo de investimentos em infraestrutura. Foram criadas políticas específicas para o desenvolvimento do setor naval, o Plano de Emergência de Construção Naval (PECN: 1969 a 1970) e os dois Programas de Construção Naval (I PCN: 1971 a 1974; II PCN: 1974 a 1980).

Os armadores tinham acesso aos financiamentos e subsídios sob a condição de concordarem com as especificações dos navios, orientadas pela SUNAMAM.

Foram protegidos da concorrência internacional através das chamadas conferências de frete, que dividiam o transporte de cargas bilateral de longo curso entre as empresas de bandeira brasileira (40% do volume do frete), as da bandeira estrangeira (40%) e o mercado livre (20%).

Foi o período em que o Brasil se tornou o segundo maior construtor naval mundial. Os estaleiros com suas carreiras repletas de encomendas de navios através dos planos de construção naval.

A crise dos anos 1980

Em 1981, o País assiste à primeira recessão econômica desde o pós-guerra.

O Plano Permanente de Construção Naval (PPCN: 1981-1983) foi lançado, para inverter a tendência de depressão econômica. Sob o PPCN os armadores teriam mais poder de decisão sobre quanto investir e especificações dos navios.

A SUNAMAM apresentava com fortes dificuldades financeiras desde o final da década de 1970.Situação foi agravada pelo aumento de custos de produção.

Em 1983, a gestão financeira dos contratos de financiamentos à construção naval passa para o BNDES. As operações são enquadradas pelo Conselho Diretor do FMM e a aprovação dos financiamentos fica sob a responsabilidade do Ministério dos Transportes.

Em 1987, a SUNAMAM foi extinta. A concessão de prioridades aos projetos financiáveis passou a ser atribuição do conselho diretor do FMM, com a diretoria do BNDES aprovando os financiamentos.

A desregulamentação do transporte marítimo

O ano de 1990 marca a liberalização do transporte marítimo de longo curso que expôs os armadores brasileiros à concorrência internacional. Ficou claro que as empresas locais não tinham porte para enfrentar grandes operadores em escala mundial.

Apesar de criticada a desregulamentação ocorrida no governo Collor tornou concreta uma situação que já ocorria na prática desde 1985. As encomendas dos armadores internacionais cessaram juntamente com os subsídios à produção. O ciclo que levou a construção naval brasileira ao posto de segundo parque industrial naval mundial, em toneladas de porte bruto (TPB) construídas, e a empregar diretamente mais de 40 mil trabalhadores, chegou ao fim

A indústria naval se volta para a logística do petróleo

A Lei do Petróleo (Lei 9.478/97, de 06 de agosto de 1997) abriu o mercado

de exploração e refino do hidrocarboneto a novos operadores além da Petrobras, acelerando a expansão da exploração off-shore.

A Petrobras liderou o mercado de contratação dos serviços de embarcações de apoio marítimo (especialmente PSV, AHTS e LH) no início da década de 2000 via licitações, como resultado de articulação política realizada pela Associação Brasileira de Empresas de Apoio Marítimo (ABEAM) e estaleiros, a Petrobras passa a exigir que os navios de apoio marítimo fossem de bandeira brasileira, em um mercado em que 70% de embarcações de bandeira estrangeira.

O programa Navega Brasil, lançado pelo governo federal em novembro de

2000, trouxe modificações nas condições do crédito aos armadores e estaleiros. As principais mudanças introduzidas envolvem o aumento da participação limite do FMM nas operações da indústria naval de 85% para 90% do montante total a ser aplicado nas obras e o dilatamento do prazo máximo do empréstimo, de 15 para 20 anos.

A carteira de encomendas lotada de estaleiros mundiais favoreceu a decisão da Petrobras de criar a alternativa local para a construção dos novos navios tipo PSV. Navios tecnologicamente concebidos para operação de apoio à exploração e produção de petróleo em águas profundas.

Em 2003, o governo determina a prioridade para estaleiros locais de navios e equipamentos de exploração e produção de petróleo pela Petrobras. A Transpetro lança o Programa de Modernização e Expansão da Frota, licitando petroleiros de grande porte em estaleiros locais.

Os estaleiros em fase de reativação ingressam em fase de consolidação e expansão. Grandes grupos empresariais brasileiros investem na construção de novos estaleiros.

Plataformas de petróleo

As plataformas de petróleo, um importante segmento de mercado da indústria de construção naval, foram construídas no Brasil de forma gradativa, para atender as descobertas de petróleo na bacia de Campos (RJ).

No início as plataformas eram fixas, com suas pernas apoiadas no leito do mar em profundidades de 100 a 200 metros. A primeira plataforma, a P-1, foi construída em 1968 no Estaleiro Mauá, em Niterói (RJ).

Fomentou o Governo a instalação de novos estaleiros, através de uma política de reserva de construção local de até 70%. A construção a P-63, foi construída no estaleiro QUIP, no Rio Grande (RS).

Novas regras de construção local

Os custos de construção e reparação naval ficaram exorbitantes, e a regra de obrigatoriedade de construção local foi sendo contestada, e hoje é zero, ocasionando praticamente o fechamento da indústria naval brasileira. E hoje estamos na era do pre-sal, momento histórico de extrema relevância, onde teremos construções de plataformas de petróleo e descomissionamento de ativos offshore fixos e móveis.

Atualmente a construção e a reparação vivem das embarcações de apoio marítimo, construção de balsas e empurradores, na Amazônia e no centro-oeste. O mercado é de porte médio e não é adequado para estaleiros de grande porte, que estão à busca de oportunidades de novos negócios.

Ausência de visão estratégica na construção e reparação naval

Como o segmento foi sempre muito apoiado por políticas públicas, os estaleiros pouco se utilizaram de ferramentas capazes de auto avaliação de análise do negócio, ou seja, de ver as realidades, as transformações e as mudanças que estavam impactando ou que impactariam, preferindo manter o status quo, muito confortável, sem observar inovações, e novas práticas.

Claro que se trata de um processo de muita dificuldade, pois a construção naval se implantou e se consolidou através de uma cultura, com pouco espaço para se pensar o novo.

A realidade empresarial tem incorporado termos novos para nomear fatos antigos, porem com a roupagem da modernidade.

Creio que é chegado o momento de se utilizar a gestão do conhecimento, as tecnologias, a logística, através de uma Universidade Corporativa da Industria Naval, para se repensar o futuro, face a infraestrutura multifacetada deste importante segmento nacional e internacional.

O que está por suporte deste novo enfoque seria colocar a Academia a serviço da Industria, onde apenas a engenharia naval não é suficiente para solucionar as necessidades do mercado, que impõe:

- Processos de elevada produtividade,

- Infraestrutura do País para promover a competitividade internacional,

- Estudos complexos sobre a parte fiscal e tributária do segmento,

- Relocalização de estaleiros e criação de Polos Navais, onde o compartilhamento de atividades não competitivas aponta no caminho da redução de custos,

-Analise dos espaços disponíveis por grandes empreendimentos visando a instalação de novos negócios integrados que visem melhoria da produtividade e do lucro,

-Necessidade de se aplicar a modelagem digital, com objetivos de aumento da produtividade,

-Analise do desenvolvimento de novos equipamentos navais,

-Analise dos alternativos energéticos para a propulsão dos navios, e com visão na sustentabilidade,

-Analise e estudos mercadológicos para que estes grandes empreendimentos navais possam ter atividades multisserviços.

Ronald CarreteiroEng. Prof. Ronald Carreteiro - diretor-presidente da Rona Assessoria Comercial



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