O navio de passageiros SS United States foi um dos navios mais rápidos do mundo, tendo cruzado o Atlântico em apenas 3,4 dias – de Southampton/Inglaterra até Nova York/EUA – no dia 3 de julho 1952, alcançando incríveis 42 nós (77km/h) de velocidade média!
Até a crise do petróleo em 1973 vários outros navios, também bateram recordes de velocidade, queimando muito combustível para entregar tempos de viagem (transit times) mais curtos.
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Faz alguns anos, contudo, que as preocupações com as emissões de CO2 e GEE (gases do efeito estufa) vêm crescendo em várias partes do mundo na esteira do aquecimento global e das catástrofes climáticas cada dia mais severas e recorrentes.
Com isso, no transporte marítimo, cada vez mais se ouve falar em “ecospeed”, “low speed” ou “slow steaming“, uma prática que reduz o consumo de combustível do navio entre 10% e até 50% que, consequentemente, também reduz a emissão de CO2 por milha transportada, sobretudo em viagens mais longas. Especialistas estimam que reduzir a velocidade em 10% pode reduzir a emissão de um navio em até 20%.
Hoje em dia muitos graneleiros já andam com “ecospeed” de 12,5 nós (23km/h), ou seja, aquela mesma viagem entre Southampton e Nova York – 3.200 milhas – levaria 11,4 dias assumindo as velocidades médias praticadas atualmente por navios graneleiros. Já uma viagem mais longa de Santos para Shanghai – 11.050 milhas via Cabo da Boa Esperança, demandaria 37 dias com essa velocidade, ou cerca de 31 dias se a velocidade passasse para 15 nós! O portal “Splash 247” inclusive publicou recentemente um artigo interessante sobre esse assunto (Deep sea cargo fleet moving at record low speeds).
De acordo com a Clarksons Research Institute, desde 2008 os navios de diferentes tipos e portes reduziram as velocidades médias em torno de 20% a 30%, tendo ficado abaixo de 12,5 nós no primeiro trimestre de 2025, após uma consistente tendência de queda nas velocidades nos últimos 5 anos, conforme demonstrado no gráfico seguinte.
O levantamento da Clarkson também demonstra que os navios porta contêineres e os LNG Carriers foram os únicos que aumentaram a velocidade em 2024, e isso por conta dos conflitos no Mar Vermelho que tornaram as viagens desses navios mais longas pelo sul da África e, ainda, geraram atrasos e congestionamentos em alguns dos principais terminais do mundo.
Já o gráfico seguinte mostra que os navios porta contêineres ainda praticam velocidades (16 nós, ou 29km/h) um pouco acima da média das demais, apesar da tendência de queda bastante alinhada aos outros.
Parte dessa diferença na velocidade se deve ao fato dos navios porta-contêineres virem investindo mais que os demais em novas tecnologias (catalisadores/scrubbers, desenho/tinta de casco, motores mais eficientes e combustíveis alternativos) e em embarcações maiores (um navio de 10.000teu consome menos combustível – e emite menos CO2 – que dois navios de 5.000teu). Ou seja, os outros tipos de navios estão precisando reduzir mais suas velocidades, para conseguir reduzir suas emissões.
Contudo um outro dado mapeado pelo Alphaliner também reforça algo mencionado na matéria do “Splash 247”: a correlação cada vez mais forte entre a velocidade dos porta-contêineres e o SCFI (principal índice global referente aos fretes spot do contêiner).
Ou seja, além de ajudar o meio ambiente e cumprir com as novas exigências do IMO 2023 (CII – Carbon Intensify Indicator), as velocidades mais baixas também ajudam a absorver capacidade ociosa e regular a oferta e a demanda, “num cenário de (muita) competição entre os armadores”, conforme mencionado na matéria do “Splash 247”.
Por outro lado, para os donos de carga viagens mais longas significa aumento no estoque em trânsito e, consequentemente, no custo de inventário. Na rota Brasil <> Europa, por exemplo, as viagens demoravam entre 35 e 42 dias (demandando 5 ou 6 navios para oferecer um serviço semanal), enquanto atualmente essas viagens demoram entre 56 e 70 dias (demandando de 8 a 10 navios por serviço).
Em outras palavras, as altas velocidades e os transit times “curtos” se tornam coisa do passado a medida que a velocidade média dos navios passa a exercer um papel cada vez mais importante na redução de emissões de CO2 e na regulação da oferta x demanda. E os donos de carga precisam se atentar a isso!
Henrik Simon e Leandro Barreto são sócios da Solve Shipping Inteligence