Mais um ano bastante intenso no setor vai caminhando para o fim e, com isso, é chegada a hora de relembrar alguns dos principais temas abordados pelos sócios da SOLVE nesse espaço que nos é gentilmente cedido pelo time da Revista Portos e Navios.
Em 2025, tanto o setor marítimo global quanto o portuário brasileiro mantiveram performances atípicas. Enquanto os fretes voltaram a oscilar muito em todo o mundo – dessa vez em razão das idas e vindas das novas tarifas nos EUA, no Brasil a movimentação de contêineres vem sustentando o ritmo de crescimento acelerado iniciado em 2024 – o que seria bom não fosse o fato da oferta de capacidade portuária não estar conseguindo acompanhar esse ritmo.
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Exagero nenhum dizer que vivemos no setor mais um ano de incertezas, volatilidade e gargalos logísticos, também marcado por discussões relevantes sobre os impactos de eventos geopolíticos, climáticos, sanitários, transições regulatórias, pressões por sustentabilidade e transformações tecnológicas que prometem redesenhar as cadeias logísticas em todo o mundo.
Este artigo reúne algumas reflexões acerca dos principais eixos temáticos que em 2025 impactaram diretamente a rotina de exportadores, importadores, agentes de carga, armadores, terminais portuários, entre outros elos da cadeia logística.
Fretes voláteis e as intercorrências globais
Se 2021–2022–2024 haviam sido anos de “montanha-russa” dos fretes marítimo por conta dos efeitos da Pandemia (sobre a demanda) e dos ataques Houthis no Mar Vermelho (sobre a oferta de capacidade), 2025 mostrou que a volatilidade veio para ficar, dessa vez tendo como pano de fundo a nova Guerra comercial iniciada pelo Presidente Trump.
Dentre os muito desdobramentos desse evento mundo afora, o frete marítimo na rota de importação da Ásia para o Brasil quadruplicou em maio de 2025, saltando de patamares em torno de US$ 950 – em abril, após o anúncio das tarifas recíprocas dos EUA – para mais de US$ 5.000 por contêiner – em maio, após o anúncio da trégua de 90 dias nas tarifas.
Em 2025, portanto, a mensagem foi clara: cada vez mais cresce a correlação entre os fretes marítimos, as intercorrências globais e a competitividade de muitas cargas, demandando uma abordagem muito mais estratégica do que uma mera barganha entre embarcador e armador.
Capacidade portuária brasileira no fio da navalha
O crescimento acelerado da demanda nos últimos anos, combinado a demora na liberação de novos investimentos em capacidade, tem levado a capacidade de movimentação portuária ao limite em alguns dos principais portos brasileiros.
Enquanto no mundo a movimentação portuária vem crescendo em torno de 4,5% ao ano, no Brasil a movimentação cresceu 19,6% em 2024 e cerca de 10% nos primeiros nove meses de 2025.
Esse crescimento, porém, tem sido absorvido quase exclusivamente por expansões de capacidade pontuais — alongamento de cais, aumento de pátio, novos portêineres e ganhos eficiência — já que desde 2013 nenhum novo terminal de grande porte entrou em operação no Brasil. Ao contrário, players como Rodrimar, Ecoporto, São Francisco do Sul e Libra Santos acabaram não conseguindo acompanhar o ritmo de crescimento de tamanho dos navios e acabaram saindo de cena nesse mesmo período.
O descompasso entre o ritmo de crescimento da oferta e da demanda tem se traduzido em: congestionamentos, atrasos, cancelamento de escalas/viagens, rolagem de carga, racionalização de serviços e custos crescentes de pré-stacking, armazenagem, demurrage e detention.
Infelizmente vamos chegando ao final do ano com o edital de concessão do STS 10 ainda sob forte pressão dos grupos a favor e contra a licitação em etapa única ou em duas etapas (no momento em que escrevemos o processo foi para análise do plenário do TCU em 18 de novembro, quando o relator propôs leilão em etapa única, com desinvestimento para operadores atuais e o revisor defendeu leilão em duas fases. Diante do impasse a votação foi adiada e, com isso, o leilão só deve acontecer em 2026).
Dragagem e acessos: o velho calcanhar de Aquiles começa a se mover
Outro eixo de discussão recorrente em 2025 foi a dragagem. A ausência de um programa nacional perene desde o início da década passada transformou o calado em um dos maiores gargalos dos principais portos brasileiros, especialmente diante do aumento do trânsito de navios de 366 metros de comprimento e 16 metros de calado pela costa brasileira.
A boa notícia é que, em 2025, esse tema parece ter começado a “andar”:
- Em Paranaguá a participação ativa de muitos interessados no inédito leilão de concessão do canal de acesso demonstrou a consistência da modelagem e o apetite dos investidores. O contrato de 25 anos prevê que o consórcio vencedor se comprometa a elevar o calado dos atuais 13,3 metros para 15,5 metros nos próximos cinco anos. O sucesso desse leilão deve abrir caminho para que esse modelo seja replicado em outros portos (Itajaí, Santos, Rio Grande etc);
- Na Baía da Babitonga, a dragagem e retificação da curva do canal de acesso está sendo realizada por meio de uma PPP entre o Porto de São Francisco do Sul e o Porto Itapoá, que prevê cerca de R$ 300 milhões em investimentos com a promessa de permitir o atendimento regular de navios de 366 metros e até 16 metros de calado. A conclusão da obra, que vem aproveitando os sedimentos retirados do canal para alargar a praia de Itapoá, está prevista para o segundo semestre de 2026;
- O Porto do Rio de Janeiro recebeu um investimento de R$ 163 milhões da PortosRio para ampliar o calado para 15,30 metros, permitindo uma otimização da utilização da capacidade de navios de grande porte;
- O Porto do Rio Grande está sendo dragado para retomar o calado original de 15 metros, que foi reduzido como consequência das enchentes de 2024. O investimento, de R$ 432 milhões, será custeado com recursos do Fundo do Plano Rio Grande (Funrigs);
- Em Santos, foi lançado edital para aprofundamento do canal de navegação de 15 para 16 metros, com perspectiva futura de atingir 17 metros quando o Canal de acesso for concedido nos mesmos moldes de Paranaguá;
- Em Itajaí/Navegantes, foi enviado ao TCU o projeto de concessão da dragagem e da gestão do canal de acesso, com o objetivo declarado de viabilizar navios de até 400 metros no médio prazo;
Ou seja, 2025 poderá ser lembrado como o ano em que houve, finalmente, um pipeline mais coeso de iniciativas de dragagem estruturadas por contratos de longo prazo, e não por “operações tapa-buraco”.
Descarbonização: avanço técnico, impasse político
No front climático, 2025 ficará marcado por um paradoxo.
Em junho, nosso artigo “O shipping, a descarbonização e o Brasil” analisou os desdobramentos da MEPC 83, quando os delegados da IMO aprovaram o texto do Net-Zero Framework — um pacote de medidas que combina metas mandatórias de intensidade de emissões com um mecanismo global de precificação de carbono e implementação prevista a partir de 2027.
Já no segundo semestre, a narrativa mudou de tom. Em “E a Saga do ‘Net Zero Framework’ continua…”, descrevemos que na sessão extraordinária da IMO ocorrida em outubro acabou decidindo adiar a votação por 12 meses, por consequência da forte oposição dos Estados Unidos e membros da OPEP, que passaram a classificar a iniciativa como um “imposto global” liderado por europeus. A Reuters resumiu bem o clima, ao falar em um acordo que tende a colocar EUA e um bloco liderado pela UE em rota de colisão, com ameaças de medidas recíprocas e acusações de “exportação neocolonial” da regulação climática.
Enquanto isso, na UE a cobrança do ETS para no transporte marítimo entrou efetivamente em vigor em 2025, quando as emissões de CO₂ de navios que escalam portos europeus passaram a gerar obrigação de compra de allowances para 40% das emissões de 2024, percentual que subiu para 70% em 2025 e alcançará 100% a partir de 2026, de acordo com a Comissão Europeia.
Em síntese: tecnicamente, a descarbonização entrou na fase dos modelos, dos estudos e das primeiras obrigações financeiras; já politicamente, 2025 evidenciou as fraturas entre países que querem acelerar a transição energética e aqueles que temem perder competitividade.
Envelhecimento da frota, renovação e exigências para a infraestrutura portuária
Outro tema recorrente em nossas análises foi o envelhecimento da frota global de navios porta-contêineres e de seus impactos sobre capacidade, eficiência e emissões. Apesar da chegada aos oceanos de navios maiores e mais modernos, cerca de 13% da frota mundial ainda é composta por embarcações com idade avançada — um desafio que pressiona custos, gera riscos operacionais e pressiona as emissões de CO2.
Um iminente sucateamento de navios obsoletos e a chegada ao mercado de navios mais eficientes trará consigo implicações diretas para a infraestrutura portuária brasileira. Será necessário: aprofundar calados, reforçar berços de atracação, guindastes mais altos e com lanças mais extensas, mais gates e a modernização dos pátios dos terminais. Enfim, o transporte marítimo no Brasil só será plenamente otimizado quando os nossos portos estiverem aptos a operar “a plena capacidade” a nova geração de embarcações que está saindo dos estaleiros.
Apesar de todos esses desafios — alguns antigos, outros completamente novos — 2025 também reforçou a impressionante capacidade de adaptação e resiliência desse setor. A despeito das incertezas, o setor parece encerrar esse ano mais consciente de seus desafios e, sobretudo, mais articulado na busca de soluções estruturantes, cientes de que a logística brasileira precisa passar a ser tratada como política de Estado e não de Governo.
Que venha 2026!
Robert Grantham e Leandro Carelli Barreto são sócios da Solve Shipping Intelligence






