A decisão da siderúrgica Tata Steel Ltd. de vender suas fábricas no Reino Unido renovou a pressão sobre o governo britânico para amparar o abatido setor de aço do país, em mais um exemplo dos problemas de uma indústria global às voltas com uma inundação de aço barato proveniente da China.
A Tata Steel, conglomerado indiano que é o segundo maior produtor de aço da Europa, é dona da maioria das fábricas no Reino Unido, mas o aço importado da China e as tarifas altas de energia provocaram várias rodadas de demissões na empresa em lugares como Port Talbot, no País de Gales.
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A Tata anunciou nesta semana que vai estudar a venda de suas fábricas no Reino Unido, depois de ter constatado uma "deterioração do desempenho financeiro". Após discussões com sindicatos, a companhia já vinha tentando reduzir sua força de trabalho no país de 17 mil para 14 mil funcionários.
A situação da siderurgia faz parte do referendo marcado para junho, que decidirá se o Reino Unido vai permanecer na UE
As siderúrgicas da Europa vêm sofrendo com o colapso dos preços e o aumento das exportações do aço chinês para a União Europeia, que dobraram nos últimos dois anos, segundo dados da Agência Internacional de Estatísticas do Aço.
A produção de aço do Reino Unido recuou cerca de 18% entre 2005 e o ano passado, período no qual a UE também viu sua produção recuar 15%, afirmou a Associação Mundial do Aço.
O drástico excesso de produção da China é visto como o maior problema da indústria global do aço hoje. No ano passado, as exportações chinesas do produto subiram 22% em relação a 2014, para 100,4 milhões de toneladas, empurrando para baixo os preços e os lucros das siderúrgicas no mundo todo. Somente o Japão produziu mais aço que o volume exportado pela China.
O resultado é uma combinação de queda nos preços e demissões. Nos EUA, onde os preços recuaram 33% no ano passado, a U.S. Steel Corp. teve prejuízo de US$ 1,5 bilhão e demitiu milhares de trabalhadores.
As siderúrgicas vêm pedindo proteção aos governos dos EUA e da União Europeia na forma de tarifas de importação. Neste ano, os EUA e a UE impuseram tarifas sobre novas categorias do aço chinês. Mas os executivos das empresas querem mais ações do gênero.
A decisão da Tata de vender seus ativos na Grã-Bretanha provocou várias reações políticas, num momento em que as autoridades do país contemplam a derrocada de mais uma indústria pesada, depois das minas de carvão e dos estaleiros.
Ontem, o primeiro-ministro David Cameron alertou que pode ser difícil encontrar um comprador e salvar as maiores fábricas devido aos problemas enfrentados mundialmente pelo setor, mas disse que estatizar não é a solução.
Depois de se reunir com alguns ministros para discutir a situação, Cameron disse que o governo está preocupado com a possibilidade de a Tata fechar imediatamente sua fábrica em Port Talbot, mas vem trabalhando com a companhia para garantir que haja um processo de venda adequado.
Ele disse ainda que o governo fará todo o possível para incentivar potenciais candidatos. "Mas é uma situação difícil", disse. "Não há garantia de sucesso."
Um porta-voz da Tata confirmou que a empresa está conversando com vários interessados em partes do seu negócio no Reino Unido.
Cameron, que é do Partido Conservador, de centro-direita, disse que seu governo não descarta nenhuma medida, mas não acredita que a estatização seja a melhor resposta.
A oposição de centro-esquerda, representada pelo Partido Trabalhista e os sindicatos que o apoiam, exortou o governo a proteger a indústria siderúrgica doméstica usando fundos públicos, se necessário, e afirmou que o governo está abandonando milhares de trabalhadores cujos empregos estão em risco.
"Não basta David Cameron dizer que é uma situação difícil", disse o líder trabalhista Jeremy Corbyn. "Ele tem que agir agora para proteger o coração da indústria fabril e assumir uma fatia pública do [setor de] aço."
A situação da indústria siderúrgica entrou na pauta do referendo marcado para 23 de junho, que decidirá se o Reino Unido vai ou não permanecer na União Europeia.
Defensores da saída da UE argumentam que pertencer ao bloco deixou o país impotente para apoiar a indústria siderúrgica doméstica e resultou em tarifas de energia mais altas para os fabricantes. Eles também dizem que a UE foi incapaz de conter o alegado "dumping" do aço chinês, como é chamada a venda abaixo do custo para ganhar mercado.
Mas os partidários da permanência na UE, incluindo Cameron, ressaltam que mais da metade das exportações de aço do Reino Unido vão para o bloco e que o país teria menos poder para combater práticas injustas de comércio se estivesse sozinho.
"Se tivéssemos de fora, poderíamos muito bem descobrir que era o nosso aço que estava sendo taxado", disse o primeiro-ministro.
A indústria siderúrgica britânica vem declinando continuamente desde o seu auge, nos anos 70, representando hoje somente 0,1% do produto interno bruto do país e empregando cerca de 34.500 pessoas, segundo dados do governo. Em comparação, as montadoras, que consomem aço, respondem por seis vezes essa produção.
A Tata Steel entrou no mercado europeu em 2007, ao comprar a siderúrgica anglo-holandesa Corus Group, por US$ 12,9 bilhões, numa época em que a demanda na região estava aquecida.
Fonte: Valor Econômico/Nicholas Winning, Shefali Anand e Justin Scheck | The Wall Street Journal, de Londres