A América Latina é lar de algum dos últimos paladinos dos combustíveis fósseis do mercado, com grupos como a brasileira Petrobras e a Petróleos Mexicanos persistindo na exploração, em vez de traçar estratégias de transição para fontes de energia limpa.
A Ecopetrol, maior empresa da Colômbia, no entanto, está optando por um rumo diferente. Um dos grandes nomes no mercado de hidrocarbonetos na América Latina, a empresa deu um passo ousado e, na opinião de alguns críticos, imprudente, para afastar-se de seu negócio principal, de petróleo e gás.
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No fim de janeiro, a empresa estatal apresentou oferta, que pode chegar a US$ 4 bilhões, por uma participação controladora no grupo Isa, maior empresa de transmissão de eletricidade da América Latina. “A transição energética e a redução das emissões de carbono são fundamentais”, disse o executivo-chefe da empresa, Felipe Bayón, ao “Financial Times”, retratando a iniciativa como parte de uma transição da Ecopetrol para passar “de uma companhia de petróleo e gás a uma companhia de energia”.
O risco não é que o negócio naufrague: o Ministério das Finanças da Colômbia, seu maior acionista, também controla o Isa, com participação de 51,4%.
O risco é enfrentar a realidade de que o país tem reservas comprovadas equivalentes a apenas mais sete anos de produção. A empresa também ficaria perigosamente exposta em um mundo de preços mais baixos para o petróleo no longo prazo. Em recente estudo com 49 petrolíferas estatais pelo mundo, a Ecopetrol foi apontada como a quinta mais vulnerável se o preço do petróleo cair para menos de US$ 40 e permanecer nesse patamar, segundo a organização sem fins lucrativos Instituto de Governança de Recurso Naturais (NRGI, na sigla em inglês).
No quadro como um todo, a diversificação também é uma questão premente em termos das mudanças climática e da necessidade da América Latina de pensar além do petróleo e gás para seu desenvolvimento econômico.
Comprar a Isa daria à Ecopetrol o controle das operações de transmissão da empresa na Colômbia, Peru, Chile e Brasil, assim como o de concessões de estradas e de operações de telecomunicações, enquanto continuaria com seus projetos de extração de petróleo e gás na Colômbia, Estados Unidos e Brasil.
Ainda assim, nem todos estão convencidos da aposta da petroleira. As ações nas duas empresas caíram cerca de 5% quando a proposta foi anunciada.
Alguns analistas têm argumentado que a oferta não é motivada por uma tentativa genuína de diversificação, mas pela necessidade de dinheiro por parte de um governo com falta de recursos.
A Ecopetrol informou que a compra de uma participação majoritária no grupo Isa custará entre US$ 3,5 bilhões e US$ 4 bilhões. Planeja financiar parte do negócio emitindo cerca de US$ 2,5 bilhões em novas ações e o restante com o caixa ou o lançamento de títulos de dívida. Como a transação envolveria duas estatais, a Ecopetrol não é obrigada a estender a oferta para os acionistas minoritários.
“A realidade é que isso [a oferta pela Isa] está vindo de um governo com o dinheiro apertado”, disse John Padilla, diretor-gerente da IPD Latin America, uma firma de consultoria especializada no mercado de energia. “A Ecopetrol vai te dizer, sem dúvida, que esse não é o caso, mas é impossível não ligar os pontos.”
Bayón negou, em entrevista à Bloomberg, que o plano esteja sendo motivado pela falta de dinheiro do governo. Ainda assim, a mudança provocou surpresa. “Esse interesse em transmissão chega como surpresa, uma vez que a Ecopetrol vinha sendo enfática quanto ao foco em seus ativos principais”, disseram analistas do J.P. Morgan.
A avaliação do Citibank foi ainda mais brusca. “Não faz muito sentido para uma companhia de exploração e produção, como a Ecopetrol, investir numa companhia de transmissão.”
Por outro lado, Lisa Viscidi, diretora do programa de mudanças climáticas e indústrias extrativas do centro de estudos Diálogo Interamericano (IAD), com sede em Washington, disse que a oferta da Ecopetrol pela ISA é uma iniciativa com lógica financeira e que é “coerente com o que todas as petrolíferas vêm fazendo”. Grandes petrolíferas, como a BP e a Shell, anunciaram planos para aumentar os investimentos em atividades de baixa emissão de carbono.
Fonte: Valor