O salto de 6,6% dos investimentos no Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, perante os três meses anteriores, está longe de refletir a realidade da economia brasileira. Em um movimento que já havia sido antecipado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), a demanda interna por máquinas e equipamentos no país teve desempenho atípico no período devido ao mero registro de importação de plataformas de petróleo que, na verdade, já estavam aqui.
A coordenadora técnica do Boletim Macro do Ibre, Silvia Matos, alertou em outubro para o impulso que as mudanças no Repetro, regime que dá tratamento tributário especial a bens do setor de óleo e gás, deveriam dar à Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) do terceiro trimestre. Pelas regras anteriores, máquinas e equipamentos do segmento fabricados no Brasil, para serem desonerados, não podiam ser incorporados ao estoque de capital do país.
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Por isso, esses itens eram exportados, ainda que permanecessem em território nacional, e depois importados como “admissão temporária”. Assim, essas importações não eram registradas pela balança comercial. A partir de janeiro deste ano, porém, passou a valer o Repetro Sped, que permite que esses bens fiquem isentos de tributos federais, tenham sido eles comprados no mercado interno ou importados de forma definitiva.
Na prática, a mudança levou à internalização de plataformas que já estavam operando em território nacional, importação que ficou concentrada no terceiro trimestre e, consequentemente, elevou o investimento no período. Não é possível saber desde quando essas plataformas estavam no país, nem se todas que estavam no Brasil foram de fato importadas, mas, por alguma razão, essas operações se concentraram entre julho e setembro — principalmente no mês de agosto.
Segundo o Indicador de Comércio Exterior (Icomex) calculado pelo Ibre, as importações de máquinas e equipamentos teriam subido 24,8% excluindo as plataformas de petróleo desta conta, e não os 154,8% observados. Considerando o dado “inflado”, Silvia esperava alta de 6% da FBCF entre o segundo e o terceiro trimestres, variação próxima à divulgada hoje pelo IBGE nas Contas Nacionais Trimestrais.
O resultado geral do PIB do terceiro trimestre não mudou em função das alterações no Repetro, porque o aumento das importações “anulou” o efeito de alta dos investimentos, explicou hoje Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE. O nível de investimento também não mudou, uma vez que esses bens de capital já estavam aqui.
Isso não significa, no entanto, que o regime tributário não tenha alterado a dinâmica de investimentos no país: o IBGE, na avaliação de Silvia, precisa revisar a série histórica do PIB para incorporar corretamente a importação de plataformas no momento em que elas ocorreram. “Podemos concluir que o regime antigo gerou uma subestimação do investimento no Brasil nos últimos anos”, observou Silvia em outubro.
Questões contábeis à parte, o quadro ainda é de fraqueza para os investimentos produtivos no Brasil. De acordo com a FGV, o Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) na indústria de transformação ficou em 76,4% em outubro, bastante aquém da média histórica do setor, de 82,5%. Com excesso de capacidade ociosa nas fábricas e uma recuperação pífia da atividade, empresários veem poucas razões para investir.
Fonte: Valor