Discussão sem fim

Debate sobre mão de obra de oficiais da marinha mercante chega à Câmara dos Deputados e  divergências continuam

 

O debate sobre a mão de obra da navegação marítima brasileira chegou à Câmara dos Deputados. No último mês de agosto, instituições representantes do setor foram convidadas para uma audiência pública das comissões de Viação e Transportes, de Trabalho, de Administração e Serviço Público, solicitada pelo deputado Edinho Bez (PMDB-SC), que é integrante da Frente Parlamentar  Mista  de  Defesa   da    Infraestrutura Nacional. O grupo já fez um diagnóstico do setor e previu que a marinha mercante sofrerá em breve com a falta de pessoal qualificado.

Entre os participantes da audiência estavam o diretor de Portos e Costas (DPC) da Marinha do Brasil, vice-almirante, Ilques Barbosa Junior; o diretor de Transporte Marítimo da Transpetro, Agenor Leite; o presidente do Sindicato Nacional  das Empresas de Navegação Marítima  (Syndarma),  Bruno  Rocha; e o presidente do Sindicato Nacional dos  Oficiais da Marinha Mercante (Sindmar), Severino Almeida Filho.

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Na ocasião, Bruno Rocha, sugeriu a flexibilização da Resolução Normativa 72, do Conselho Nacional de Imigração, para desobrigar embarcações ou plataformas estrangeiras que operem no Brasil por mais de 90 dias de contratarem profissionais brasileiros. A medida, diz ele, serviria para atenuar a demora em formar novos oficiais. Para a deputada Jandira Feghali, no entanto, a flexibilização estimularia o desemprego. “Não podemos aceitar que se tire emprego do trabalhador brasileiro para incorporar mão de obra sem custo, asiática, escrava na embarcação brasileira”, disse.

Se na avaliação do Syndarma existe uma carência de oficiais da marinha mercante, para o Sindmar não faltam oficiais para operar os navios. De acordo com o presidente do sindicato, Severino Almeida Filho, a escassez de mão de obra é um problema que não existe. Para o diretor de Portos e Costas da Marinha do Brasil, vice-almirante Ilques Barbosa Júnior, também não há risco de faltar profissionais. Responsável pela formação dos oficiais, a Marinha tem a expectativa de formar 1,5 mil profissionais por ano a partir de 2015. Neste ano devem ser formados 726 oficiais. A previsão para 2013 e 2014 é a formação de 959 e 1.335 oficiais, respectivamente.

Após o encontro na Câmara, ambos os sindicatos se manifestaram. O Syndarma destacou em seu website que enviará um ofício do deputado Edinho Bez ao ministro do Trabalho e Emprego, pedindo seu empenho para que o Conselho Nacional de Imigração (CNIg) suspenda a eficácia do artigo 3º da RN-72 para oficiais. O sindicato também pediu o apoio da Confederação  Nacional de Transporte (CNT) para convencer outros integrantes patronais do Conselho Nacional de Imigração da real necessidade da flexibilização da resolução. Uma audiência, diz o Syndarma, também foi solicitada ao ministro do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) pela CNT. Na ocasião, será entregue uma carta ao ministro, pedindo sua intervenção junto ao presidente do CNIg para que uma nova resolução seja emitida, suspendendo por dez anos o artigo terceiro da resolução.

Por sua vez, o Sindmar divulgou, por meio de nota, que o intuito dos armadores, ao anunciar um suposto déficit de mão de obra, visa “isentar as empresas de navegação de cumprir a legislação brasileira e reduzir custos por meio da importação de profissionais estrangeiros, não raro de baixa qualificação”. Almeida ressalta que não é justo impor ao oficial mercante brasileiro a concorrência com profissionais de formação duvidosa, que aceitam trabalhar por qualquer salário.

O estudo mais recente divulgado sobre a mão de obra do setor é o “Sistemática para equilibrar a oferta e demanda de oficiais brasileiros de marinha mercante no mercado brasileiro”, desenvolvido em julho do ano passado pela Schlumberger Business Consulting. O documento constatou na época um deficit de 906 oficiais de marinha mercante. Para a DPC, no entanto, esse deficit era de apenas 227 oficiais, porque a RN-72 não vinha sendo quantitativamente cumprida.

 

Dois meses após o estudo, em setembro do ano passado, o Sindmar e a Petrobras assinaram um acordo, o qual excluía 91 embarcações da companhia que atuavam na cabotagem de inserir novos tripulantes brasileiros. De acordo  com  Almeida, a iniciativa teve como objetivo disponibilizar  ao mercado os marítimos que operariam nas embarcações da estatal. “A Petrobras é a empresa que mais afreta embarcações estrangeiras no país. O máximo de utilização dos marítimos pela RN-72 é de dois terços. Então, se retiramos 91 embarcações, estamos falando de uma média de 900 oficiais brasileiros e dois terços disso seriam 600. Com essa medida, estamos tirando a obrigatoriedade de contratação de 600 oficiais brasileiros. Se essa escassez de 227 oficiais estivesse correta, teríamos disponibilizado para o mercado quase três vezes mais. Fomos mais além que esse número para não corrermos o risco de termos falta”, justifica.

Almeida diz que o Syndarma pede a flexibilização da resolução quando ela já existe desde que foi criada. “Ela já é norma regulamentadora com alta dose de flexibilidade, porque a RN-72 diz no seu artigo terceiro, parágrafo único, que o prazo para contratação de brasileiros poderá ser estendido, poderá ser aumentado, poderá ser ampliado”, reforça o presidente do Sindmar.

Mas para o vice-presidente executivo do Syndarma, Roberto Galli, não há flexibilização definida por regulamento. Existem apenas algumas flexibilizações feitas em acordos do Sindmar com a Petrobras e com empresas ligadas à Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo (Abeam). No entanto, diz Galli, estas flexibilizações foram feitas para novas embarcações estrangeiras que virão a ser afretadas a partir do acordo coletivo firmado, mas não para liberação de oficiais que hoje tripulam navios estrangeiros atuando no Brasil.

“Existe um contingente estimado em 1,5 mil oficiais brasileiros que hoje tripulam as embarcações estrangeiras. O que buscamos é ter acesso a este contingente. Queremos oferecer emprego em empresas brasileiras aos brasileiros que estão em embarcações estrangeiras”, afirma. Esses oficiais, acrescenta o sindicato, poderiam aliviar momentaneamente o deficit.

Da mesma forma que a Petrobras e diversas empresas associadas à Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo (Abeam) conseguiram, outros armadores também podem solicitar a flexibilização, caso o sindicato considere adequado. “Qualquer empresa pode conseguir, desde que estejamos convencidos da necessidade isso pode ocorrer”, avisa ele, ressaltando que outros armadores no passado conseguiram estender o prazo para a contratação de marítimos brasileiros. “No passado, já tivemos situações de navios parados para fazer obras e consensualmente fizemos um documento em conjunto, assinado pelo armador, por nós e pelo Ministério do Trabalho e Emprego para ampliar esse prazo”, exemplifica.

Outro fato que tem preocupado o Syndarma é a aplicação prevista em cláusula de contrato com a Petrobras de uma multa de R$ 30 mil por dia por função que não estivesse sendo cumprida dentro da RN-72. Segundo Galli, o sindicato acompanha “apreensivo” a discussão, que já está sendo feita pela Abeam. “A Petrobras está querendo exigir o cumprimento da RN-72 para os novos contratos com barcos estrangeiros afretados pelas brasileiras. Isto está na contramão dos acordos coletivos assinados com o Sindmar, que dispensam o cumprimento da RN-72 para as novas embarcações. Esta exigência extemporânea só poderá agravar a carência e é impossível de ser cumprida, já que não existe oficial brasileiro disponível”, relata. Sobre essa questão, o Sindmar diz que não participa das decisões de contrato da Petrobras, mas se a cláusula efetivamente existir, o sindicato a aplaude.

Se as opiniões dos sindicatos são divergentes, pelo menos em um ponto eles concordam: na atualização dos números sobre a mão de obra de oficiais na marinha mercante brasileira. Por isso,  no último dia 22 de agosto, Sindmar e Syndarma se reuniram com a DPC e Transpetro, além de componentes da comissão tripartite, para discutir a questão. De acordo com Galli, não haverá um novo estudo e sim uma atualização da situação deste mercado, usando os instrumentos deixados pelo contratado anterior para que este acompanhamento seja dinâmico. Almeida, do Sindmar, frisa também que há necessidade de atualizar os números devido à mudança do cenário de mercado, já que os estudos são a maneira mais inteligente de manter um equilíbrio.

Em relação ao panorama de mão de obra de oficiais da marinha mercante nos próximos anos, o Syndarma acredita que a flexibilização da exigência do cumprimento da RN-72 trará alívio ao setor, já que poderá aumentar a oferta de oficiais para navios de bandeira brasileira. “Esta medida, somada às já tomadas pela DPC e outras que ainda serão tomadas quanto ao número de oficiais formados, deverá ser avaliada na atualização em curso. Aí então teremos uma melhor definição do que as empresas terão de enfrentar nos próximos anos.”

Para o Sindmar, em uma década o número de oficiais mercantes formados anualmente aumentou dez vezes e em nenhum outro segmento houve um acréscimo tão expressivo de mão de obra qualificada quanto no da marinha mercante. “Não existe cenário de apagão marítimo, essa falta de oficiais é uma ficção”, finaliza.

Com informações da Agência Câmara



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