Mudança de hábito

De carona com queda nos preços dos fretes, contêineres movimentam cargas tradicionalmente transportadas a granel

Em 2008/2009, sob efeito da crise mundial, muitos armadores pararam seus navios. A redução do comércio internacional provocou retração na movimentação de cargas no mundo todo e com isso os armadores tiveram de rearranjar suas linhas, frequências e

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tamanho das frotas. O tráfego de embarcações com pouca carga e os navios colocados em laid up representaram grande prejuízo para o setor. Com menor demanda de embarque, o preço dos fretes caiu consideravelmente.

No Brasil, uma das consequências foi a migração de cargas tradicionalmente cativas dos graneleiros para os contêineres, que normalmente transportam mercadorias de maior valor agregado e a fretes mais altos. Embora nos últimos meses perceba-se um movimento de recuperação dos fretes, a ampliação da conteinerização é uma aposta em aberto.

A presidente do Sindicato das Agências de Navegação Marítima e Atividades Afins do Estado do Rio de Janeiro (Sindario), Marianne Lachmann, destaca que nos últimos 12 meses se viu novamente uma degradação nos níveis de frete em todos os trades do mundo por conta da entrada em operação de um número expressivo de navios. São navios maiores, que oferecem mais espaço para cargas e que fizeram com que os níveis de frete caíssem de 25% a 30%, entre o final do segundo semestre de 2010 e o final do primeiro semestre de 2011. Os fatores adversos levaram os armadores a se reorganizarem e retirarem tonelagem do mercado.

Desde agosto, vem sendo percebido o início de uma recuperação, ainda abaixo dos números do final de 2010. “Já vemos uma estabilização em patamares acima do fundo do poço”, observa a presidente do Sindario. Marianne observa que houve uma redução significativa nos níveis de frete de praticamente todos os produtos e de todos os tipos de navios nos últimos três anos. “No primeiro semestre de 2008, estávamos no pico de níveis de frete. A crise de 2008 fez com que um número imenso de navios fosse posto em laid up porque os fretes caíram tanto que os níveis não eram suficientes para pagar o custo das viagens. Então os armadores pararam seus navios”, lembra.

Marianne aponta também o aumento do bunker (combustível) em mais de 20% como fator que contribuiu para o aprofundamento da crise. Em outubro, o custo do bunker estava em US$ 650 por tonelada, contra US$ 550 por tonelada no final de 2010. “Se do lado da receita vimos uma redução de até 30% do nível de fretes, por outro lado o custo de bunker subiu mais de 20% nesse período. Quando a receita cai e o custo aumenta, há um impacto fenomenal no resultado”, lamenta.

 

Conteinerização. Patrícia Iglesias, gerente comercial da Wilson, Sons, conta que a empresa decidiu há dois anos redirecionar algumas estratégias de vendas no Tecon Salvador, muito em função da expansão que iria acontecer. Com a iminente ampliação do terminal, a Wilson, Sons precisava pensar em cargas novas e criou um grupo de estudos para tratar da conteinerização. Ela revela que, desde 2007, a empresa observa que algumas cargas  antes embarcadas como carga geral passaram para os contêineres.

Patrícia lembra que, em 2007, a Bahia Pulp exportava papel e celulose e 100% do volume era exportado via break bulk. Segundo ela, a Bahia Pulp mudou a forma de exportação e, com 800 a 900 contêineres por mês, é a maior exportadora do porto atualmente. “O primeiro movimento veio com a conteinerização do papel e celulose. Em seguida o açúcar, que já é uma realidade nos portos do Sul, e já acompanhamos alguma exportação em Salvador”, destaca.

Na visão de Marianne, com ou sem crise a conteinerização é uma tendência, mas a situação atual é uma exceção. “Se olharmos o número de TEUs movimentados em 1980 e 2010,  há uma mudança significativa”, comenta. “Mas o que está acontecendo agora é uma situação excepcional.” Para ela, a exportação de soja em contêiner realizada no Tecon Salvador tem a ver com a máxima do mercado de oferta e procura. “Existe uma sobreoferta. Estamos num momento em que recebemos no tráfego muitos navios gigantescos conteineiros. Existe uma oferta de contêineres muito maior que a demanda. Existe espaço ocioso nos navios”, avalia. Por isso, Marianne vê o movimento dos granéis em direção aos contêineres com naturalidade, até porque o armador precisa reposicionar os cofres de carga.

Estudos desenvolvidos pelo Tecon Salvador identificam três produtos na economia baiana com potencial para serem transportados por contêineres de forma estável: milho, fertilizantes e a soja — esta a primeira a ser movimentada nesta modalidade. Em agosto deste ano, o terminal exportou dois contêineres do produto para o Japão. A expectativa da Wilson, Sons é de que milho e fertilizantes também passem a ser exportados via contêiner, não só na Bahia como no Brasil. Em 2010, também foi feita no porto a conteinerização de manganês, carga normalmente comercializada a granel, que teve entre 20 e 30 contêineres movimentados.

Patrícia não acredita que o país passará por uma situação similar a de 2008. Segundo ela, quando a crise estourou naquele ano, a Wilson, Sons percebeu que os preços imediatamente despencaram no mercado internacional com grande prejuízo, principalmente para as commodities. Mas agora, a empresa está com boa expectativa por conta da conteinerização.

A gerente comercial do Tecon Salvador conta que a estratégia de conteinerização da soja precisou ser revista durante o processo. Num primeiro momento, a empresa buscou grandes exportadores para movimentação do produto em contêineres. Como as negociações não estavam avançadas, o Tecon Salvador revisou o modelo e mudou o foco para os pequenos exportadores. “Então passamos a ver quem lá fora (Ásia principalmente) compra soja de qualquer lugar do mundo em volumes menores. Descobrimos quem são essas empresas e esses países. A partir daí, fomos para os nossos produtores aqui no Brasil. Na verdade, apresentamos o vendedor aqui dentro e o comprador lá fora”, diz.

O trabalho, segundo Patrícia, foi feito em conjunto com armadores, agentes de carga e a equipe comercial do porto de Rio Grande, que faz parte do grupo Wilson, Sons. Segundo a gerente comercial do Tecon Salvador, foram acompanhadas as dúvidas a respeito de como seria feito essa estocagem em contêiner, quais as opções disponíveis para estocar a soja, qual o tipo de soja e qual o custo necessário para haver um equilíbrio do preço do frete. Ela diz ainda que não se deve considerar apenas o valor do frete. “Quando se tem alta do contêiner, se tem uma alta do frete break bulk também. Eles se equilibram”, diz.

“Quando se mostra disposição para igualar custos, damos garantias operacionais para que haja sucesso na exportação. Aí temos que envolver todos os órgãos — Receita Federal, agricultura, Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e todos os que estão na cadeia desse produto específico”, destaca.

Patrícia conta que existe grande empenho dos armadores em ampliar a conteinerização. “Depois que saíram esses dois contêineres de Salvador, fomos procurados por alguns armadores interessados em exportar a soja por meio de suas empresas. Ela conta que um embarcador pretende exportar 30 a 40 contêineres por mês de soja não transgênica para consumo humano. “Não significa que o contêiner está dando certo. Significa que ele não está tendo prejuízo com isso. Terminais de contêineres e armadores também estão lucrando. Antigamente se construíam dois, três navios com a mesma capacidade de um só navio hoje”, ressalta.

 

Oferta. De acordo com o vice-presidente executivo do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), Roberto Galli, a queda do frete, em princípio, demonstra uma demanda menor de transportes, redução do consumo e queda nas exportações brasileiras, que afetam diretamente as empresas de navegação. Apesar da boa experiência vivenciada pelo Tecon Salvador, ele acredita que o processo de conteinerização de granéis não deve ser uma tendência. “Já houve casos de contêineres que levaram minério de ferro e normalmente essas cargas teriam tratamento de carga a granel. São anomalias na operação comercial. Quando você tem uma carência de meio de transporte, você apela para o contêiner. Normalmente, o contêiner não é mais adequado para aquela carga”, comenta.

Galli destaca que com o mercado das empresas de granel brasileiras caindo, o frete delas cai também. Mas muitas delas têm contratos de longa duração que vão sofrer um efeito de amortecimento a médio e longo prazo.

 

Perspectiva. Marianne acredita que a tendência é de que se consiga um ponto de equilíbrio dos fretes em todos os mercados. “Os armadores se organizarão de forma que os níveis de frete possam gradativamente recuperar-se e fazer com que esse negócio volte a ser lucrativo”, estima. Ela teme que, se o frete permanecer estagnado, os resultados serão menor oferta e menos armadores vindo ao Brasil. “Hoje, temos muitos armadores e linhas escalando o Brasil. Na medida em que o negócio não dá retorno, você terá uma redução desse número de players oferecendo os serviços. Haverá uma concentração em determinados players que estão aqui, são mais capitalizados e têm mais capacidade de enfrentar essa crise”, analisa. “Não tenho dúvidas de que todos os players, não só os armadores, mas os transportadores rodoviários e ferroviários, os agentes marítimos, os operadores portuários, todos estão buscando ganhos de produtividade”, resume.

No caso brasileiro, particularmente, Marianne receita para minorar a crise uma maior otimização da cadeia logística e menos burocracia. “Existem muitas oportunidades de ganhos de produtividade. Muitas formas de fazer mais com menos. “Mas a nossa burocracia é tão grande que os concorrentes internacionais quase não precisam fazer nada. É o Brasil contra o Brasil”, lamenta.

Em Santos, a gerente comercial da Wilson, Sons destaca que, no acumulado até setembro, houve acréscimo de 22% na movimentação, comparando-se a 2008, ano da crise. “Não estamos vendo crise neste momento. Em termos de Brasil, acho que estamos melhor preparados para passar por essa crise. Acho que temos que ficar alertas, mas acho que o mercado interno está aquecido. O dólar tem ajudado as exportações de commodities e frutas”, observa.



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