Devolução de áreas pela Petrobras indica fim da era do 'bilhete premiado' no pré-sal

Resultados negativos na busca por petróleo em áreas do pré-sal indicam que o tempo de "bilhete premiado" da maior província petrolífera brasileira já passou e reforçam argumento de petroleiras para defender mudanças no modelo de leilões no país.

Para o geólogo Pedro Zalán, ex-Petrobras, a frustração dos concessionários mostra que a taxa de sucesso no início da exploração do pré-sal era "uma anomalia", mas não significa que não existam ainda áreas promissoras disponíveis na região.

A expressão "bilhete premiado" foi usada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ilustrar a elevada taxa de sucesso da Petrobras nos primeiros poços na região, argumento que justificou aprovação de lei que garantiu fatia maior da receita ao governo e um mínimo de 30% de cada projeto à estatal.

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"Estávamos muito mal acostumados ao sucesso estrondoso da Petrobras nas áreas que ela tinha escolhido lá no início, que eram as melhores áreas", diz Zalán. "Uma taxa de sucesso de perto de 100% era uma anomalia. Agora, vemos uma regressão à média de sucesso exploratório, que gira entre 20% e 40% no mundo."

Nesta sexta (16), o consórcio que arrematou em 2020 o bloco de Libra, maior descoberta brasileira de petróleo, anunciou a devolução de uma das áreas que compreendem o complexo, conhecida como Sudeste de Libra.

Segundo o consórcio, formado por Petrobras, Shell, Total e as chinesas CNODC e CNOOC, trata-se de um compartimento distinto dos demais reservatórios já identificados na região, que já era tido como de baixo potencial.

"A conclusão do processamento dos dados obtidos [durante a pesquisa do subsolo] confirmou esta expectativa", informaram, em nota, as empresas.

O conjunto de áreas batizado de Libra foi concedido pelo governo Dilma Rousseff por um valor equivalente hoje a cerca de R$ 23 bilhões. Nele, estão dois dos maiores campos de petróleo em operação no país, Búzios e Mero, que produziram juntos em fevereiro 723 mil barris de óleo e gás por dia.

O insucesso na área Sudeste, portanto, não representa uma derrota para o consórcio, que tem sob sua operação uma das maiores áreas petrolíferas do mundo.

A devolução, porém, não foi a primeira do pré-sal: no início de 2020, consórcio também com participação da Petrobras e da CNODC, agora em parceria com a BP, devolveu à ANP o bloco Peroba, arrematado por R$ 2 bilhões em leilão realizado em 2017.

Foi a primeira devolução de áreas dos leilões de partilha da produção, modelo contratual que dá à União direito a parte da produção, retomado pelo governo Michel Temer em 2016 após uma paralisação de seis anos desde o leilão de Libra.

À ANP, o consórcio informou que o poço perfurado na área tinha gás carbônico como fluido principal e, por isso, a exploração de petróleo é inviável.

Consórcio formado por Shell e Chevron também se frustrou na exploração de um bloco arrematado durante o governo Temer: o primeiro poço de Saturno, área concedida por R$ 3,1 bilhões em 2018, deu seco, segundo o jargão petrolífero para perfurações que não encontram petróleo.

Em entrevista nesta sexta (16), o presidente da Shell Brasil, André Araújo, disse que o resultado da perfuração contesta a ideia de "bilhete premiado", difundida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que colocava todas as áreas do pré-sal no mesmo patamar de elevado potencial.

"Não é só fazer perfuração que o petróleo já sai jorrando no dia seguinte", disse Araújo, em entrevista para falar da estratégia da empresa para os próximos anos. "São anos de investimento e há incertezas. Não é um bilhete premiado", completou.

Na entrevista, Araújo disse que os sócios no projeto ainda avaliam a viabilidade de perfuração de outro poço e, por isso, não há decisão tomada sobre a devolução do bloco.

A indústria do petróleo defende o fim do regime de partilha da produção, que é tema de um projeto de lei do senador José Serra (PSDB-SP). As empresas defendem que o modelo, instituído por Lula após a descoberta do pré-sal, reduz a viabilidade dos investimentos.

O texto dá ao CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) a atribuição de definir qual o regime contratual para cada bloco licitado. Atualmente, o regime de partilha vigora no chamado polígono do pré-sal, área de 149 mil quilômetros quadrados entre Santa Catarina e o Espírito Santo.

Além ter uma fatia da produção, a União participa da gestão dessas concessões. Fora do polígono, os contratos são de concessão, no qual as empresas vencedoras têm autonomia sobre a gestão e pagam ao governo royalties e participações especiais, espécie de imposto de renda cobrado sobre campos de elevada produtividade.

O governo Jair Bolsonaro tenta viabilizar até o fim de 2021 o leilão de duas áreas que ficaram sem ofertas no último leilão sob o regime de partilha feito no país, em 2019, conhecido como leilão de excedentes da cessão onerosa.

Na semana passada, Petrobras e a estatal PPSA (Pré-Sal Petróleo SA) chegaram a acordo sobre a compensação que será feita à primeira pelos investimentos já realizados no desenvolvimento de reservas contíguas às que serão licitadas, eliminando um obstáculo apontado por investidores como uma das causas do fracasso da oferta.

Desde o governo Temer, a ANP vem licitando campos com potencial de descobertas no pré-sal fora do polígono –em geral, em águas ultraprofundas em frente ao litoral de São Paulo e do Rio de Janeiro. Ainda não há, porém, descobertas confirmadas nessas áreas.

No próximo leilão da agência, há novas áreas nessas regiões, incluindo blocos que ficam além das águas territoriais brasileiras, onde também há potencial para reservas do pré-sal, que serão oferecidos ao mercado pela primeira vez.

Zalán reforça que ainda há boas oportunidades. "Não acabou o filé mignon, ele só está mais espalhado. E vai ser mais difícil encontrá-lo, haja vista a menor oferta de blocos, o menor conhecimento sobre as áreas e a maior competição."

Fonte: Folha SP



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