Corrida contra o relógio

Após sucessivos atrasos, obras do PAC começam a sair do papel, mas precisam cumprir um cronograma apertado para ficarem prontas em 2011

Foram três anos de sinal vermelho para o maior investimento público nos portos do Brasil. Com R$ 2,7 bilhões previstos no orçamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), as obras de infraestrutura dos portos, que incluem dragagens e remodelação de vias de acesso terrestre às zonas portuárias, esbarraram em burocracia, legislação ambiental e irregularidades nos contratos.

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Com a proximidade do fim do prazo para a realização das ações do programa, a corrida contra o tempo acende luz verde para os investimentos. O Plano Nacional de Dragagem (PND), um dos mais estratégicos do PAC, ganhou fôlego apenas nesta reta final, tirando do papel contratos de obras para sete portos: Recife, Rio Grande, Santos, Rio de Janeiro, Angra, Salvador e Aratu. Ainda faltam 10 para completar a lista dos 17 portos previstos no cronograma inicial da Secretaria Especial de Portos (SEP), mas o ministro da pasta, Pedro Brito, acredita que conseguirá fechar todos os contratos até o final de 2010.
“Brevemente iremos lançar os editais que estão faltando. Isso muda em definitivo os portos do país, que serão outros depois desse programa de dragagem implementado”, afirma Brito.
Ainda que isso aconteça, o cronograma é apertado demais para concluir as obras até junho de 2011, segundo prazo estabelecido pela SEP. A maior parte dos editais foi lançada apenas em 2009 e a previsão para início das obras já está atrasada. Para o professor Paulo Fleury, especialista na área e CEO do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos), é impossível prever a realização de todas as obras neste prazo. “É uma questão que não depende da vontade do governo. Não adianta ter a verba necessária, se o edital não andar. Infelizmente, a complexidade burocrática do Brasil acaba por emperrar obras fundamentais para a infraestrutura portuária. Além disso, os problemas que podem ser encontrados durante as obras são infinitos. Essa futurologia é difícil de acertar.”

PND. A boa notícia é que, nas obras que já estão sendo realizadas, os recursos empregados devem mudar a cara de grandes terminais e já há porto somando bons resultados. Em Rio Grande, a movimentação de contêineres, de janeiro a julho deste ano, registrou crescimento de 10,4% em comparação ao mesmo período de 2008, alcançando 356.675 TEUs. A produtividade média dos portos também vem atingindo recordes históricos nos maiores portos brasileiros e a tendência é aumentar ainda mais. De acordo com Brito, a aplicação dos recursos deverá trazer um crescimento de 30% na capacidade de movimentação de cargas, apenas com a realização de todas as obras de dragagem previstas.

Rio de Janeiro.
Os recursos iniciais para modernização de toda a estrutura portuária no Rio de Janeiro são da ordem de R$ 150 milhões, segundo a Companhia Docas do Rio de Janeiro (CDRJ). A dragagem do porto, que completa 100 anos em 2010, terá um aporte de R$ 115 milhões. A Somar é a vencedora do processo licitatório e terá 12 meses de prazo para a conclusão do empreendimento.
Atualmente a profundidade do porto do Rio oscila entre nove e 15 metros, dependendo do trecho. Com a dragagem, o porto irá operar com o calado entre dez e 15,5 metros, maior, portanto, do que a do porto de Santos (SP), que terá 15 metros em toda sua extensão. Este é o principal investimento de infraestrutura que o porto do Rio recebe desde a década de 90. Para o presidente da CDRJ, Jorge Mello, as mudanças irão mudar a posição do estado dentro das rotas de comércio marítimo.
“Teremos outra inserção nas rotas de navegação, principalmente nas de carga geral de contêineres. O nosso problema era que os navios que vinham da Europa e desciam até o cone sul iam direto para Santos. Se nós não acompanhássemos as obras que estão sendo feitas em outros estados, estaríamos fora do mercado. Nós superamos isso. A nossa dragagem está projetada para 15 metros com 0,5 metro de tolerância, e nós vamos atingir esse 0,5 metro a mais”, promete Mello.
Para manter esse calado em 15,5 metros, Mello acredita não precisar fazer dragagem de manutenção pelos próximos cinco anos, em função da pouca incidência de assoreamento na Baía de Guanabara. No entanto, o presidente da CDRJ anuncia novas melhorias para os próximos anos: “A expectativa é que tenhamos de fazer outras intervenções dentro desse período de cinco anos, como obras de alargamento”.
Com o crescimento de 30% em movimentação previsto pela SEP, o porto do Rio — o de maior valor comercial de mercadorias — poderá alcançar o volume de 12 ou 13 milhões de toneladas, ao fim de todas as obras em andamento. Atualmente, esse número é de nove milhões de toneladas.

Angra dos Reis e Itaguaí.
No porto de Angra dos Reis, também operado pela CDRJ, o volume investido é mais modesto: R$ 3 milhões. A Enterpa, empresa que fará a dragagem, terá dois meses para concluir a obra. O ministro Pedro Brito prevê uma diversificação das atividades do porto de Angra, servindo, principalmente, como plataforma de atendimento offshore para a Bacia de Campos.
Já em Itaguaí, a dragagem está mais adiantada. A primeira fase do projeto, uma dragagem de aprofundamento para 20 metros, concluída em 2008, estava fora do cronograma do PND, mas foi realizada com investimentos do PAC. O calado não pôde ultrapassar os 19,4 metros, em função de um material de difícil remoção encontrado, mas a CDRJ já contratou uma nova análise desse material para saber se precisa ser derrocado ou se pode ser simplesmente escavado. Ainda não há previsão para conclusão deste estudo.
A segunda fase do projeto de Itaguaí é a dragagem de um canal derivativo, que segue em direção à área industrial, da Baía de Sepetiba. O canal possui hoje 14,5 metros de profundidade e passará a ter 17 metros.
Das quatro obras de dragagem no Rio de Janeiro, uma delas — em Itaguaí — já foi realizada, outras duas (Rio e Angra) estão prestes a ter início e a segunda fase de Itaguaí está em vias de ser lançada. No final do mês de outubro, a Dragabrás foi a vencedora da licitação e o consórcio terá aproximadamente oito meses para concluir a dragagem.

Rio Grande. O porto de Rio Grande foi um dos primeiros a ter seu projeto de dragagem licitado e tem a vantagem de estar com as obras já em andamento. São quase três meses de aprofundamento do calado e os resultados já podem ser vistos: de 14 metros de profundidade para 16 metros em apenas dois meses. O objetivo é chegar nos próximos seis meses aos 18 metros previstos inicialmente para o porto.
São R$ 196 milhões destinados à dragagem de aprofundamento, executada pelo consórcio formado pela Odebrecht e pela belga Jan De Nul. “Quando ganhou a licitação e assinou o contrato, o consórcio não levou um mês para mobilizar as dragas para Rio Grande. Em poucas semanas elas começaram a operar na dragagem do porto”, explica Janir Branco, diretor-superintendente do porto de Rio Grande.
Branco espera fechar 2009 com um volume de 28 milhões de toneladas em toda a movimentação do porto. Segundo ele, a meta é chegar a 2015 com 50 milhões de toneladas em função das intervenções realizadas. Além da dragagem do porto também haverá a dragagem de manutenção e investimentos na modernização do cais do porto público.

Santos. O maior porto da América Latina se prepara para receber investimentos de mais de R$ 400 milhões em modernização e expansão. Após amargar seis meses de atraso apenas por conta de autorização do Ibama para dar início às obras, o maior empreendimento — a dragagem de aprofundamento dos 25 quilômetros de extensão do canal de navegação — acaba de ser liberado. O volume total estimado do material a ser dragado pelo consórcio vencedor da licitação — a Draga Brasil — é de 13,6 milhões de metros cúbicos.
O canal também será alargado dos atuais 150 metros para 220 metros de largura, no mínimo. “Com isso, o porto terá todas as condições para oferecer um tráfego de embarcações em mão dupla em pelo menos 85% do canal”, afirma Paulino Vicente, diretor de Infraestrutura e Obras da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp).
Além da dragagem, haverá também intervenções nas vias de acesso terrestre ao porto, superando um gargalo ferroviário existente há décadas no local.

Cronograma. As obras no porto de Santos foram fortemente impactadas por entraves naturais e burocráticos. A região sofreu com chuvas intensas que paralisaram parcialmente as obras por quase dois meses e o licenciamento ambiental também foi um processo longo e demorado.
Na opinião de Paulino Vicente, os atrasos ocorridos no porto santista são compreensíveis do ponto de vista da grandiosidade do projeto. “Um empreendimento dessa magnitude não pode ser implementado sem que todas as questões ambientais estejam perfeitamente equacionadas. Até porque se fizéssemos qualquer dragagem de forma açodada, sem esse cuidado, certamente teríamos todo o processo questionado e até possivelmente paralisado”, completa.
As barreiras da burocracia legal e ambiental foram motivos de atrasos no Plano Nacional de Dragagem. A própria SEP reconhece a demora. No entanto, o ministro Pedro Brito é categórico em afirmar que não haverá acréscimo no orçamento por conta de mudanças no cronograma. Para ele, a intensidade das obras compensa a lentidão anterior. “Quando a obra começa de fato, o tempo acaba sendo recuperado de alguma maneira. Foi o caso, por exemplo, da primeira fase de Itaguaí, prevista para terminar em 12 meses, mas nós fizemos em dez. O porto de Recife estava previsto para ser feito em seis meses, mas nós fizemos em quatro. O mais difícil foi Santos, porque é um porto com 25 quilômetros de canal, tem muitas interferências, a navegação é muito intensa, as licenças ambientais e os programas básicos ambientais exigidos são maiores do que em outros locais. Então, as dificuldades são maiores”, explica.

Salvador e Aratu. O ministro Pedro Brito assinou em meados de dezembro o contrato com o consórcio formado pelas empresas JDN e Dratec para a realização das obras de aprofundamento dos portos de Salvador e Aratu, administrados pela Companhia das Docas do Estado da Bahia (Codeba). A obra custará R$ 89 milhões, suficientes para deixar os portos baianos com a profundidade operacional de 15 metros. A licitação foi publicada em março.
Além das obras de dragagem, a SEP irá realizar a construção de uma bacia de evolução do porto de Aratu de 550 metros e ampliará a que já existe no porto de Salvador de 275 metros para também 550 metros de diâmetro. A previsão do término das obras é abril de 2010.

Editais. Dos entraves detectados desde o início dos investimentos, o licenciamento ambiental é o mais demorado. Mas Brito afirma que houve também lentidão por conta de modificação de projetos e brigas judiciais entre participantes. As empresas de dragagem dizem que as dúvidas em relação aos projetos surgem em função da falta de experiência do Brasil no setor para que os editais sejam lançados com todas as informações relevantes e sem margem para contestações.
Na opinião de Thierry Dor, gerente de projetos da belga Deme, são os pequenos detalhes que interferem no cronograma inicial das obras. “Depois do edital, quando as propostas são abertas, fica sempre alguma dúvida que precisa ser esclarecida. E isso atrasa. As empresas entram com perguntas, com impugnações, às vezes com impugnações para mudar o edital e isso vai atrasando. Chegamos aqui em 2007 com a esperança de que no final de 2008 o projeto começasse. Podemos considerar que tivemos um ano de atraso”, afirma.
No entanto, foi graças a esses entraves burocráticos que o Brasil acabou privilegiado quanto à disponibilidade de dragas internacionais. É que com a crise mundial e a paralisação de dragagem em outros países, os equipamentos ficaram ociosos e a mobilização das dragas para o início das obras em alguns portos foi facilitada.
Única empresa brasileira em meio às gigantes internacionais, a Bandeirantes Dragagem aposta nessa saída para superar a lentidão inicial do cronograma: “Este atraso está propiciando a disponibilidade de dragas estrangeiras de grande porte, ociosas, e, portanto, com baixo custo, que tem cumprido com as expectativas de preços baixos e competitivos nos serviços já licitados”, explica Ricardo Sudaiha, diretor da companhia.

TCU. Em outubro, o Tribunal de Contas da União (TCU) divulgou uma relação de obras do PAC com ressalvas as suas execuções. As intervenções nos portos não ficaram de fora da lista, embora a SEP tenha afirmado, por meio de sua assessoria de imprensa, que nenhum empreendimento foi paralisado por conta da iniciativa do TCU.
No porto de Rio Grande, uma das obras que recebeu medida cautelar do TCU foi a construção e ampliação dos molhes. Segundo a superintendência do porto, apesar de ter sido apontada pelo TCU, a obra nunca parou. O diretor Janir Branco afirma que esse investimento é um dos mais vultosos do governo federal — da ordem de R$ 500 milhões — e acrescenta: “A ideia é que ela seja concluída no mês de abril de 2010”.
Em contrapartida, os portos sob a gestão da Companhia Docas do Rio de Janeiro não apareceram no relatório e a razão para isso é atribuída por Jorge Mello ao cuidado em se planejar obras de grande importância como essas. “Atribuo esses problemas que estão sendo apontados no TCU como um reflexo da falta de planejamento do Brasil. A lógica do TCU é achar problemas e a nossa é manter viva a atividade portuária. Eles são especializados em ser pedra e nós, infelizmente, somos a vidraça. Realmente é preciso tomar cuidado no planejamento dos projetos.”

PAC 2. Apesar das intervenções do TCU, o clima geral é de entusiasmo com os investimentos. Tanto que já tem administradores de Companhias Docas de olho na próxima etapa do projeto: o PAC 2.
O Rio de Janeiro, por exemplo, já possui projetos em fase de elaboração para serem discutidos no âmbito do programa. Entre eles, há mais uma dragagem para Itaguaí, a mudança de atracação de navios de cruzeiro e a criação de um local confortável para os passageiros que estiverem aguardando embarque. Já o porto de Rio Grande pretende modernizar um trecho de 1,9 mil metros do cais, uma obra de R$ 127 milhões, que terá convênio com o governo do estado.
As melhorias na infraestrutura do porto de Santos também estão sendo pensadas para o PAC 2. Segundo Paulino Vicente, as obras seriam complementares às que estão em andamento, criando condições para que o porto possa crescer de maneira significativa nos próximos dez a 15 anos.

 



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