Destinação correta

 

 


Fábio Scremim/APPA

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SEP e universidades avançam no programa de gestão de resíduos nos portos, que inicia segunda fase

O descarte de resíduos sólidos e efluentes de forma ambientalmente correta é um dos obstáculos para os portos atingirem um nível alto de eficiência ambiental. Inspirados na política nacional de resíduos (lei 12.305/2010) e na experiência de portos europeus e norte-americanos considerados sustentáveis, grupos de trabalho formados por 14 universidades, com apoio da Secretaria de Portos (SEP), finalizam até meados de 2013, um diagnóstico do gerenciamento de resíduos em 22 portos brasileiros.

 

O diretor de revitalização e modernização portuária da SEP, Antonio Maurício Ferreira Netto, explica que o levantamento está em processo de esclarecimento de dúvidas técnicas. A SEP iniciou, no início de 2013, a segunda fase do programa, que vai delinear as ações a serem adotadas pelos portos. Cada um terá seu manual de boas práticas e seguirá um manual de âmbito geral sobre gerenciamento de resíduos e gestão ambiental.

O Programa de Conformidade do Gerenciamento de Resíduos Sólidos e Efluentes Líquidos nos Portos Marítimos tem orçamento de R$ 125 milhões, com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e possui em torno de 240 profissionais envolvidos. O projeto, coordenado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), compreende ações para adequar os portos frente às exigências ambientais e às vigilâncias sanitária e agropecuária, relacionadas ao gerenciamento de resíduos sólidos e efluentes líquidos.

A segunda fase do programa também servirá para a formação de parcerias. Netto conta que, diariamente, pelo menos duas empresas demonstram interesse ou pedem informações sobre projetos com resíduos. Ele cita uma entidade de comércio português que está organizando uma visita ao Brasil para ampliar a troca de experiências em gestão ambiental portuária. “Portugal juntou suas empresas de resíduos sólidos e efluentes líquidos que desejam trabalhar em parceria”, revela Netto.

O coordenador do projeto em parceria com a SEP, professor Marcos Freitas, do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (Ivig) — ligado à Coppe/UFRJ, destaca que o modelo de redes de universidades valoriza o conhecimento e ajuda na capacitação de profissionais para os portos do futuro. O grupo de trabalho acadêmico, coordenado pelo Ivig, trocou conhecimento com portos norte-americanos e europeus, como os localizados em Roterdã e Antuérpia.

A expectativa é que a SEP divulgue os resultados da primeira etapa do projeto em meados de 2013, provavelmente próximo ao dia mundial do meio ambiente, celebrado em 5 de junho. Antes disso, a secretaria já possui uma ideia dos principais problemas enfrentados pelos portos no tratamento de resíduos. “Cada porto possui uma realidade e cada um deles é completamente diferente de outro porto”, afirma Netto. O Rio de Janeiro, por exemplo, possui grande movimentação de obras e acaba concentrando muito resíduo de material construtivo.

Portos como Santos e Paranaguá, que têm grande sobra de grãos, acabam atraindo fauna sinantrópica — como aranhas, escorpiões, moscas, morcegos e pulgas. Os pesquisadores buscam soluções para evitar a queda de grãos ou, eventualmente, aproveitar o grão que cai para produção de energia ou outra finalidade. Nos portos ligados à exportação de minério, como o porto de Itaguaí (RJ), o pó residual que cai durante a movimentação do produto acaba provocando acidez da água.

Outra preocupação encontrada nos estudos é a recorrência de resíduos oleosos. Na linha de efluentes, muitos portos não têm ligação com rede de esgoto e trabalham com fossas sépticas muito antigas. Freitas, do Ivig, ressalta que cidades, principalmente no Norte e Nordeste, não possuem ou têm muito pouco tratamento de esgoto. “O que puder ser resolvido dentro do próprio espaço portuário é melhor. Estamos tentando valorizar isso nos guias”, diz Freitas.

Uma saída para alguns resíduos sólidos dos portos pode ser a geração de energia elétrica. Atualmente, existem unidades de geração de energia utilizando resíduos das cidades. Freitas explica que, para haver uma unidade geradora dentro do porto, é necessário um volume considerável de resíduos. “Estamos caminhando para isso com a lei de resíduos. Cidades do porte de Santos, Rio de Janeiro e Paranaguá poderiam ter unidades”, avalia.

— A geração de energia a partir dos resíduos está relacionada diretamente à natureza e ao volume deles. É preciso fazer uma análise em cada caso e, havendo condições, essa solução se faz possível e torna-se atrativa de ser implantada — confirma o diretor executivo da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), Carlos Silva Filho.

Os pesquisadores observam que os portos europeus que apostaram na gestão de resíduos, desde o início dos anos 2000, têm menos o que se preocupar atualmente. Nos principais portos europeus também existe a preocupação de reduzir a emissão de gases poluentes. Uma tendência é que os navios desliguem seus motores quando chegam ao porto e utilizem energia da rede elétrica local ou do próprio porto.

De acordo com o professor do Ivig, essa solução será uma oportunidade para o porto, eventualmente, gerar energia e vendê-la para os navios. “Não creio que esteja distante de chegar ao Brasil, mas acho que temos como problema a nossa rede de distribuição dos portos dentro de área urbana, que está sobrecarregada. Teria que ver caso a caso com as companhias elétricas”, ressalta Freitas.

Ele acrescenta que os portos próximos de gates de gás natural terão potencial para colocar plantas de geração para atender esses navios. Segundo Freitas, portos como Santos, Rio de Janeiro, Itaguaí (RJ) e Vitória (ES) — que estão próximos a saídas de gás natural das bacias de Campos e Santos — poderão ter unidades de geração com gás natural. Eles terão possibilidade de fazer um ciclo combinado entre resíduo e gás natural e gerar sua própria energia para atender navios que atraquem no porto, evitando a queima de diesel e óleo combustível.

De acordo com o Atlas Brasileiro de Emissões de Gases do Efeito Estufa e Potencial Energético na Destinação de Resíduos Sólidos, a capacidade instalada de geração de energia a partir de resíduos sólidos chegará a 282 megawatts (MW) até 2039. No entanto, a utilização dessa eletricidade depende de incentivo do governo para torná-la competitiva diante de outras fontes de energia limpa, como a eólica e a solar.

A publicação aponta que o país tem 22 projetos que preveem a geração de energia elétrica em aterros sanitários a partir de resíduos sólidos, mas apenas dois efetivamente comercializam energia, ambos no estado de São Paulo. A capacidade instalada dos 22 projetos é 254 MW. Para que os demais também deem início à produção são necessários investimentos de US$ 5 milhões para cada 3 MW de capacidade, segundo a Abrelpe.

 

Freitas, do Ivig, destaca que o interesse e o apoio dados pelos portos estão sendo fundamentais para o diagnóstico do programa de adequação. Entretanto, o início teve algumas dificuldades por conta da burocracia para entrada das equipes de pesquisa nos portos, além da desconfiança das administrações portuárias em relação ao trabalho. Alguns administradores acreditavam que poderia ser algum tipo de auditoria ou crítica. “Depois que eles compreenderam que era para melhorar, e não para criticá-los, eles ficaram bastante colaboradores”, lembra o professor.

Uma das sugestões do grupo de trabalho é a criação e ampliação de setores de meio ambiente nos portos. Os programas ambientais da SEP abrangem: saúde do trabalhador portuário, capacitação dos TPAs, gerenciamento ambiental, relação porto-cidade e revitalização das áreas portuárias.

A Abrelpe destaca que a lei 12.305/2010, de resíduos sólidos, trouxe uma nova era na gestão de resíduos, baseada em novas definições, novos sistemas e com vistas a um máximo aproveitamento dos materiais. O diretor da entidade, Silva Filho, defende a adaptação da sistemática atual às previsões da lei, que determina uma aplicação geral e irrestrita e chama à responsabilidade diversos setores até então distantes das práticas atuais.

As cidades que receberão terminais portuários em seus territórios passarão a contar com o recebimento de um volume de resíduos adicional àquele que já é gerado pela própria população. Além disso, os resíduos das embarcações costumam ser destinados para centrais localizadas nesse município. Silva Filho diz que as cidades precisam ter conhecimento da quantidade e natureza desses resíduos, para garantir a correta destinação, tratamento e para evitar riscos de degradação ambiental.

Ele avalia que a obrigatoriedade de elaboração de um plano de gerenciamento dos resíduos é o ponto inicial para que qualquer solução definitiva e eficaz seja realmente implementada. “Os responsáveis pelos terminais portuários precisam dispor desses planos para que as demais ações sejam corretamente implementadas. Nesse sentido, faz-se extremamente necessário conhecer a realidade dos portos brasileiros no tocante à existência dos respectivos planos”, enfatiza o diretor executivo da Abrelpe.

A associação verifica a necessidade do encaminhamento de ações estruturadas a partir de um diagnóstico da situação atual. “O levantamento do status atual permitirá o conhecimento do problema e o estabelecimento dos devidos fluxos e soluções aplicáveis. Isso é fundamental antes de qualquer outra medida”, ressalta Silva Filho.

 

Antes da lei 12.305, existia uma resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) que já previa a necessidade de gerenciamento dos resíduos de atividades portuárias e transportes. A política de resíduos reforçou a necessidade de um plano de gerenciamento pelas atividades portuárias para que os resíduos e os rejeitos gerados nos portos sejam devidamente manejados. “Isso força uma ação preventiva dos operadores portuários no sentido de minimizar a geração de resíduos e fazer uma gestão mais segura”, avalia Fabricio Soler, sócio responsável pelo departamento de meio ambiente e sustentabilidade do escritório Felsberg e Associados, que também é professor da Tear Escola de Negócios.

A política nacional e sua regulamentação demandaram adequação dos planos então vigentes. Hoje, no âmbito da elaboração dos planos de gerenciamento, existe um trâmite burocrático que precisa ser observado pelos portos. Na regulamentação da política nacional, estão previstas multas que variam de R$ 5 mil a R$ 50 milhões, no caso de descumprimento do teor do plano de gerenciamento de resíduos.

Soler avalia que esse processo de adequação é o primeiro reflexo da aprovação da lei. Para o advogado, essa ação é fundamental para amenizar o risco de exposição do porto e dos operadores que o utilizam. Ele considera que o processo de inventário dos resíduos se tornou indispensável para o plano de gerenciamento da atividade portuária.

A política nacional também trouxe restrições de importação de resíduos, vinculadas à convenção da Basileia que regulamenta o transporte de resíduos entre fronteiras. O objetivo é evitar incidentes como os que aconteceram em outubro de 2011 envolvendo contêineres com resíduos hospitalares. Na ocasião, a Receita Federal apreendeu no porto de Suape (PE) dois contêineres, cada um com 23 toneladas de carga, proveniente dos Estados Unidos.

As duas cargas estavam identificadas na documentação de importação como tecido de algodão com defeito e seriam enviadas à Santa Cruz do Capibaribe (PE) — polo têxtil da região e onde está localizada a empresa importadora. No entanto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) constatou que se tratava de resíduos sólidos dos grupos A (potencialmente infectantes) e E (perfurocortantes),com características de lixo hospitalar.

As 46 toneladas de lixo hospitalar foram devolvidos aos Estados Unidos em janeiro de 2012. No mês seguinte, a Anvisa multou a empresa responsável pela importação. Dentre os resíduos estavam lençóis e campos cirúrgicos com fluidos orgânicos, catéteres, seringas, luvas, gazes e ataduras usadas. “Esse será um ponto de atenção que deverá ser demandado pelos operadores portuários para evitar que haja qualquer importação ou exportação de resíduos sólidos perigosos, o que não é permitido de forma expressa”, reforça Soler.

A política nacional de resíduos proíbe que lixo de outros países seja trazido para o Brasil. Entretanto, esse tipo de descarte já foi detectado em outros portos do país. Em 2012, uma carga de 20 toneladas de lixo hospitalar, vinda da Espanha, foi barrada pela alfândega da Receita Federal no porto de Itajaí (SC). No meio da carga, que estava em um contêiner, havia lençóis sujos. Em alguns deles, havia a logomarca de um hospital espanhol.

A tendência de conteinerização de cargas aumenta a vulnerabilidade da fiscalização. Soler acredita que o risco de contaminação nos contêineres passará a ser considerado de forma mais detalhada dentro de um plano de gerenciamento. A partir desse planejamento, o operador promove processo de aprovação junto aos órgãos para minimizar o risco de autuação, que pode chegar a R$ 50 milhões segundo decreto 6514, que regulamenta as infrações administrativas ambientais.

Uma das dificuldades para o tratamento de resíduos é a falta de locais para o descarte correto. A maioria dos resíduos, de toda origem, é levada para aterros controlados e lixões. A exposição de materiais tóxicos e químicos pode causar doenças graves. “Temos dificuldade, apesar de termos bons aterros sanitários em operação em São Paulo. No restante do país, a situação é preocupante”, aponta o advogado, autor do livro Gestão de resíduos sólidos - o que diz a lei.

A expectativa é que a cultura de gestão mude nos portos. Geralmente, a cidade carece de um planejamento organizado com o porto e vice-versa. A cidade fica sob o planejamento municipal, o porto sob a administração do privado ou do órgão federal e às vezes não há um planejamento combinado. A Portonave promove a coleta seletiva dos resíduos e conta com o programa de redução, reutilização e reciclagem dos resíduos internos.

Além de separar e destinar corretamente os resíduos, a empresa instalou e gerencia cinco ‘ecopontos’ no município, que permitem à população segregar e destinar seus resíduos para a reciclagem. O projeto Ecoponto é uma iniciativa da empresa para contribuir com o município no atendimento a política nacional de resíduos, promovendo a educação ambiental.

A população recebe informação através de totens de como segregar seus resíduos e levar até os coletores. Em 2011, os ecopontos coletaram e destinaram corretamente mais de três mil quilos de resíduos recicláveis e perigosos. No ano seguinte, foram mais de seis toneladas de material.

Em 2011, a companhia doou 105 contentores de lixo reciclável para uma escola municipal, em Navegantes. Assim como nos ecopontos, painéis informativos oferecem dicas sobre reciclagem, orientando quanto ao uso das lixeiras, o tempo de decomposição dos materiais e os benefícios da reciclagem para o meio ambiente. A Portonave iniciou as suas operações em outubro de 2007.

Em fevereiro, a Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa), autorizou licenciamento, manipulação, acondicionamento, transporte, processamento e destinação final de 38 capacitores elétricos que operavam com óleo Ascarel, cujo uso e comercialização são proibidos desde 1981. O vazamento do Ascarel contamina o meio ambiente e o contato físico com o produto pode causar câncer. Na Appa, não se sabe há quanto tempo este material está armazenado no almoxarifado central.

A empresa vencedora do certame foi a Haztec – Tecnologia e Planejamento Ambiental S/A, do Rio de Janeiro. O processo de destinação final será realizado em duas etapas que devem ser concluídas no primeiro semestre de 2013. “O programa tem como premissa o atendimento das exigências ambientais. Este trabalho não é menos importante que os programas de repotenciamento e de ampliação do porto. Planejar o porto para o futuro exige o atendimento à legislação ambiental”, afirma o superintendente da Appa, Luiz Henrique Dividino.

O óleo Ascarel — nome comercial da mistura de hidrocarbonetos e derivados de petróleo (com Alocloro 124), formando a bifenia policlorada (PCB) — é utilizado nos capacitores como isolante. Os componentes de potência foram utilizados nos sistemas elétricos do corredor de exportação do porto de Paranaguá e, quando proibido, foram substituídos e abandonados no almoxarifado.

A disposição inadequada dos resíduos acarreta uma série de problemas como poluição do solo e das águas superficiais e subterrâneas; geração de odor; desvalorização de áreas e proliferação de vetores de doenças como ratos, moscas e baratas. Muitas vezes os resíduos de serviços de saúde são enviados para lixões ou aterros podendo trazer doenças graves especialmente àqueles que sobrevivem da atividade de exploração do lixo.

As embarcações que transportam carga ou passageiros geram resíduos de cozinha, do refeitório e dos serviços de bordo. Nos últimos anos, vários alertas internacionais foram divulgados visando ao controle de epidemias e a prevenção de pandemias, devido ao risco crescente da disseminação de vírus e outros vetores de doenças, como no caso da gripe aviária. A SEP adquiriu sistemas para esterilizar resíduos, por meio de pressão de vapor d’água com temperatura igual ou superior a 150°C.

Os autoclaves servem para tratar os resíduos gerados nas cozinhas e refeitórios dos navios e nas embarcações com origem ou trânsito em países que tenham registrado ocorrência de epidemia de gripe aviária. É uma medida preventiva, caso ocorra algum alerta de propagação de vírus, reduzindo os riscos para a saúde pública.

O advogado Fabrício Soler avalia que o empenho das atividades portuárias para se adequar à nova legislação de resíduos pode ter um perfil preventivo para evitar penalidade. Segundo ele, os portos estão sendo direcionados a cumprir leis ambientais mais rigorosas para dar gestão mais eficiente ao porto. O conceito de portos verdes passa por certificações, construções sustentáveis e operação dentro de padrões internacionais. Os operadores precisam lidar com situações diversas, desde navios que fazem descartes incorretos até vazamentos de óleo.

Soler ressalta que os planos de gerenciamento da atividade portuária precisarão de uma ponderação específica quanto aos produtos objetos de logística reversa. Os operadores terão que assegurar que os resíduos estão sendo destinados de forma adequada. “Após a utilização de produtos como óleo, lâmpadas e pneus, o porto precisa dar uma destinação ambientalmente correta. Essa destinação pode ser atrelada ou compartilhada com o fabricante ou importador desses produtos”, explica o advogado.

 



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