O órgão gestor de mão de obra portuária (Ogmo) é essencial para que os operadores portuários possam cumprir suas obrigações regulatórias, em especial aquelas que tratam dos aspectos ambientais, sociais e de governança (ASG).
De fato, como cabe ao Ogmo administrar o fornecimento da mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso (cf. art. 32 da Lei dos Portos), a maior parte das informações relativas aos recursos humanos dos operadores portuários estão sob a sua gestão.
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Com efeito, basicamente é o Ogmo que pode fornecer com exatidão informações sobre o número de trabalhadores portuários de cada operador portuário, discriminados por atividades desempenhadas, em dada área geográfica, fornecendo ainda indicadores de diversidade, dentre eles a identidade autodeclarada de gênero, cor ou raça e faixa etária, diagnosticando ainda a rotatividade, a política de remuneração, assim como eventuais benefícios, e ainda esclarecendo dados essenciais para o cálculo da razão entre a maior remuneração individual praticada pelos operadores portuários e a mediana da remuneração individual de todos os seus colaboradores. E mais, o Ogmo é quem pode fornecer, assim como os sindicatos patronais, informações sobre a relação entre os operadores e os sindicatos de trabalhadores, indicando se houve paralisações e greves por exemplo.
Além disso, o Ogmo é que dispõe de informações muito precisas sobre processos judiciais, administrativos ou arbitrais de natureza trabalhista efetivamente relevantes em que os operadores portuários sejam responsáveis solidários, seja em função do valor das possíveis condenações, seja em razão de outros fatores que cabe ao próprio operador portuário definir, em que estes sejam parte ou ainda sejam direta ou indiretamente interessados, indicando os seus principais dados (juízo, instância, data de instauração, partes, valores, bens ou direitos envolvidos, resumo das decisões de mérito proferidas e andamento atual) e, especialmente, informar se a chance de perda é provável, possível ou remota, de modo que os operadores portuários possam identificar seus passivos contingentes, e eventualmente possam provisioná-los de acordo com o Pronunciamento (CPC) 25.
Isso tudo garante ao Ogmo uma posição estratégica no contexto da atividade dos operadores portuários, mas, com a entrada em vigor das Resoluções nº 59/2021 e 80/2022, ambas emitidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a importância do Ogmo alcançou um outro patamar. Isso porque os operadores portuários que sejam companhias abertas, registradas na CVM (nas categorias A ou B) passaram a ter a obrigação de prestar todas essas informações mencionadas acima nos seus formulários de referência. Aliás, ambas a resoluções exigem que as companhias “relatem ou expliquem” o cumprimento de padrões ASG previstos nessas normas, já na elaboração dos formulários de referência de 2023.
E, como visto acima, todos esses dados, previstos nos itens 4.3 e 14 do Anexo C da Resolução nº 80/2022 e pelos itens 4.4 e 10 do Anexo C da Resolução nº 59/2021 da CVM, praticamente só podem ser informados pelos operadores portuários se o Ogmo for capaz de organizá-los e compartilhá-los oportunamente. Em outras palavras, os operadores portuários fiscalizados pela CVM só conseguem cumprir na prática o seu dever regulatório se puderem contar com a ampla colaboração do Ogmo.
Sendo assim, algumas providências parecem ser muito oportunas senão absolutamente necessárias desde já. A primeira delas é que o Ogmo se familiarize com o conteúdo das Resoluções nº 59/2021 e 80/2022 da CVM, identifique em seus bancos de dados e sistemas informatizados se as informações estão todas disponíveis, se são acessíveis e, se podem ser organizadas e fornecidas aos operadores portuários interessados, em especial as que se referem aos indicadores de diversidade, que são a grande novidade nos relatórios de referência em matéria de recursos humanos.
Em paralelo, cabe aos próprios operadores portuários identificar desde logo os critérios de relevância dos seus processos e contingências, isto é, o que os torna necessário relatar nos formulários de referência, uma vez que devem ser justificados esses critérios e comunicados o quanto antes ao Ogmo, para que este possa preparar o seu próprio relatório segundo esses critérios.
Outra providência na qual o Ogmo e os operadores portuários podem trabalhar juntos é na elaboração da matriz de materialidade, por meio da qual são identificadas questões relevantes para o negócio dos próprios operadores portuários, mas na visão dos seus stakeholders, dentre os quais estão certamente os trabalhadores portuários avulsos.
Mas essas são apenas as providências mais imediatas que podem e devem ser tomadas. Afinal, é certo que os padrões ASG estão evoluindo, assim como evolui também a regulamentação a esse respeito e, vários outros órgãos estão planejando adotar exigências semelhantes para auxiliar os ramos regulados da economia, como é o caso do setor portuário, a atingir novos padrões de excelência ASG na sua gestão.
Enrico Miguel Nichetti é advogado, pós-graduando em Direito Portuário e Aquaviário do Trabalho pelo CEDIPA da FINACI, membro da Comissão de Direito Aduaneiro e Portuário da OAB/PR e sócio fundador da NFC Advogados
Rafael Ferreira Filippin é advogado, doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela UFPR, vice-presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB/PR e sócio fundador da NFC Advogados
Vicente Ferrari Comazzi é advogado, pós-graduado pela Escola da Magistratura do Trabalho – EMATRA, membro da Comissão de Direito Sindical da OAB/PR e sócio fundador da NFC Advogados