A evolução dos regulamentos da Organização Marítima Internacional (IMO) tem almejado práticas que buscam não apenas aumentar a segurança nas operações marítimas, mas também reduzir o impacto ambiental do setor. Desde a implementação do Anexo VI da Convenção MARPOL, que estabelece limites para as emissões de gases poluentes provenientes de embarcações, a IMO tem se dedicado a refinar e expandir suas diretrizes para incluir medidas que possam ser estratégicos para o alcance da meta de emissões líquidas zero de GEE “até ou próximo de 2050”, com pontos de verificação indicativos para reduzir as emissões de GEE em 20% (buscando 30%) até 2030 e 70% (buscando 80%) até 2040.
Para as embarcações offshore a aplicação das normas da IMO apresenta desafios únicos. Essas embarcações, muitas vezes equipadas com propulsão não convencional (diesel-elétrica) e sistemas de posicionamento dinâmico (DP), têm perfis operacionais distintos em comparação com navios de cabotagem e longo curso. A eficiência energética, tradicionalmente calculada pela relação entre consumo de combustível e distância navegada combinada com a capacidade de carga, não se aplica diretamente a embarcações cuja principal função ocorre quando estão sob DP, mantendo uma posição “estática” em operações críticas.
Reconhecendo essa diferença, a IMCA (International Marine Contractors Association), desenvolveu indicadores específicos para embarcações de apoio marítimo. Em 2019, no documento MEPC 74/6, foram propostos dois indicadores específicos: Proxy A e Proxy B.
Proxy A baseia-se no consumo anual de energia da embarcação, em contraste, Proxy B, conforme observado na fórmula 2 considera a “potência nominal contínua máxima” (Maximum Continuous Rated, em inglês). MCR é a potência máxima que um motor diesel marítimo pode fornecer de forma contínua sem sofrer danos ou desgaste excessivo. Essa potência é determinada pelo fabricante sendo considerada segura para operação contínua do motor em condições normais. Em outras palavras, é a capacidade máxima de energia que o motor pode gerar sem comprometer sua integridade ou vida útil.
O GFI (GHG Fuel Indicator), advém da resolução da IMO Guidelines On Life Cycle GHG Intensity of Marine Fuels. Essa resolução ficou conhecida como o Guia do Ciclo de Vida (LCA Guidelines) e mede a intensidade das emissões associada ao consumo de combustível, proporcionando uma métrica direta da contribuição das embarcações para as emissões de gases de efeito estufa.
Além desses proxies, foi desenvolvido pelo Brasil o OEI - Operational Efficiency Indicator representado pela fórmula 2, o qual foi submetido a IMO e é identificado como número ISWG 17/2/10. O objetivo do OEI é ser um validador do GFI, com adoção voluntária considerando não apenas o consumo de combustível, mas também as variações da potência dos motores utilizados durante as operações.
O OEI através da sinergia com o GFI pode se tornar um indicador de análise por meio de análise comparativa para validação dos resultados obtidos no GFI.
A proposta de indicadores para embarcações de apoio marítimo, conforme descrito no MEPC 304, faz parte das medidas de curto prazo priorizadas pela IMO para melhorar a eficiência energética e reduzir as emissões de gases de efeito estufa. No entanto, uma das maiores dificuldades enfrentadas pela IMO é definir o que constitui eficiência energética para embarcações com propulsão não convencional, como as de propulsão diesel-elétrica, predominantes entre os navios de posicionamento dinâmico.
Ao analisar o impacto das normas da IMO sobre a eficiência energética dessas embarcações, torna-se evidente que o modelo matemático tradicional, baseado em deslocamento e capacidade de carga, precisa ser adaptado para refletir as realidades operacionais das embarcações de apoio marítimo. O desenvolvimento de proxies específicos, como Proxy A e Proxy B, juntamente com o uso do GFI e do OEI, representa um avanço significativo nessa direção, oferecendo parâmetros mais adequados para medir e melhorar o desempenho energético dessas embarcações em um contexto operacional complexo e dinâmico.
Fórmulas de Cálculo dos Indicadores
Importante destacar que todos os indicadores que estão sendo referenciados pela neste estudo estão alinhados com a estratégia europeia UE2015/757 , centrando-se na relação entre as emissões de GEE (Gases de Efeito Estufa) e a energia consumida pela embarcação. A principal diferença entre os indicadores reside em suas abordagens: o OEI utiliza as potências reais em cada modo de operação, proporcionando uma avaliação mais precisa e adaptada às condições reais. O Proxy A, por outro lado, baseia-se na potência MCR (Maximum Continuous Rating), um valor fixo e conservador que, embora seguro, não reflete a realidade operacional, pois a embarcação não opera 100% do tempo nessa potência máxima e o Proxy B utiliza as horas de operação para medir a eficiência energética da embarcação Já o GFI (GHG Fuel Indicator) considera apenas o consumo de combustível, desconsiderando diretamente a potência utilizada, abordando-a de maneira indireta por meio do fator consumo.
1. OEI (Indicador de Eficiência Operacional): O OEI é um indicador proposto para medir a eficiência operacional real do navio, considerando as variações de potência nos diferentes modos de operação. Esta abordagem dinâmica apresenta resultados mais precisos e efetivos da eficiência energética decorrentes dos diversos modos de operações diárias de um navio. O conceito da expressão OEI é semelhante ao GFI e derivado do Proxy A.
O seu cálculo vem da fórmula:
Consumo em g de combustível × fator de carbonoxx (1)
Σ Potência média real correspondente a cada modo de operação x horas, correspondente a cada modo de operação
Esta fórmula considera as peculiaridades dos modos de operação, oferecendo uma avaliação detalhada e realista da eficiência energética do navio e das emissões delas decorrentes. Os modos de operação selecionados são operação em DP, fundeado, bordejando, navegando e atracado.
2. Proxy A (Indicador de Eficiência de Design): Proxy A, conforme definido pela Associação Internacional de Contratantes Marítimos (IMCA), é um indicador que avalia a eficiência energética com base nos parâmetros de design do navio. Esta abordagem é baseada na potência nominal dos motores e seu cálculo sobre o consumo real de combustível, resultando em uma visão estática da eficiência energética.
Consumo em g de combustível × fator de carbono (2)
Σ Potência no MCR de cada motor × horas
Proxy A apresenta uma curva de comportamento exponencial, com variações mais acentuadas ao longo dos anos.
3. Proxy B – proxy based on yearly energy consumption: O Proxy B é um indicador projetado para avaliar a eficiência energética de uma embarcação com base no consumo anual de energia. Ele é calculado a partir da produção total bruta de energia gerada em um ano, usando a seguinte fórmula:
Total gross power output generated/year
(∑ installed rated power per engine x yearly running hours per engine)
Este indicador oferece uma visão ampla da eficiência energética, considerando a totalidade das operações da embarcação ao longo de um ano. Diferentemente do OEI, que avalia a eficiência em um nível operacional, o Proxy A fornece uma perspectiva mais global e menos detalhada das operações anuais do navio.
4. GHG Fuel Indicator (GFI): Mede a intensidade de carbono associada ao consumo de combustível (g CO₂e/MJ).
Consumo em g de combustível × fator de carbono (3)
Unidade de energia usada a bordo
O GFI fornece uma métrica direta da contribuição das embarcações para as emissões de gases de efeito estufa.
Conceitos das Métricas Proxy A, GFI (Greenhouse Gas Intensity) e OEI (Indicador de Eficiência Operacional) para o offshore.
Apesar das diferenças nas fórmulas e as abordagens na medição de eficiência energética, utilizada pelos indicadores, Proxy A e B, OEI e GFI compartilham várias semelhanças:
• Princípio de consideração de todas as emissões totais da embarcação: Basicamente, temos o consumo de combustível multiplicado pelo fator de emissão de carbono;
• Incorporação do fator de carbono: Todas as fórmulas incluem o fator de carbono, que converte o consumo de combustível em emissões de CO₂eq. Esse fator é crucial para deduzir o impacto ambiental do consumo de combustível por unidade de energia;
• Medição de potência: Tanto o Proxy A quanto o OEI utilizam a potência dos motores como uma variável-chave. O Proxy A considera a potência nominal dos motores (MCR), enquanto o OEI usa a potência média real nos diferentes modos operacionais;
• Consideração do tempo: Tanto as fórmulas do Proxy A quanto do OEI integram o fator tempo. No Proxy A, o tempo é refletido nas horas de operação dos motores. No OEI, o tempo é considerado para cada modo específico de operação.
Aspectos relativos aos Modos de Operação
Considerar os modos de operação é vital para que a avaliação da eficiência energética seja verificada no contexto da segurança operacional de embarcações marítimas. Cada modo de operação, como, por exemplo, atracado, fundeado, bordejando, sob DP (Dynamic Position), ou navegando, possui exigências específicas que afetam diretamente o consumo de combustível e as consequentes emissões de GEE.
Importante destacar que estes modos de operação citados acima estão fora do nível decisório dos comandantes das embarcações, bem como das empresas às quais elas pertencem, por atender a contratos de serviços.
Justificativa da proposta: Modos de Operação e Layouts Pré-definidos
As embarcações geralmente possuem layouts pré-definidos para cada modo de operação, dos quais faz parte a condição da praça de máquinas. Esses layouts contemplam diversos fatores, que vão desde a quantidade de motores em linha à potência disponível para cada modo de operação, até a adição de mais motorização para suprir necessidades energéticas adicionais. Essas demandas podem ser necessárias quando algum equipamento específico está em uso ou quando as condições ambientais ofereçam fragilidade à operação.
Por exemplo: durante as operações em modo DP, onde a precisão de posicionamento é crucial, a demanda energética é significativamente maior. Para garantir que a embarcação permaneça estável, pode ser necessário utilizar mais motores ou aumentar a potência disponível nos que se encontram em operação. Esses ajustes garantem uma operação segura e eficiente, minimizando os riscos decorrentes de falhas e otimizando o consumo de combustível.
Modos de Operação no Cálculo de Eficiência Energética
Os consumos decorrentes dos modos de operação podem compor o cálculo da eficiência energética ao considerar o consumo médio real de cada situação, ao invés do MCR (Maximum Continuous Rating) utilizado no Proxy B. O OEI proporciona um cômputo mais realista de consumo de combustível, refletindo as condições operacionais reais do navio, em vez de um adotar um consumo fixo sob certa potência como o empregado no cálculo dos indicadores EEDI (Energy Efficiency Design Index) e EEXI (Energy Efficiency Existing Ship Index).
Syndarma/Abeam tem sido fundamental na proposta de soluções para o setor offshore. Com a atualização da Estratégia de Descarbonização da IMO, adotada em julho de 2023 durante a MEPC 80, reforça-se o papel central das administrações nacionais no alcance das metas globais de redução de emissões.
Essa estratégia permite a implementação de medidas que promovem sinergias técnicas e operacionais, especialmente relevantes para embarcações offshore, que operam a maior parte do tempo em Dynamic Positioning (DP) e, até o momento, não têm suas atividades de "transporte de trabalho" claramente definidas pela IMO. Assim, torna-se crucial considerar os diferentes modos operacionais dessas embarcações no contexto regulatório.
Atualmente, mais de 85% da frota brasileira registrada sob bandeira nacional é composta por embarcações offshore. Isso reforça a importância do envolvimento do Brasil, impulsionado pelos armadores do Syndarma/Abeam, que, proativamente, propuseram soluções para o setor offshore, anteriormente não contemplado pelas regulamentações como o EEDI, EEXI e CII, mas agora incluído no GFS.
A sinergia entre o GFS (GHG Fuel Standard) e o OEI (Operational Efficiency Indicator) garante um monitoramento mais preciso e eficaz, assegurando maior controle sobre as emissões e o desempenho operacional dessas embarcações.
Luciana Suman é CEO da MarMec Engenharia, Consultoria & Treinamentos
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