A ampliação dos programas de financiamento da indústria naval com participação de grandes bancos privados brasileiros pode ajudar a contornar um dos problemas do setor: a dificuldade de contratantes de encomendas em estaleiros nacionais fecharem contratos com os agentes financeiros, mesmo com projetos aprovados pelo Fundo da Marinha Mercante (FMM), por causa da dificuldade de conseguir seguros para cobrir o financiamento. A alternativa foi apresentada pelo secretário nacional de hidrovias e navegação do Ministério dos Portos e Aeroportos (MPor), Dino Antunes Dias Batista, na última terça-feira (19) na conferência Financiamento à Construção Naval, durante a Navalshore 2025.
Segundo Antunes, no modelo atual, em que o principal agente financeiro é o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), há casos de projetos que caducam porque os interessados no financiamento não conseguem se adequar às regras do banco para securitização da operação e apresentar as garantias pedidas, como, por exemplo uma fiança bancária, considerada cara, ou porque a instituição financeira não aceita assumir o risco.
Antunes explicou que, antes de liberar o financiamento, o financiador avalia tanto o projeto como a empresa para estabelecer regras que evitem inadimplência e, como muitas vezes o contratante não conseguem cumpri-las, os contratos acabam não sendo fechados. Por isso, sugeriu que a participação de bancos privados que já têm como clientes as empresas que pedem o financiamento pode ser um facilitador porque, no caso, a instituição financeira analisaria também o histórico de sua relação com quem pede o crédito.
Além disso, disse ele, a participação dos grandes bancos no financiamento à construção naval, não só aumentaria as possibilidades de liberá-lo como seria também garantia de que não haveria inadimplência em relação aos recursos oriundos do FMM, apesar de os valores dos pedidos serem altos, muitas vezes superando R$ 1 bilhão. “Grande bancos têm receitas de muitos bilhões de reais e não deixariam de pagar um bilhão de reais à União”, explicou.
Carlos Frederico Ferreira, CEO da Austral Seguradora e que representou na Conferência a Confederação Nacional das Seguradoras, argumentou em sentido parecido ao de Dino Antunes. Ele explicou que o seguro em operações financeiras serve para mitigar riscos, mas não é solução definitiva, lembrando que sua concessão é feita caso a caso, com as seguradoras avaliando os riscos envolvidos em cada contrato e cada empresa que recorre a ele.
Elisa Salomão Lage, do BNDES, reforçou que, mesmo tendo isso aprovado pelo FMM, o financiamento tem que ser submetido ao banco, que é o principal financiador de projetos de longo prazo no Brasil. E explicou que, para que seja liberado, são exigidas garantias. Entre elas, podem ser citadas a garantia bancária e, em casos como, por exemplo, os de embarcações e estruturas encomendadas para atender à Petrobras, valores que serão recebidos da estatal para cumprir os contratos. Mas nem todos podem usar esses instrumentos e, por isso, a instituição muitas vezes fica impedida de liberar os recursos.
Outra alternativa sugerida por Antunes seria a criação de um fundo garantidor robusto para o setor naval. “Estamos tentando criar instrumentos para o setor, para dar garantias ao financiamento”, informou, lembrando que esse processo ainda tem que superar a barreira de que esse fundo seria disponibilizado com recursos do orçamento da União, diferentemente do FMM, que tem recursos próprios e é específico.
Ele disse que essa poderia ser uma solução para destravar a liberação de recursos para projetos que são aprovados pelo Conselho do Fundo da Marinha Mercante, mas não se concretizam por causa da impossibilidade de os pretendentes se adequarem às exigências do agente financeiro. O secretário de hidrovias e navegação do MPor informou que, desde 2023, já foram aprovados pelo FMM projetos de R$ 70 bilhões e que há em estudos mais R$ 50 bilhões, inclusive para infraestrutura.
Daniel Bonavita, head de Infraestrutura da Caixa Econômica Federal, também defendeu a criação de um fundo garantidor, disse que CEF tem possibilidade de participar do financiamento de embarcações e de outros projetos de longo prazo e que espera anunciar alguns ainda este ano. Segundo ele, há dois anos a empresa passou a ter estrutura para analisar projetos de infraestrutura.
Bonavita explicou ainda que a CEF não participa diretamente do financiamento da construção naval, mas disse acreditar que ela tem capacidade de ser um reforço para o setor. “Há demanda, e a Caixa tem recursos”, comentou. Mas o executivo da CEF argumentou ainda que é preciso ter instrumentos, além de garantias e seguros, que sustentem investimentos de longo prazo e que permitam que projetos que demandam recursos volumosos sejam aprovados e concluídos. “Garantia não é sinônimo de capacidade de pagamento”, lembrou, dizendo que o país precisa, mais do que uma política de governo, de uma política de Estado para esses setores.