As empresas brasileiras instaladas na Argentina começam a ser informadas pelo governo da presidente Cristina Kirchner que irá aumentar ao longo deste ano a escalada protecionista no país para conter as importações. Na última semana, executivos foram avisados que nenhuma importação de bens acabados será mais autorizada, a não ser que o importador comprove que a mercadoria não conta com produção no país.
Desta vez, o objetivo da medida não é impulsionar a produção local, mas preservar o saldo comercial, que foi de US$ 11 bilhões no ano passado. Desde dezembro, a área de comércio exterior no governo passou do Ministério de Relações Exteriores para o âmbito do Ministério da Economia, em que a figura central é o secretário de Comércio, Guillermo Moreno, e não o ministro Hernán Lorenzino. É o próprio Moreno que tem conversado diretamente com os empresários, segundo afirmou um dos participantes dessas reuniões.
Um dos novos controles tornou-se público anteontem, com uma nova portaria da Afip, o órgão local da receita. A partir de fevereiro, todos os importadores deverão apresentar uma declaração jurada sobre o total que pretendem comprar do exterior ao longo do ano. Foi por meio de um controle aparentemente burocrático introduzido pela Afip, em novembro, que o governo argentino travou o mercado de câmbio de pessoa física no país, contendo uma corrida especulativa contra o peso argentino.
Sem ter como restringir importações em setores como o de energia, em que o déficit do país com o exterior deve atingir US$ 6 bilhões neste ano, segundo cálculo do consultor privado Daniel Montamat, e sem controlar variáveis como o preço da soja no mercado internacional ou o ritmo das compras de seus maiores clientes, o Brasil e a China, o governo argentino procura agir sobre as encomendas de produtos acabados, que somam cerca de US$ 14 bilhões por ano. Mas já há indícios que a transferência da área de comércio exterior para a esfera de Moreno começa a dificultar as importações até mesmo de insumos.
Na terça, a Fiat paralisou atividades em sua unidade em Córdoba, alegando não ter obtido licença para a importação de autopeças. A decisão da Fiat irritou o governo, que respondeu ontem em uma entrevista da ministra da Indústria, Debora Giorgi, à agência oficial Télam. A ministra classificou a atitude da montadora de "mesquinha e alienada", mas afirmou que a liberação das licenças - uma área da qual a ministra não é mais responsável - foi concedida para que a fábrica volte a funcionar "no menor prazo possível".
Em comunicado, a Fiat Argentina confirmou que decidiu retomar a produção ante "a firme determinação da Secretaria de Comercio Exterior de agilizar a tramitação das licenças". A empresa previu, além disso, a normalização das atividades hoje. Segundo a Fiat, as licenças que venceram em dezembro não tiveram renovação automática outorgada pela nova secretaria, comandada pela economista Beatriz Paglieri. A montadora alega que foi a primeira a ter que tramitar licenças na nova secretaria e atribui o atraso a um "ajuste das áreas administrativas do governo ao novo regime". A empresa destacou também que a maior parte da sua produção, de 700 veículos diários, se destina à exportação.
A Fiat Argentina possui a produção integrada com a Fiat brasileira. A unidade se abastece de autopeças no Brasil e transfere para o país cerca de 85% de sua produção. De todas as montadoras, é a que mais depende do país vizinho para a sua operação na Argentina. O setor automotivo é o principal na balança comercial entre os dois países.
Fonte: Valor EconômicoCésar Felício | De Buenos Aires
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