Petrobras: Conselho ganhou poder para decidir sozinho emitir até R$ 150 bilhões.
Apenas 60 pessoas participaram da assembleia geral extraordinária (AGE) realizada ontem no auditório da estatal, com capacidade para 259 pessoas.
Trata-se do encontro que deu liberdade para o conselho de administração da empresa lançar, quando achar melhor, a maior oferta de ações já realizada no mundo. O colegiado pode decidir, numa tacada só, ou em parcelas, ampliar o capital da Petrobras em até R$ 150 bilhões. Na prática, um aumento de quase 55% sobre o valor de mercado da empresa, de aproximadamente R$ 280 bilhões
A reunião durou meia hora, das 15h30 às 16h, e foi precedida de um filme institucional sobre a segurança da sala, indicando as saídas de emergência, a localização dos extintores e das portas corta-pânico, à exemplo do que se vê nos cinemas. No hall de sala, os participantes tinham à disposição um bufê no qual foram servidos sucos naturais, refrigerantes, sanduíches, salgados e doces, tanto na entrada quanto na saída da assembleia.
Apesar do número pequeno de participantes, a maioria (84%) dos acionistas com direito a voto estava representada. A União, acionista controlador com 32,13% do capital total e 55,6% do capital votante, foi representada pela procuradora chefe da Fazenda Nacional, Adrienne Giannetti Nelson de Senna Jobim, que compôs a mesa diretora da assembleia com o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, o diretor financeiro e de relações com investidores, Almir Barbassa, e a acionista minoritária Heloisa Zoratini.
Alguns presentes representavam dezenas de acionistas, como um executivo que participou em nome de fundos de investimentos estrangeiros administrados pelos bancos Itaú e HSBC, que assinou na diagonal três páginas da ata de presença na assembleia.
Depois que Zoratini leu o edital de convocação e a exposição da proposta de aumento de capital, os motivos e o cenário para a operação, Gabrielli abriu para que os acionistas se manifestassem. Quatro acionistas falaram, dois contra e dois a favor da operação.
Ralf Figueiredo de Azevedo, representante do banco J.P. Morgan Chase, em nome de cotistas de diversos fundos de investimentos, pediu que se registrasse a aprovação da proposta pelo voto de seus cotistas em um total de "504 milhões de ações a favor, 8,8 milhões contrários e 101,6 milhões em abstenções".
O presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras, Fernando Siqueira, disse que a entidade "vota a favor" da proposta de capitalização, "tendo em vista a descoberta fantástica de uma área petrolífera extremamente promissora". Na defesa de sua posição, Siqueira disse que o aumento de capital poderia preparar a empresa para o desenvolvimento das recentes descobertas no pré-sal. "Certamente serão necessários investimentos fortes em equipamentos, plataformas e navios, que necessitam antecedência para que não sejam comprados de última hora com preços supervalorizados", afirmou.
Falaram contra a capitalização dois acionistas individuais, os baianos Romano Guido Allegro, consultor de empresas, dono do restaurante Diliana, de Salvador, e o corretor de seguros Jorge Santos. Ambos centraram sua crítica principalmente na diluição da participação dos minoritários.
Allegro leu um "manifesto" em que se declarou contrário à proposta devido ao momento pouco favorável do mercado de ações, com a predominância da aversão ao risco causada pela crise financeira no mercado europeu. Por causa da crise, Allegro calcula que as ações ordinárias da estatal precisariam subir 28,65% e as preferenciais 32,2%, apenas para voltar ao preço de dezembro do ano passado. "Não há justificativa racional para se tomar vultosa quantia numa única vez, visto que o desembolso ocorrerá diluído ao longo dos próximos cinco anos".
O empresário gourmet não descarta ir à Justiça contra a possibilidade de que a União use títulos públicos para colocar recursos na empresa, enquanto os minoritários terão que fazer aportes em dinheiro. "Foi uma coisa unilateral, brutal", reclamou o consultor, que tem cerca de 17 mil ações ordinárias da companhia - equivalentes a uma aplicação da ordem de R$ 570 mil.
Outro crítico da operação, o advogado Fernando Gama Santos não pretende questionar juridicamente, mas fez questão de se mostrar contrário ao aumento de capital.
Jorge Luiz Santos, que comprou ações com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), disse que o valor proposto pela empresa vai deixar os minoritários como ele "para trás". "Tudo que tenho em disponibilidade financeira apliquei em ações da Petrobras. Ninguém me mandou eu fazer isso (aplicar tudo em Petrobras), mas eu fiz, e agora estou vendo a possibilidade da minha posição ser diluída. Sei que ficarei para trás."
A cientista política Janet Colombo, uma acionista minoritária individual de aproximadamente 70 anos (ela não quis revelar a idade), estava ciente de que teria que gastar dinheiro para manter sua posição em ações da empresa. Mesmo assim estava a favor da operação. "A longo prazo vamos ganhar", afirmou, otimista, a Sra. Colombo, uma americana nascida em Nova York que veio para o Brasil em 1983 com o marido brasileiro, já falecido, e desde então passou a comprar ações.
Hoje, contou, vive do rendimento de seus papéis na Petrobras, Vale e Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), entre outras, e não perde assembleias de acionistas destas empresas. Esteve na da Vale recentemente e só lamentou que lá, ao contrário da assembleia da Petrobras, "não tinha nada para comer".
Questionado sobre a possibilidade de a Petrobras enfrentar processos judiciais questionando a capitalização, o presidente da empresa, José Sergio Gabrielli, se mostrou seguro e otimista em relação à operação. Segundo ele, toda a estrutura montada para a capitalização é "perfeitamente legal" e a operação será feita nos moldes de uma chamada de capital normal. Mais uma vez, o executivo evitou estabelecer um prazo ou um teto para os recursos que serão obtidos com a capitalização. "Será informado no momento adequado."
Fonte: Valor Econômico/Janes Rocha e Rafael Rosas, do Rio
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