O Brasil está entre os maiores exportadores de soja para a China e negocia a ampliação do comércio de outros produtos com o país asiático. Quem vê apenas por esse lado, acha que o Brasil está fazendo o dever de casa, tirando o melhor dessa relação e que a tendência, mesmo que acomodada, será a de vender sempre mais aos chineses.
Mas na verdade, o Brasil ainda vê a China como um urso hibernando que, de tempos em tempos, acorda com fome. O país continua olhando a China como um concorrente, quando deveria vê-la como uma parceira. Em meio a um caldeirão de novas perspectivas, as equipes brasileiras, que deveriam se encontrar com os chineses a cada três meses, continuam se vendo a cada dois anos.
"Os ministérios e suas subcomissões precisam fazer com que os mecanismos já existentes funcionem de fato. Os encontros precisam acontecer trimestralmente e devem aproximar mais o setor privado no desenvolvimento dessa estratégia", afirma Rodrigo Tavares Maciel, chefe do Departamento da Ásia da LLX - empresa do Grupo EBX - durante a palestra "China, inimigo ou parceiro?", que fez no seminário "Agronegócios de Futuro", em São Paulo.
Segundo Tavares Maciel, que já foi do Conselho Empresarial Brasil-China, os encontros conjuntos precisam ser frequentes e os brasileiros "devem ser mais ativos, promovendo feiras e exposições dos nossos produtos na China". "Não adianta ir lá uma vez e não voltar mais. Quando o presidente vai, vai uma grande delegação, mas depois fica um vazio de dois a três anos sem que brasileiros e chineses conversem", acrescenta.
Nessa estratégia de aproximação, Tavares Maciel sugere que a Embaixada Brasileira seja reforçada, mas que haja também um suporte do setor privado, dos ministérios e das subcomissões para que a imagem do Brasil se fortaleça na China. O executivo refere-se à subcomissão de Quarentena, Inspeção e Vigilância Brasil/China, no âmbito da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concentração e Cooperação (Cosban). "O Brasil ainda é um país desconhecido dos chineses, continuamos sendo comprados pelos chineses, quando deveríamos vender", reforça.
O executivo lembra que, em 2008, quando estava no Conselho Empresarial Brasil-China, foram identificados 560 produtos que poderiam ser exportados para aquele país, gerando US$ 200 bilhões em divisas. "Mas fizemos pouca coisa", afirma.
No seu entender, o Brasil conserva ideias erradas sobre a China, olhando mais o cenário de desaceleração, que fato ocorre, do que os números que colocam o país asiático como superpotência e mercado quase inesgotável. "A abertura do mercado de carnes de porco, frango e bovinos na China foi um processo extremamente lento e muitas vezes em razão da nossa deficiência na negociação", reforça.
Apesar de um processo de desaceleração, a China cresce 8% ao ano e "em 2012 o Produto Interno Bruto (PIB) chinês poderá repetir os 8%, o que é fenomenal para um país com US$ 7 trilhões de PIB", diz. Ele afirma que a China tem ajudado o Brasil a superar a crise internacional e é um aliado para manter a estabilidade durante a crise, superada em grande parte em razão das trocas comerciais. Segundo o executivo, "o comércio com a China, que era praticamente de US$ 2 bilhões há uma década, atingiu US$ 70 bilhões no final de 2011".
A China é hoje o primeiro parceiro comercial do Brasil, ultrapassando a Argentina e o os Estados Unidos. "O agronegócio brasileiro foi muito beneficiado e a soja está entre os três maiores produtos que exportamos para a China, ao lado do minério de ferro e do petróleo", afirma.
Tavares Maciel lembra que é preciso que novos mercados sejam formados na China porque tudo o que o país compra provoca um impacto gigantesco na economia brasileira. "Em 2005, o Brasil não exportava açúcar para os chineses e em 2011 embarcamos US$ 1 bilhão. As nossas carnes, que finalmente conseguimos fazer entrar no mercado chinês, já somaram quase US$ 500 milhões no ano passado", afirma o executivo.
Esse movimento continuará, segundo ele. "A China já representa 8,93% do consumo mundial. Até 2020, o esperado é que ela seja o terceiro maior consumidor do mundo", diz.
Paralelamente, o executivo lembra o processo de urbanização que acontece naquele país. "Em 2011, as populações urbana e rural se equipararam pela primeira vez na história, o que vem gerando mais empregos, ampliando a renda e, automaticamente, aumentando e melhorando o consumo", diz.
O número de novas cidades que serão construídas nos próximos 10 a 20 anos deixa muito claro o potencial. "O mercado consumidor continua com um ritmo de crescimento significativo, devendo em 2012 repetir a mesma taxa de crescimento do ano passado", afirma o executivo. Na sua definição, "para o Brasil, principalmente para o agronegócio brasileiro, a China é um parceiro estratégico, não é um inimigo".
"É claro que tem competição, mas a China também é um grande exportador do agronegócio", diz Maciel. Ele acredita que o país asiático terá que melhorar a produtividade de sua produção, e obviamente isso vai acontecer. "Mas isso não tira o espaço do produto brasileiro no mercado chinês. Ao contrário, o Brasil tem um mercado enorme, mas precisa ter estratégia, ter apoio do governo e ações mais eficazes para conquistar os chineses", afirma. E acrescenta: "É preciso que o Brasil encare a China como um parceiro estratégico de verdade, coisa que ainda está muito no discurso".
Fonte: Valor Econômico/Rosangela Capozoli | Para o Valor, de São Paulo
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