O movimento global para convencer fundos de pensão, universidades, instituições religiosas e fundações a não investir no setor de petróleo, carvão e gás conseguiu atrair investidores com ativos calculados em US$ 11 trilhões.
A campanha contra investimentos em um dos principais vetores da mudança climática saltou de 181 instituições com US$ 52 bilhões em ativos em 2014 para US$ 11 trilhões agora e mais de 1.115 entidades. O resultado bate as metas iniciais da campanha — chegar a US$ 10 trilhões em 2020.
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“Chegamos a um marco histórico”, comemora Emira Woods, da Shine, uma das organizações que patrocina a campanha e busca formas de mobilizar recursos financeiros para dar acesso a energia elétrica a quem não tem — um número estimado em um bilhão de pessoas no mundo.
O relatório “US$ 11 trilhões e contando” foi lançado nesta segunda-feira (9) na África do Sul e assinado por pesquisadores das ONGs 350.org e Divest Invest. É na Cidade do Cabo que começa, nesta terça-feira (10), a conferência “Financiando o Futuro” organizada por um coletivo de fundações, entidades religiosas e ONGs.
É a primeira conferência do gênero que acontece no hemisfério sul. O termo desinvestimento foi cunhado nos anos 1960, como forma de boicotar o regime do Apartheid da África do Sul.
O evento, que reunirá 300 delegados de 44 países, acontece em um momento de conflitos e mortes na África do Sul motivados por xenofobia a imigrantes de outros países africanos. Há também uma forte onda de crimes e violência contra mulheres. Nos últimos dias, seis mulheres foram mortas apenas na Cidade do Cabo.
Aumento da consciência da emergência climática
O relatório está pontuado de exemplos de fundações, fundos fiduciários e fundos de pensão que anunciam desinvestimentos em suas carteiras. Cresce a consciência da emergência climática “e a decisão de desinvestir em indústrias doentes e de risco financeiro”, diz o relatório.
A gestora Legal & General Investment Management, uma das maiores do Reino Unido, anunciou que está iniciando o processo de desinvestir na Exxon. A Amundi, uma das dez maiores gestoras de ativos do mundo, adotou, há três meses, uma política de deixar de colocar recursos em companhias que têm mais de 30% de seu negócio relacionado a térmicas a carvão.
“Investidores têm, hoje, uma escolha a fazer: ou continuam apoiando um setor que nos levará a um ponto de não retorno na crise climática ou começam a se engajar nas alternativas”, disse Clara Vondrich, diretora da Divest Invest, ONG baseada nos Estados Unidos e que busca compromissos de desinvestimento no setor de combustíveis fósseis de fundações como a Rockfeller ou o Fundo Soberano Norueguês, por exemplo.
“Em 2002, a CIA [agência de inteligência dos EUA] anunciou que a maior ameaça à paz global vem dos impactos da mudança do clima”, disse Kumi Naidoo, secretário-geral da Anistia Internacional. “Estamos perdendo tempo e a janela de oportunidade se fecha”, continuou.
Segundo o relatório, a tendência do desinvestimento está acelerando. Os compromissos abrangem 48 países e 70% vêm de fora dos Estados Unidos. A indústria do carvão é a mais atingida.
As grandes seguradoras e os fundos de pensão são os maiores agentes do total de recursos comprometidos com desinvestimento em combustíveis fósseis. Desde 2016, 75 fundos de pensão prometeram desinvestir no setor de fósseis. Instituições religiosas são as que mais contribuem com o esforço em número de iniciativas.
O australiano Mark McVeigh, 24 anos, abriu o primeiro processo contra um fundo de pensão relacionado à mudança do clima. “Eu queria saber onde estavam colocando os recursos da minha aposentadoria”, disse. “Terei 60 anos em 2055 e espero que o aquecimento não tenha ultrapassado os 2ºC.
“Mas eles não tinham nada, nenhuma análise. Me disseram apenas que os investimentos estavam em sintonia com os planos do governo e da proteção do ambiente, o que me pareceu muito vago”, disse McVeigh.
O processo contra a Retail Employees Superannuation Trust (REST) está no início e pode abrir um precedente na jurisprudência global.
Fonte: Valor