O colapso nos preços do minério de ferro para o nível mais baixo em quase dez anos está colocando sob os holofotes as maiores mineradoras do mundo e levando muitos a questionar a estratégia delas de produzir em quantias recorde.
Embora os preços estejam baixos já há algum tempo, os temores de um excesso de minério de ferro em todo o mundo se aprofundaram nos últimos dias, na esteira de indicações de que a produção de aço na China, o maior consumidor mundial da matéria-prima, está desacelerando.
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A queda de preços ocorre em um momento ruim para os grandes produtores, como a Vale S.A. e a anglo-australiana BHP Billiton, que estão calculando os custos ligados ao rompimento, no início deste mês, de barragens da mineradora Samarco - uma joint-venture das duas empresas - na cidade de Mariana, MG. A Vale, a BHP Billiton e a também anglo-australiana Rio Tinto são as maiores produtoras de minério de ferro do mundo.
Na terça-feira, o preço da tonelada de minério de ferro caiu para US$ 43,40, um recuo de 12% só neste mês e bem abaixo do pico de mais de US$ 191 atingido em 2011, segundo a provedora de dados The Steel Index. O preço se manteve inalterado ontem.
A BHP e a Rio Tinto têm atraído críticas de alguns investidores, rivais e legisladores, que as acusam de derrubar os preços ao produzir mais que a demanda do mercado. Em maio, o governo da Austrália considerou abrir um inquérito parlamentar sobre o assunto, mas a proposta acabou sendo descartada.
As duas mineradoras australianas têm afirmado que o minério é comercializado livremente no mercado global e que suas expansões foram planejadas há anos e protegem os interesses dos acionistas.
A estratégia das duas empresas é produzir o máximo de minério possível pelo menor custo, em vez de extrair menos, na esperança de dar impulso aos preços. Graças às economias de escala, elas ainda obtêm uma margem de lucro saudável com cada tonelada, mesmo com a queda de preços.
Ainda assim, os lucros das duas empresas, que dependem fortemente da venda de minério, despencaram. O lucro líquido da BHP caiu 86% este ano até junho.
A saúde financeira da empresa vem sendo monitorada pelo mercado. O presidente do conselho da BHP, Jac Nasser, disse recentemente que este está sendo "um dos anos mais difíceis" nos 130 anos de história da empresa. Diante da queda nos preços das commodities, os acionistas temem que a mineradora não seja capaz de cumprir sua promessa de longa data de manter ou elevar os dividendos a cada ano.
A julgar "pelos preços do mercado à vista, cortes na política progressiva de dividendos da BHP parecem inevitáveis", afirmou o banco australiano Macquarie ontem.
A cotação das ações da BHP na Austrália desabou para o nível mais baixo em quase dez anos nas últimas semanas, após o desastre nas barragens da Samarco em 5 de novembro. Pelo menos 12 pessoas morreram e 11 continuam desaparecidas.
Alguns analistas estimam que os custos da limpeza cheguem a US$ 1 bilhão, embora tanto a BHP quanto a Vale tenham afirmado que a responsabilidade pelas operações da mina recai sobre a Samarco, que é operada de forma independente. A ação da Vale na Bovespa também está no nível mais baixo dos últimos 11 anos. Ela fechou ontem a R$ 11,71, com queda de 2,66%.
Apesar dos cortes de produção feitos por algumas mineradoras que têm custos mais altos, o mercado de minério de ferro provavelmente ainda terá um excesso de oferta de 150 milhões de toneladas em 2018, prevê Andreas Bokkenheuser, analista de mineração do banco suíço UBS.
A produção da BHP subiu 14%, para um recorde de 233 milhões de toneladas, este ano até junho. A Rio Tinto também está produzindo mais. E a Vale está desenvolvendo um projeto no Pará orçado em US$ 14,4 bilhões, que ela afirma ser "o maior projeto da nossa história e da mineração internacional".
Certamente, depois do declínio acentuado, os preços poderão em breve chegar a um piso temporário. "Uma estabilização nos preços do aço na China nos próximos dias poderia ser um sinal de que os preços do minério de ferro estão próximos de um piso", escreveram analistas do banco Australia & New Zealand Banking Group em uma nota a clientes.
Mas um aumento na oferta poderia empurrar os preços abaixo de US$ 40 a tonelada no início do próximo ano, prevê o Citigroup, pressionando ainda mais os lucros das mineradoras à medida que a China produz menos aço.
A produção do país caiu 3,1% em outubro em relação a um ano antes, segundo a Associação Mundial de Aço. A australiana Fortescue Metals Group Ltd., quarta maior exportadora de minério de ferro do mundo, tem corrido para fortalecer suas finanças. Ontem, ela informou que fechou acordo para recomprar US$ 750 milhões em dívidas, uma medida com a qual espera economizar US$ 56 milhões em pagamentos de juros ao ano.
Ao mesmo tempo, empresas menores do setor com custos de produção mais elevados estão sentindo a pressão.
Na terça-feira, o presidente do conselho da BC Iron Ltd., Anthony Kiernan, disse que a pequena mineradora australiana estava se preparando para sair do setor de minério de ferro. Segundo ele, não faz nenhum sentido elaborar uma estratégia atual e futura na esperança de que os preços do minério de ferro se recuperem.
Fonte: Valor Econômico/Rhiannon Hoyle | The Wall Street Journal, de Sidney