A compra da divisão das Américas do conglomerado alemão ThyssenKrupp  pode custar à Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) uma conquista  realizada há muito tempo: a classificação de "investimento não  especulativo" das agências de avaliação de risco.
Hoje com  "investment grade" de duas das três maiores instituições do mundo, a  piora no perfil de crédito que a aquisição causaria ameaça rebaixar a  empresa ao nível de emissores com títulos considerados de alto retorno  ou especulativos.
Analistas das três principais agências informam  que, mais do que levar em conta um número que estoure os limites  impostos pelas próprias instituições para alavancagem ou dívida, vão  considerar os possíveis investimentos e a expectativa de recuperação  operacional das duas usinas envolvidas na transação.
Procurada  pelo Valor, a CSN preferiu não se manifestar. A siderúrgica conquistou a  nota na época em que o Brasil também obteve "investment grade" em seu  rating soberano, em 2006.
Estrategicamente, a operação faz  sentido, principalmente para fortalecer a empresa brasileira frente à  concorrência. No entanto, o atual cenário do mercado de aço faz com que  seu balanço não permita tanto espaço assim para uma aquisição. Se os  elevados custos e a fraca demanda pelo produto, com altos estoques, fez a  situação ser adversa ao redor do mundo, no Brasil ainda há a competição  com importados.
"Eu vejo mais razões para um rebaixamento do  rating do que para uma elevação", diz Joe Bormann, analista do  escritório de Chicago da Fitch. A nota da siderúrgica para a instituição  é de "BBB-", a primeira na faixa de investimento não especulativo.
Para  ele, as medidas do governo, como o aumento das tarifas de importação,  vão ajudar a CSN a ter um melhor ano na área de aço. Mas o minério de  ferro, que vem segurando seu resultado, já começa a dar sinais de perda  de fôlego. No mercado à vista, a recuperação da commodity vista no fim  de 2012 já se inverteu e, frente a novembro, a queda no preço é de mais  de 20%. "Há muito minério no mundo, não vejo como ela pode se recuperar  muito por enquanto, o que vai pressionar o balanço", opina.
Um  ponto positivo da compra da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA),  porção brasileira da Steel Americas, seria seu fornecimento de insumos  para o setor automotivo, diz o analista. A recuperação do setor faz com  que peças sejam mais procuradas, o que ajudaria a impulsionar os números  da siderurgia para a empresa de Benjamin Steinbruch. Mas ainda é  necessário saber quanto a CSN precisaria gastar para recuperar a usina.
Além  disso, a diversificação da empresa pode compensar a piora em algumas  unidades. Barbara Mattos, vice-presidente-assistente da Moody's América  Latina, ressalta a alocação de recursos ao longo de tempo pela CSN como  uma forma de tentar aproveitar as sinergias entre os negócios e se  resguardar em setores com desempenho melhor no momento. Das três  agências, a Moody's é a única que coloca a empresa como investimento  especulativo, com rating "Ba1".
"Em uma possível aquisição,  avaliaríamos qual a participação, se todo o balanço seria incorporado, o  que traria para a empresa, se teria que investir, quais as sinergias.  Não significa exatamente um ponto negativo à nota", comenta Barbara, sem  referir-se especificamente à possibilidade de compra da Steel Americas.  Para ela, também vai depender da capacidade da CSN em manter sua  liquidez, ou seja, habilidade de cobrir o endividamento de curto prazo  com sua geração de caixa.
A brasileira concorre com um consórcio  montado da ArcelorMittal e Nippon Steel & Sumitomo Metal e sofre com  a possibilidade de manchar seus resultados com a aquisição. No primeiro  semestre fiscal de 2012/2013, por exemplo, findo em março, a combinação  de CSA e a laminadora de Calvert, no Estado americano do Alabama,  registrou prejuízo operacional de € 782 milhões.
A Moody's é a única das três agências que deu o grau de investimento especulativo à CSN, com rating "Ba1"
Também  seria afetado seu lucro antes de juros, impostos, depreciação e  amortização (Ebitda, na sigla em inglês), utilizado em métricas de  alavancagem. A relação entre dívida líquida e Ebitda, aliás, já está  alta para a siderúrgica, fechando março em 3,75 vezes, contra 3,47 vezes  em dezembro e 2,36 vezes um ano antes. A Standard & Poor's já  alertou a companhia, em relatório divulgado no mês passado, sobre os  riscos de se manter esse índice em altos níveis. Para a agência, a  avaliação atual de "BBB-" pode ser revista caso a alavancagem supere por  muito tempo o patamar de 4 vezes. A perspectiva já foi colocada em  negativa.
As estimativas de corretoras variam, mas o patamar  mínimo que aparece de alavancagem pós-aquisição é de 4,6 vezes. BES  Securities, a corretora do Banco Espírito Santo, e a Ativa Corretora  apostam nesse número. Já J.P. Morgan e Bank of America Merrill Lynch  (BofA) acreditam em 4,7 vezes.
Entretanto, mesmo com essas  projeções dos analistas, David Salama, diretor de relações com  investidores da companhia, reiterou a meta de 3 vezes na alavancagem até  dezembro, em teleconferência com analistas na qual comentou os  resultados do primeiro trimestre. Além disso, o executivo garantiu que  olhará as oportunidades de aquisição "de maneira conservadora".
Perder  o "investment grade" poderia elevar o custo de captação da siderúrgica  por meio de dívida e complicar ainda mais seus planos de tentar  recuperar a CSA e a laminadora americana. Mas o solavanco na alavancagem  pode ser evitado. A CSN possui atualmente um caixa e disponibilidades  de R$ 14,12 bilhões, o que pode ser incrementado se ela vender sua  participação na Usiminas, segundo Felipe Hirai e Thiago Lofiego,  analistas do BofA. Hoje, a empresa detém 14,7% das ações ordinárias e  20,1% das preferenciais, o que, a valores de mercado de sexta-feira,  representa R$ 1,41 bilhão.
A soma desses recursos seria uma  possibilidade para adquirir os ativos da empresa alemã. Além disso, a  companhia pode evitar a necessidade de tomada de dinheiro emprestado  para recuperar a CSA e a laminadora de Calvert - o Banco Nacional de  Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) poderia garantir uma linha de  crédito para a CSA. O mercado fala em algo próximo a US$ 1 bilhão para,  em cerca de dois anos, deixar a Steel Americas no azul. Isso impediria  que o avanço na dívida líquida da empresa de Steinbruch, hoje em R$ 16,2  bilhões, fosse ainda maior.
Fonte: Valor Econômico/Renato Rostás | De São Paulo
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