Nos velhos galpões da fábrica da General Eletric na cidade de Contagem (MG), os funcionários estão correndo para entregar em média cinco locomotivas por mês. É uma tremenda mudança na rotina de quem está na empresa há algum tempo e passou anos com medo de perder o emprego por falta de serviço. Foram períodos em que a GE simplesmente não conseguia uma encomenda sequer de máquinas novas. O negócio que restava era o de manutenção e reparos leves.
"Chegou a haver uma análise da empresa se não seria melhor encerrar as operações no Brasil", lembra Guilherme Segalla de Mello, presidente e CEO para a América Latina da GE Transportation, o braço do grupo americano dedicado à fabricação e manutenção de locomotivas.
A empresa sobreviveu ao período crítico dos anos 90 de privatização das linhas férreas, decidiu ficar e vive agora o melhor momento em décadas para o setor ferroviário. A GE Transportation completa 50 anos no Brasil. Boa parte desse período, com a produção acanhada e disputando mercado com locomotivas usadas importadas.
No ano passado, a empresa produziu mais de 100 locomotivas para trens de cargas. Foi um recorde de um ano atípico puxado por dois grandes contratos. Este ano, prevê fabricar cerca de 60 unidades, o que continua sendo um patamar bastante elevado para o Brasil e a garantia de emprego para seus 600 funcionários. Durante quatro décadas, a fábrica funcionou em Campinas. Desde 2006, as locomotivas são feitas em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, onde por anos funcionou um centro de manutenção.
Aquecida por novas ferrovias que estão para ser entregues, a indústria ferroviária atraiu recentemente um segundo fornecedor. A Caterpillar começou em maio a fabricar suas primeiras locomotivas no Brasil. A unidade da Progress Rail Services, empresa do grupo, fica também em Minas Gerais, em Sete Lagoas, e já tem 35 encomendas. As primeiras máquinas devem ficar prontas em outubro.
As duas empresas - ambas americanas - são as únicas fabricantes do país de locomotivas para trens de carga. Ambas estão discutindo novos contratos e traçam um cenário muito promissor para seus negócios. Um exemplo raro atualmente no ramo industrial. A GE já exporta para a América do Sul e para países da África. A Progress Rail também planeja exportar para os vizinhos sul-americanos.
Os números da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer) ajudam a traduzir o momento do setor: entre 1990 e 1999, o Brasil produziu 111 locomotivas. Só em 2011 foram 113. Além de locomotivas montadas no país, máquinas importadas abasteceram a demanda nacional. A última vez que se produziu mais de 100 locomotivas no Brasil foi em 1977.
Em 2010, a GE anunciou seu maior investimento no Brasil. Foram US$ 550 milhões para diversos negócios. Para a fábrica em Contagem, a fatia foi de US$ 35 milhões. Cerca de 60% dos recursos já foram investidos na ampliação das instalações. A unidade que antes tinha capacidade de produção de 60 locomotivas anuais fechou o ano passado com capacidade para 120. Produziu quase isso para atender às encomendas da Cosan e da MRS (que recebeu o primeiro e maior lote de uma encomenda celebrada em 2009 de 115 locomotivas, com opção de mais 100 em cinco anos).
"O cenário pelos próximos cinco anos é de que o Brasil compre cerca de 100 locomotivas por ano e não mais os 40 a 60 dos anos anteriores", diz Mello.
Carlos Roso, diretor-geral da Progress Rail, trabalha com um quadro duplamente mais favorável, com base, explica ele, nas estimativas de seus clientes. "O Brasil vai comprar 1.000 locomotivas nos próximos cinco anos e estamos nos preparando para ter 50% desse mercado." A fábrica de Sete Lagoas, diz o executivo, está sendo preparada para produzir 96 locomotivas por ano. São hoje cerca de 70 funcionários, mas até o fim do ano a expectativa é que mais 80 trabalhadores sejam contratados.
O ânimo dos fabricantes se explica: o Brasil tem hoje 29 mil km de ferrovias e, somando os projetos em estudo e os já em construção, terá mais 11 mil km. Transnordestina, Norte-Sul, Ferrovia de Integração Oeste-Leste e a Ferrovia de Integração Centro-Oeste são algumas das novas linhas. Some-se a isso a reativação de alguns trechos; o aumento do movimento de carga por trilhos e modernização dos trens por parte das operadoras de carga que começam a trocar as locomotivas antigas por modelos mais novos e mais econômicos.
Vale, MRS e ALL estão entre alguns dos principais compradores de locomotivas do Brasil. Pagam por unidade, dependendo do modelo, R$ 3 milhões. As compras têm recebido o apoio de uma linha especial de financiamento do BNDES, que como contrapartida exige um percentual mínimo de nacionalização das locomotivas.
Os primeiros trens da Progress Rail sairão da fábrica com mais de 40% de conteúdo nacional. No caso da GE, alguns de seus modelos já têm mais de 60%.
Fonte: Valor
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