A Eneva quer contratar até 1 gigawatt (GW) de novas térmicas no Norte do país, estuda novos projetos de geração e busca novos clientes de gás natural, dentro de sua estratégia de monetizar suas reservas e diversificar receitas. Tudo isso será feito com base em três grandes “hubs” de gás criados pela companhia, de olho na demanda gerada pela transição energética, especialmente aqueles que hoje utilizam óleo combustível.
Na geração de energia, a empresa foca no leilão de reserva de capacidade, em setembro próximo, que contratará 2 GW dos 8 GW termelétricos de implantação compulsória, conforme a Lei da Eletrobras (lei 14.182/2021). Segundo o diretor financeiro da Eneva, Marcelo Habibe, caso atinja a meta no certame, a expansão consolidará a estratégia para monetizar o gás natural das reservas de Azulão (AM), na bacia do Amazonas/Solimões - tornando-se um importante “hub” da empresa na região Norte.
PUBLICIDADE
Azulão começou a se monetizar com a térmica Jaguatirica II (RR), em operação comercial desde abril, contratada em leilão específico do governo para atender Boa Vista, capital do único Estado ainda não conectado ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Como ocorre com Jaguatirica, o transporte do gás natural utilizado no acionamento das novas usinas seria por carretas, de forma comprimida (GNC) ou liquefeita (GNL), como se fosse um gasoduto virtual.
Além de Azulão, a empresa possui o campo de Juruá. Ambos os ativos permitiriam à Eneva uma oferta de 4 milhões de m³ por dia (m³/dia) de gás. Assim, a empresa espera disputar futuramente a demanda que hoje é atendida por usinas a óleo combustível - correspondente a 60% do consumo dos chamados Sistemas Isolados, cujos contratos encerram-se nos próximos anos. “Tudo depende de um cronograma de novos leilões”.
Além de implementar as térmicas, a empresa mira a venda de gás natural para grandes consumidores industriais localizados na região, principalmente na Zona Franca de Manaus, que tenham interesse na substituição do óleo combustível nos respectivos processos produtivos pelo gás, “mais limpo e mais barato”.
Esse novo “hub” de gás vai se juntar ao primeiro da Eneva, na região do Parnaíba (MA), com capacidade de produção de 9 milhões de m³ ao dia, sendo que 8 milhões suprem o Complexo Termelétrico Parnaíba, com seis térmicas. Foi a partir deste “hub” que a Eneva anunciou seu mais novo modelo de negócios, de comercialização de gás para clientes industriais.
A Eneva firmou em maio o primeiro acordo deste modelo, para fornecer GNL a instalações industriais da Suzano em Imperatriz (MA), com vigência de dez anos e início de fornecimento previsto para o primeiro semestre de 2024. Para atender ao contrato, a empresa vai investir R$ 530 milhões. No início deste mês, a companhia firmou outro acordo, com a Vale, para fornecer GNL a instalações industriais localizadas em São Luís (MA), cujo contrato tem vigência de cinco anos e início do fornecimento também previsto para o primeiro semestre de 2024.
Para atender Suzano e Vale, o gás virá da bacia do Parnaíba, que contará com duas unidades de liquefação com capacidade total de 600 mil m³/dia. Os contratos ajudam as empresas nos processos de descarbonização, ao substituir o uso de óleo em caldeiras nos respectivos processos produtivos. “Você barateia o custo do cliente, ajuda a descarbonizar e é um produto nacional”, frisou Habibe.
A Eneva criou mais dois novos “hubs”, também no Nordeste, com a compra das usinas Termofortaleza (que pertencia à Enel) e Porto do Sergipe, da New Fortress Energy com a eBrasil - esta aquisição, porém, ainda não foi concluída, com previsão para ocorrer até outubro. Com as duas usinas, estima o executivo, a perspectiva é de que a companhia dobre a receita com geração a gás natural.
Porto do Sergipe conta com um terminal de GNL com capacidade de 21 milhões de m³/dia. Como a usina consome 6 milhões diariamente, a empresa utiliza o volume ocioso para negociar com consumidores industriais e distribuidoras de gás canalizado, além de utilizar em eventuais novas térmicas, com vantagens competitivas, pois o terminal de GNL já está pago pela termelétrica. Habibe lembra que a região das duas usinas conta com a malha de gasodutos da TAG, logística que abre espaço para a comercialização com as distribuidoras de gás.
No caso da Termofortaleza, a usina está operando desde junho para exportar energia para Argentina, que precisa atender à maior demanda no inverno, especialmente para calefação, aproveitando o bom cenário dos reservatórios das hidrelétricas, ao mesmo tempo que óleo e gás estão caros no mercado externo. Em 2021, como todo o parque térmico nacional, a térmica operou fortemente para suprir o sistema elétrico, sob os efeitos da crise hídrica, o que não deve se repetir neste ano. “Tivemos que reinventar o modelo de negócios para capturar oportunidades interessantes e gerar bom resultado este ano” disse Habibe.
Os planos da Eneva também incluem a expansão da oferta por meio de fontes renováveis, mas o ritmo é um pouco menor. Com a aquisição da Focus Energia, concluída recentemente, a empresa herdou três usinas solares fotovoltaicas que somam potência de quase 4 gigawatts-pico (GWp). Desse montante, até o fim de outubro entra em operação Futura I (BA), solar de 870 megawatts-pico.
Futura II e III, que somam 3 GWp, ficarão à espera de melhora no cenário para saírem do papel. O motivo é que os painéis solares, oriundos da China, ficaram mais caros, bem como o transporte para o Brasil, elevando os custos de investimentos em 50% e refletindo nas taxas de retorno dos projetos, ficando inviáveis. “Estão adormecidos, vamos desenvolver quando os preços estiverem mais adequados”.
Fonte: Valor