A capacidade instalada de produção de siderúrgicas do mundo todo é, hoje, de 1,8 bilhão de toneladas. Este ano, porém, o total de pedidos ao setor não passará de 1,5 bilhão de toneladas. E em vez de se consolidar e ficar mais eficiente, a indústria está reforçando ainda mais a capacidade.
Até 2016, outras cem novas usinas, com capacidade total de produção estimada em 350 milhões de toneladas, devem entrar em operação, segundo executivos e consultores do setor. Empresas no Vietnã, Argentina, Equador, Peru e Bolívia, todos bancadas de uma forma ou outra pelo Estado, estão erguendo ou planejando novas usinas.
Dirigentes desses países dizem que a ideia é investir no desenvolvimento industrial, abastecer a indústria local com aço nacional e reduzir importações. Mas o que para a economia interna pode parecer um salutar desdobramento tem repercussões para o setor mundo afora.
"A toda hora, em todo o mundo, vemos pessoas querendo construir novas instalações", diz Dan DiMicco, diretor-presidente da Nucor Corp., segunda maior siderúrgica dos Estados Unidos, e defensor de uma maior consolidação.
"Podemos até discutir qual deve ser o próximo passo", disse Charles Bradford, analista da Bradford Research Inc., de Nova York. "Mas não resta dúvida: há excesso de capacidade."
Chegar a uma cifra definitiva do total de siderúrgicas no mundo e da capacidade instalada de produção é difícil. Em grande parte, dizem executivos e analistas do setor, porque há centenas de pequenas usinas desconhecidas na China, país que responde por 46% da produção mundial de aço. Segundo estimativas, a China teria de 600 a 800 usinas.
O excesso de oferta vem derrubando o lucro do setor e os preços do aço, o que a última rodada de balancetes deixou patente, e renovando o apelo por consolidação e racionalização entre dirigentes do setor e investidores. A ArcelorMittal - que é a maior siderúrgica do mundo em termos de produção, mas responde por apenas 6% do mercado global - registrou prejuízo de US$ 709 milhões no terceiro trimestre do ano. Seu diretor-presidente, Lakshmi Mittal, acha que o setor é fragmentado demais e que a empresa seguirá focada na consolidação "sempre que a oportunidade certa surgir".
Nessa altura, no entanto, parece haver pouco progresso no setor nesse sentido - e muita oposição política de governos.
Na terça-feira, Mittal se reuniu com o presidente da França, François Hollande, para discutir possíveis saídas para uma alquebrada siderúrgica no leste do país, incluindo uma possível estatização da usina. A empresa quer fechar dois altos-fornos ociosos na usina até 1o de dezembro se, até lá, o governo não achar um comprador para eles. O governo francês disse que seria difícil vendê-los sem a outra usina da ArcelorMittal no local, que a empresa quer manter. Agora, o governo francês cogita nacionalizar temporariamente a usina inteira até achar um comprador.
No começo do ano, o governo da Sérvia decidiu comprar uma usina em dificuldades da U.S. Steel Corp. por US$ 1 para evitar seu fechamento. Agora, está buscando um comprador.
Com os preços das commodities e das ações em baixa, esse é um momento ruim para fusões e aquisições no setor. A ThyssenKrupp AG, por exemplo, até agora não conseguiu vender uma siderúrgica de última geração no Brasil e outra planta de processamento no Estado americano de Alabama - cada uma com capacidade para cinco milhões de toneladas anuais - que a empresa construiu em 2007 por um valor total de US$ 11,8 bilhões.
No futuro próximo, a indústria mundial do aço, que movimenta US$ 1 trilhão ao ano, deve seguir sendo o mais fragmentado dos grandes setores. As cinco maiores siderúrgicas do mundo respondem por apenas 18,2% da oferta mundial de aço. Em comparação, as cinco maiores fabricantes de automóveis do mundo controlam 50,6% do mercado global. As cinco maiores fornecedoras transoceânicas de minério de ferro - ou seja, minério de ferro exportado por via marítima - detêm 66,1% desse mercado.
"O setor do aço precisa de um grande ator para comprar usinas de fraco desempenho e fechá-las", diz Tim Cahill, analista da J&E Davy Holdings Ltd. em Dublin.
Sem isso, diz Cahill, as siderúrgicas não atingem economias de escala necessárias para derrubar custos de transporte e produção, ou musculatura para negociar com fornecedores de matéria-prima e clientes, como fabricantes de veículos e eletrodomésticos.
A cotação do aço laminado a quente em bobinas, que superava a marca dos US$ 1.000 a tonelada antes da crise financeira de 2008, caiu mais de 35% nos EUA, para US$ 636 a tonelada. E isso mesmo com a quarta maior siderúrgica americana, a RG Steel Corp., tendo pedido falência em maio. Com a empresa em concordata, a capacidade de produção caiu em 7,5 milhões de toneladas, ou 9% da produção dos EUA em 2011.
Enquanto isso, muitos governos seguem subsidiando usinas, apesar do arrefecimento da demanda, para preservar empregos e sustentar a economia local.
Thomas Veraszto, vice-presidente da russa OAO Severstal, disse que fechar uma siderúrgica, sobretudo quando a economia vai mal, é difícil.
"É muito fácil abrir uma usina quando tudo vai bem e muito difícil fechá-la quando o momento é ruim", disse ele. Além disso, fusões são particularmente difíceis no mundo do aço. "Para fazer uma fusão, é preciso claramente criar mais valor", disse. "Em geral, não é assim na siderurgia, onde dá para aumentar a capacidade simplesmente com melhorias na operação de ativos existentes."
A natureza fragmentada da indústria siderúrgica se deve, em parte, a seu papel histórico de motor da economia. "Não há país que tenha se industrializado sem desenvolver a indústria siderúrgica nacional", disse David Hounshell, professor de história industrial da Universidade Carnegie Mellon, nos EUA. Cada região tinha sua própria usina para abastecer a indústria local. Uma vez erguida, a siderúrgica virava fonte de empregos, protegidos por sua vez com tarifas e subsídios. "O resultado final é sempre um grande excesso de capacidade", disse Hounshell.
Sem consolidação, grandes siderúrgicas dizem que terão de apostar em outras saídas para seguir saudáveis. Isso inclui criar produtos melhores - com margens maiores, mais tecnológicos, mais leves - para o setor automotivo, além de cortar custos e vender mais para mercados emergentes.
John Surma, diretor-presidente da U.S. Steel, disse há pouco que seu foco eram "coisas que podemos fazer dentro da empresa".
Fonte: Valor Econômico/ John W. Miller | The Wall Street Journal
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