Engenharia, logística – com destaque em portos – e saneamento são as três principais áreas de investimentos chineses no Brasil na área de infraestrutura, fora os segmentos de energia elétrica e óleo e gás. A principal presença de empresa chinesa em infraestrutura no Brasil é a gigante China Communications Construction Company (CCCC), que em 2016 adquiriu por R$ 350 milhões o controle da Concremat.
A aquisição permitiu ao conglomerado chinês, com negócios em infraestrutura, equipamentos pesados e serviços de dragagem, fincar uma posição relevante no mercado de engenharia e construção, que desde a Operação Lava-Jato em 2014 tem mudado de configuração. Endividadas e envolvidas no escândalo, as grandes construtoras brasileiras perderam participação, reduzindo a barreira natural de ingresso de grupos estrangeiros no setor. A participação estratégica poderá impulsionar o avanço chinês em máquinas, projetos e engenharia, três segmentos que historicamente sempre foram ligados a empresas brasileiras, europeias e americanas.
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Com o ingresso na Concremat, a CCCC tem buscado também novos negócios no Brasil. Um dos principais foi a conquista da Parceria Público-Privada (PPP) para a construção da ponte entre Salvador e Ilha de Itaparica no Estado da Bahia. O consórcio formado pelos grupos chineses CCCC e CR20 (China Railway 20 Bureau Group) foi o vencedor do leilão, realizado em 2019, na sede da B3, para construção e operação do projeto, cujo valor total do contrato é de R$ 7,6 bilhões. O prazo de concessão é de 35 anos.
O empreendimento terá 12,4 quilômetros de extensão e se constituirá na maior ponte deste tipo da América Latina, superando a ponte Rio-Niterói. A estrutura ocupará a 23ª posição no ranking mundial de pontes. O contrato inclui ainda acessos viários em Salvador, com extensão de 4,6 quilômetros, nova rodovia expressa, a ser construída na Ilha de Itaparica, com 21,41 quilômetros, e recuperação e ampliação de trecho da rodovia BA-001. A Concremat será a líder do consórcio responsável pelas obras.
O projeto faz parte de um plano de desenvolvimento socioeconômico da Bahia, que estima a criação de cem mil postos de trabalho diretos e indiretos ao longo dos 35 anos de PPP. Cerca de 250 municípios serão beneficiados com a redução da distância em mais de 100 quilômetros e de 90 minutos no tempo de deslocamento até a capital baiana. Atualmente, a travessia para Itaparica é feita por ferryboat, no Terminal de São Joaquim, em Salvador, e por lanchas rápidas. Outra opção é usar a BR-324, sentido Recôncavo Baiano. Em abril, o governo da Bahia depositou R$ 250 milhões no Fundo Garantidor para a construção da ponte como parte do compromisso firmado no contrato, que prevê a implementação, nos próximos cinco anos, da PPP, que contemplará investimento de R$ 5,4 bilhões e aporte total do Estado de R$ 1,5 bilhão. “O projeto vai trazer forte impulso à economia de todo o Estado, encurtando distâncias e criando um novo eixo de desenvolvimento a partir de Salvador em direção ao oeste”, afirma o governador Rui Costa.
A CCCC também está em outro projeto de grande porte no setor de transportes: o porto São Luís, no Maranhão, projeto lançado em 2018, ainda no papel e cujo controle é da empresa chinesa. Quando totalmente implantado, o porto terá capacidade para movimentar até 20 milhões de toneladas por ano, mas a construção será em fases. Na primeira etapa, que deve estar pronta em quatro anos, haverá oferta para 15 milhões de toneladas. O terminal deverá estar ligado à ferrovia de Carajás e ao tramo superior da Ferrovia Norte-Sul.
Não é um investimento isolado chinês em terminais portuários no Brasil. Em 2018, a China Merchants Port Holding Company (CMPort), o maior e mais competitivo desenvolvedor, investidor e operador de portos públicos da China, adquiriu o controle do maior terminal de contêineres da América do Sul: o Terminal de Contêineres de Paranaguá (TCP). Nos primeiros seis meses deste ano, foram transportados 5,6 milhões de toneladas em contêineres pelo porto de Paranaguá nos dois sentidos de comércio – importação e exportação.
O volume é cerca de 12% maior que os cinco milhões de toneladas registrados no mesmo período de 2020. De exportação foram 2,97 milhões de toneladas de cargas embarcadas. De importação, 2,59 milhões de toneladas. O frango é o produto mais exportado em contêineres pelo terminal paranaense. De janeiro a junho, 875,87 mil toneladas saíram do porto de Paranaguá rumo ao mercado internacional. A China segue como o principal destino do frango exportado pelo TCP.
Em saneamento, os chineses também marcam presença. A PPP criada para construir e operar o sistema São Lourenço, para a prestação de serviços de operação e manutenção do sistema de desidratação, secagem e disposição final do lodo e de manutenção do sistema na região metropolitana de São Paulo, foi assumida em 2018 pela China Gezhouba Group Corporation (CGGC), através de sua subsidiária CGGC Construtora do Brasil, representando o primeiro investimento no Brasil. O sistema leva água da represa Cachoeira do França, em Ibiúna (SP), para a Estação de Tratamento de Água, em Vargem Grande Paulista (SP), percorrendo 83 quilômetros de tubulação até os municípios atendidos.
O grupo chinês chegou a analisar o leilão de concessão da Cedae, concessionária que atua no Rio de Janeiro, mas não participou do leilão em abril deste ano. O setor de saneamento completa em agosto um ano com a nova regulação, que busca atrair capital privado para a universalização dos serviços de água e esgoto.
Estudo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon) aponta que o investimento total estimado para expansão da rede com o novo marco regulatório é de R$ 753 bilhões, sendo R$ 255 bilhões referentes à recuperação da depreciação das redes existentes. O trabalho da Abcon destaca que a cada 1 real investido em saneamento para extensão de redes, cerca de 76 centavos irão para a construção civil e 6 centavos para máquinas e equipamentos.
O secretário nacional de saneamento do Ministério do Desenvolvimento Regional, Pedro Maranhão, diz que o novo marco regulatório, sancionado pela Lei 14.026 de julho de 2020, já é uma realidade. “Há leis que pegam e não pegam no Brasil. Esta pegou. Desde o marco, já foram mais de R$ 69 bilhões em investimentos e outorgas”, afirma. Com o novo marco regulatório, os contratos serão obrigados a trazer metas de universalização. Cada projeto aprovado terá de levar água potável a 99% da população e garantir tratamento de esgoto para outros 90% até o fim de 2033.
Além de participar de concessão, PPPs e operação, em saneamento deverão ser criadas oportunidades em fornecimento de máquinas e equipamentos. Estudo preliminar do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com base em cinco projetos de concessão e PPP estruturados pelo banco e realizados nos últimos meses, aponta que apenas a demanda desses empreendimentos soma R$ 38 bilhões em investimentos, representando R$ 11 bilhões em encomendas para a indústria. Os projetos que embasaram o estudo são a concessão do Amapá, concessão dos três blocos da Cedae no Rio de Janeiro, a PPP de Cariacica (ES), concessão da região metropolitana de Alagoas e concessão na cidade de Porto Alegre (RS).
Fonte: Valor