Maior produtor de soja do País, Mato Grosso está vendendo menos grão e mais produto agregado, na forma de farelo, óleo ou carne, uma mudança significativa no modelo produtivo local. Colheitas cada vez maiores, a estrutura tributária do País e o crescimento da produção de proteínas têm contribuído para aumentar a capacidade de esmagamento mato-grossense. Dados da Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), compilados a partir de números da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), mostram que até setembro Mato Grosso exportou 38% da soja produzida no Estado. Ao final do ano, essa fatia deve ficar em torno de 40%. "É o menor porcentual desde 2005", afirma Rodrigo Feix, economista da entidade.
Em todo o ano de 2010, as exportações atingiram 46% da produção, ao passo que, em 2009, 59% da safra de soja mato-grossense saiu do Estado na forma de grão. Enquanto isso, a produção local da oleaginosa aumentou 18% no período, de 17,4 milhões de t em 2008/09 para 20,566 milhões de t em 2010/11. Esse decréscimo na exportação de soja em grão tem acompanhado o aumento da capacidade de processamento local, que passou de 24,8 mil t/dia em 2008, para 29,3 mil t/dia em 2009 e a 36,6 mil t/dia em 2010. Com 13 esmagadoras, a mais recente instalada no ano passado, Mato Grosso superou o Paraná em capacidade em 2010. A capacidade da indústria paranaense era de 35,65 mil t/dia.
Feix explica que, por causa do regime tributário brasileiro, a indústria está praticamente impedida de comprar soja em um Estado e esmagar em outro. "A soja em grão 'anda' muito pouco pelo País", afirma. Quando a indústria compra o grão, processa no mesmo Estado e exporta farelo ou óleo, fica isenta da cobrança de ICMS. Mas quando compra grão em um Estado e processa em outro gera um crédito de ICMS, cujo ressarcimento é muito demorado, o que, na prática, inviabiliza a operação. "Em função do sistema tributário, as empresas são levadas a investir próximo à originação do produto. Os Estados que mais crescem em soja recebem mais investimento", diz.
Região atrai investimento
De acordo com levantamento feito pela Agência Estado junto a participantes do mercado, de seis projetos de reativações ou instalações de esmagadoras planejadas para os próximos anos, quatro são em Mato Grosso (Bunge, Noble, Agrenco e Grupal), um em Tocantins (Granol) e outro em Mato Grosso do Sul (Cargill). No Paraná, tradicional produtor da oleaginosa, o esmagamento tem crescido menos porque, conforme participantes do mercado, a capacidade instalada já atende grande parte da necessidade. O Estado tem um atrativo para a instalação de novas esmagadoras, que é o porto de Paranaguá, por onde sai a maior parte da oleaginosa exportada pelo País, mas os investimentos esbarram, novamente, no sistema tributário.
Em Mato Grosso, se parte do farelo derivado do esmagamento da soja vai para exportação, outra parte tem ficado no Estado para a produção de ração. Embora não existam números a respeito do consumo de farelo pela indústria local, a elevação da produção de carnes de frango e suína subentende um aumento de consumo.
Mato Grosso ainda está distante da produção de carnes do Sul do País, mas suas taxas de crescimento têm sido expressivas. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção de frango cresceu 21% no primeiro semestre de 2011 na comparação com o mesmo período em 2010 e 41% ante 2009. No caso da carne suína, o crescimento no primeiro semestre de 2011 sobre 2010 foi de 9%. Na comparação de 2011 com 2009, o aumento foi de 62%.
O farelo, junto com o milho, forma a base da alimentação de aves e suínos. Juntos, chegam a representar quase 70% do custo de produção desses rebanhos. Para César de Castro Alves, analista da MBAgro, o processamento de carnes deve continuar a aumentar em regiões como Mato Grosso e Goiás por causa da oferta barata de farelo e milho. "O abate no Sul não vai diminuir, mas o Centro-Oeste tem ganhado competitividade sobre regiões como São Paulo", afirma. De acordo com Alves, mesmo com os problemas logísticos de Mato Grosso, produzir carne ali ainda é viável. "Como soja e milho têm os preços muito mais baixos que no Sul, o custo total da carne processada e colocada no porto compensa a desvantagem logística", afirma sem, contudo, revelar números. "As maiores taxas de crescimento de produção de aves e suínos estão no Centro-Oeste."
Tomando como base os preços sinalizados na sexta-feira pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), o preço da saca de 60 quilos de milho no norte do Paraná era de R$ 24,90, ante R$ 18,36/saca em Sorriso (MT), uma diferença de 35,6%. O preço do farelo de soja em Ponta Grossa (PR) era de R$ 644,78 por tonelada, ante R$ 550/t em Lucas do Rio Verde (MT), ou 17% mais.
Castro Alves ressalta ainda que há uma tendência de aumento nos confinamentos e semiconfinamentos de gado por causa da perda de pastagens, o que tem se agravado nos últimos anos em Mato Grosso. "Essa prática de reforçar a alimentação do rebanho com grãos e farelos deve ganhar espaço entre os pecuaristas locais", afirma.
China
Embora exista forte potencial de agregação de valor à soja do Centro-Oeste, Rodrigo Feix, da Abiove, lembra que o principal cliente da soja em grão brasileira é a China e isso pode limitar a expansão do processamento não só no Estado como no País. "A China tem política muito clara de importação da matéria-prima e a exportação da soja em grão tende a acompanhar esse mercado", afirma.
Ele pondera que uma perspectiva positiva é a abertura do mercado chinês de carne suína. Plantas brasileiras habilitadas podem começar a exportar a partir de janeiro. "Se essa exportação se desenvolver satisfatoriamente haverá uma nova demanda de farelo e milho no mercado interno", diz.
Mas Castro Alves, da MBAgro, avalia que o mercado chinês para carnes deve demorar a ser desenvolvido. "É muito difícil dizer quando isso vai virar volume. Mas a bola está na marca do pênalti", diz. Com a demanda chinesa crescendo rápido, diz, o Brasil pode se beneficiar desse canal, mas não já.
Fonte: Agência Estado/Diario do Grande ABC
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