A Petrobras surpreendeu positivamente o mercado ontem com um plano de negócios para o quinquênio 2015-2019 considerado mais realista que os anteriores. A estatal cortou 37% dos investimentos na comparação com o plano passado, reduzindo esse montante de US$ 206,8 bilhões para US$ 130,3 bilhões. O segmento de Exploração e Produção (E&P) concentrará 83% dos investimentos previstos, num total de US$ 108,6 bilhões.
A surpresa, bem recebida, veio com a meta de obter US$ 42,6 bilhões com venda de ativos adicionais aos US$ 15 bilhões (eram US$ 13 bilhões antes) previstos até 2016. O plano atende aos analistas que enxergavam a impossibilidade de a companhia manter um ritmo muito acelerado de investimentos, ancorada em novas dívidas. Temerária, a estratégia era incompatível com a geração de caixa; e com os atrasos no cumprimentos das metas de produção.
No plano, pela primeira vez, a estatal admitiu que a desalavancagem vai demorar - mas ao menos isso foi reconhecido formalmente e novos parâmetros foram divulgados. A meta agora é reduzir a alavancagem líquida (medida pela dívida líquida/dívida mais patrimônio líquido) inferior a 40% até 2018 e a 35% até 2020. Já a alavancagem medida pela dívida líquida/Ebitda terá que ser inferior a 3 vezes até 2018 e 2,5 vezes até 2020. É importante lembrar que, após a capitalização, em 2010, a estatal traçou meta de 35% e 2,5 vezes - mas nunca cumpriu e, em abril, a alavancagem era de 4,7 vezes.
O novo plano trouxe uma admissão de que não será possível cumprir a projeção de chegar a 2020 produzindo 4,2 milhões de barris de petróleo e agora a previsão é de que esse volume seja de 2,8 milhões de barris. Quando incluída a produção de gás, a meta chega a 3,7 milhões de barris equivalentes, ante os 5,3 milhões previstos anteriormente, 50% disso no pré-sal. A estatal atribuiu a redução da sua meta no médio prazo à limitação de fornecimento no Brasil, como já era previsto, uma vez que os fornecedores, principalmente estaleiros, estão sob investigação da operação Lava-Jato, da Polícia Federal (PF).
Entre as premissas do plano está a paridade de preços internacionais com os derivados no Brasil, uma demanda antiga do mercado.
Uma fonte qualificada ouvida pelo Valor afirmou que a reunião de 11 horas do conselho de administração da estatal na sexta-feira inaugura uma nova fase do conselho, que agora não vai apenas "homologar" os planos levados pela diretoria executiva, mas "debater" o que é proposto. Agora, o desafio será entregar o que foi prometido. E a promessa embutida no plano de US$ 130,3 bilhões é que o corte de US$ 76,5 bilhões será ancorado por um grande foco na disciplina de capital, no aumento da eficiência operacional e no aumento da rentabilidade dos projetos.
"É preciso criar valor para o acionista, focar na rentabilidade. O problema adicional da Petrobras é a alavancagem da empresa, hoje excessiva. Mas o que foi demonstrado é que em dois biênios a companhia vai desinvestir US$ 57,7 bilhões. O mercado não esperava isso e é muito claro sobre a alocação de capital e de como isso é importante", disse a fonte.
Para a fonte, o compromisso da Petrobras passa a ser entregar o que prometeu. O ponto positivo, na avaliação dessa fonte, é que não existe nenhuma meta considerada inatingível. "O viés é de viabilidade. Não há nenhuma meta mirabolante. Agora é preciso trabalhar para entregar o resultado", ressaltou a fonte.
O plano admite que não será possível cumprir a projeção de chegar a 2020 produzindo 4,2 milhões de barris
Mas a aprovação do plano não foi unânime na reunião do conselho de sexta-feira. Deyvid Bacelar, representante dos funcionários no colegiado, foi o único a votar contra a aprovação do documento. "Sabíamos que ia diminuir [a previsão de investimento]. Mas foi um absurdo. O efeito desse corte na geração de renda do país será avassalador. É um freio de mão", disse Bacelar.
Para Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), o corte de 37% na previsão de investimentos da Petrobras para o período 2015-2019 mostra que o conselho de administração da companhia está com autonomia para tomar as medidas que julgar serem necessárias para solucionar o problema de caixa da empresa.
"Um corte dessa grandeza mostra que a direção da Petrobras está ciente do problema financeiro e com mandato para fazer o que precisa. O corte não é bom, mas é realista", afirmou. Segundo Pires, o corte de 37% não resolverá o problema de caixa da empresa, mas "estanca o sangramento". "A solução mesmo para o caixa passa pelo aumento do preço dos combustíveis e de desinvestimentos", frisou.
Em relatório, o BTG Pactual afirmou que o principal desafio à frente é a execução desse plano, especialmente no que se refere à política de preços de combustíveis. O BTG destacou ainda que a gasolina está sendo vendida com um desconto em relação aos preços internacionais já há um mês.
O Valor apurou que a Petrobras terá que discutir com o conselho de administração cada passo do processo de venda dos ativos e que os conselheiros vão analisar o preço dos combustíveis na próxima reunião, dia 24 de julho. Segundo o CBIE, a defasagem entre o preço das refinarias nacionais e o internacional da gasolina estava em 8,7% negativo no dia 22 de junho, enquanto o preço do diesel nas refinarias nacionais estava 13,3% acima do preço no Golfo do México.
Ontem, as ações da companhia tiveram forte volatilidade. As preferenciais fecharam em queda de 3,48%, cotadas a R$ 12,75, mas chegaram a subir 2,87% ao longo do dia e a recuar 4,46% na mínima. Já as ordinárias chegaram a subir 2,73% e a recuar 4,78%, mas fecharam em queda de 4,09%, cotadas a R$ 14,05.
Fonte: Valor Econômico/Por Cláudia Schüffner, Rodrigo Polito, André Ramalho, Alessandra Saraiva e Camila Maia | Do Rio e de São Paulo
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