A Oceanpact, que atua em serviços marítimos, chegou à bolsa em fevereiro e, de lá para cá, vê suas ações acumularem queda de 30%. A desvalorização veio após a divulgação do primeiro resultado como companhia aberta. De acordo com fontes, uma queda de 32% no Ebitda ajustado no quarto trimestre de 2020 em relação a igual intervalo de 2019 não havia sido sinalizada nas conversas do processo do IPO (oferta pública inicial de ações, na sigla em inglês). No primeiro trimestre do ano, o Ebitda continuou em queda na comparação anual e cresceu em relação ao trimestre anterior
“Estamos no início de uma caminhada, de vários aprendizados. Um deles é aprimorar a comunicação com os investidores. O processo do IPO é muito rígido em relação à divulgação de informações. Talvez tenhamos começado a relação com o mercado silenciosos demais”, afirma Flavio Andrade, criador e CEO da Oceanpact.
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O executivo acrescenta que o mercado não é familiarizado com o segmento, mas entende que é tarefa da companhia se explicar melhor. “Nós trabalhamos para outras empresas. Não temos milhares de clientes, mas algumas dezenas, com contratos muito grandes. Um atraso num contrato específico, por exemplo, pode gerar impacto num trimestre, mas que vai ser recuperada no intervalo seguinte”, diz. Outro tipo de informação que tende a ser mais compartilhada refere-se ao período de docagem das embarcações.
Andrade diz que a Oceanpact procura o equilíbrio entre o que consegue explicar e antecipar ao investidor sem que a atrapalhe comercialmente. “Estamos num mercado competitivo”, afirma. Na última divulgação de resultados, ele se comprometeu a dedicar uma manhã por mês para conversas com os acionistas.
A Oceanpact surgiu em 2007 como uma consultoria, que desenhava planos emergenciais para combate ao derramamento de óleo no mar. O objetivo era trazer soluções inovadoras e mais baratas e eficientes aos clientes: petrolíferas, portos e terminais. Pouco mais de um ano depois, relata, financiada por clientes e fornecedores, comprou equipamentos e passou a implementar os planos. Na época os clientes eram, na maioria, empresas estrangeiras, com blocos de exploração recém-adquiridos nos leilões da ANP.
Como os leilões pararam de ter regularidade, em 2013 a empresa entendeu que precisava trabalhar mais para a Petrobras que, na época, só contratava embarcações novas, construídas no Brasil. Então, contratou financiamento do fundo de Marinha Mercante, via BNDES, e atraiu novo acionista, a gestora de recursos Dynamo. “Naquele momento, o setor estava muito aquecido e conversamos com alguns investidores. Fechamos com a Dynamo, pois se apresentou como investidor de longo prazo, sem data para deixar o investimento”, diz Andrade.
A partir de então, o relacionamento se solidificou e hoje, a estatal responde por 60% do faturamento, o que Andrade considera como positivo pois traz a empresa contratos de longo prazo para seus investimentos. “Enxergamos movimentação de multinacionais voltando a ter uma participação relevante, mas ainda não na velocidade imaginada”, diz Andrade. O setor de óleo e gás responde por 85% das receitas, mas a Oceanpact também atende mineradoras — fechou novo contrato com a Vale recentemente — e empresas de telecomunicações, quando instalam cabos submarinos.
É esse último segmento, mais rentável, que a Ocenpact pretende expandir daqui para a frente e que motivou o IPO. Desde 2013, ela atua com dados oceanográficos, para serviços de monitoramento ambiental no mar, que abriram outras oportunidades além de planos emergenciais para derramamento de óleo. A geociência usa equipamentos submarinos que coletam dados em alta resolução.
Hoje, a empresa tem embarcações que dão suporte a robôs que fazem os serviços propriamente ditos no fundo do mar, como instalação de equipamentos. E, partir dos próximos contratos, ela vai passar a operar também os robôs, que hoje estão a cargo de parceiros. “Isso nos dará ganho de eficiência e poderemos entrar mais pesado no serviço submarino. Teremos mais margem”, diz Andrade. Hoje, se num dia o robô tem um problema, apesar de a embarcação estar funcionando normalmente, o cliente não paga a diária, porque o trabalho não foi feito. A mesma lógica vale para um dia em que a embarcação não pode sair, apesar de o robô estar em perfeitas condições.
A empresa também atua no apoio logístico a embarcações.
A pandemia gerou custo extra de R$ 17 milhões em 2020 por conta da quarentena e testes necessários para a tripulação antes do embarque. Também gerou atrasos na manutenção de navios, que depende de peças importadas. O quadro, neste ano, segue o mesmo, diz Andrade.
No IPO, a empresa captou R$ 800 milhões para o caixa e R$ 276 milhões foram para o bolso dos vendedores: a Dynamo saiu de uma participação de 25% para 14% das ações, e segue no conselho. Andrade passou de 56% para 27,7%.
O Bradesco BBI, em relatório, classificou a venda recente de ações como exagerada. Mas as ações ainda sofrem com alguma desconfiança ou falta de compreensão do negócio pelo mercado.
O plano original da Oceanpact era crescer mais um pouco antes do IPO e fazer o IPO mais para a frente, em 2022 ou 2023. No ano passado, buscando recursos para se aprofundar na atividade submarina, a empresa emitiu uma debênture e, no meio desse processo, os bancos mostraram que a janela para as ofertas de ações também estava aberta. Desde 2012, a empresa já tinha balanços auditados anualmente, e teve de preparar as informações trimestrais.
Andrade, formado em engenharia naval e um estudioso do mar, diz que sempre olha as cotações da empresa. “É uma vida nova e eu acompanho. E me dá um gás pra saber que temos que melhorar a comunicação, pois na operação sempre fizemos o melhor possível”, diz o executivo.
Fonte: Valor