A rápida disseminação da variante ômicron da covid-19 pelo mundo coloca em dúvida as perspectivas para os mercados de petróleo, depois que uma rápida recuperação da demanda empurrou os preços para os níveis mais altos em anos.
Os preços do petróleo aumentaram em grande parte de 2021. A demanda cresceu com a aceleração das economias, enquanto produtores do Oriente Médio e outras partes do mundo deixaram de extrair milhões de barris por dia. Os preços do petróleo do tipo Brent, referência mundial, aumentaram 53% para acima de US$ 79 o barril.
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A alta proporcionou ganhos substanciais para empresas como ExxonMobil e Chevron, fazendo do setor de energia o de melhor desempenho entre as ações do índice S&P 500 neste ano até 23 de dezembro. Mineradoras como Glencore e Freeport-McMoran também desfrutaram do aumento dos preços de commodities como o carvão e o cobre.
Os motoristas estão sentindo o aperto. Os preços médios da gasolina comum nos EUA aumentaram para cerca de US$ 3,29 o galão (equivalente a 3,78 litros), em comparação a US$ 2,25 um ano atrás, segundo a American Automobile Association (AAA), embora sejam menores que o registrado antes do surgimento da variante ômicron (US$ 3,40). A energia contribuiu para o maior aumento do índice de preços ao consumidor em décadas neste quarto trimestre, levando o presidente Joe Biden a liberar petróleo das reservas estratégicas americanas.
Os preços do petróleo atingiram os maiores níveis desde 2014, antes que os governos restringissem as viagens no fim de novembro para conter a propagação da ômicron. Desde então, os preços se estabilizaram levando os “traders” a enfrentar duas questões: será que a ômicron frustrará a trajetória de alta do petróleo? Ou a demanda retomará seu avanço, talvez testando a capacidade do mundo de produzir petróleo?
“Descobrimos que a demanda pode voltar com força total”, diz Francisco Blanch, diretor de análises de commodities e derivativos do Bank of America. Ele acredita que os preços do Brent poderão chegar a US$ 120 o barril em 2022, se não houver um salto nas hospitalizações por covid-19 ou um grande surto na China.
O mundo ainda usa menos petróleo do que antes da covid, consumindo cerca de 96,2 milhões de barris por dia neste ano, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE). Mas a demanda voltou mais rápido que a produção e Blanch acredita que a demanda atingirá os níveis pré-pandemia, de mais de 100 milhões de barris/dia, no terceiro trimestre de 2022.
O caminho de longo prazo da demanda — e produção — de combustíveis fósseis é outra incógnita. Em novembro os líderes mundiais chegaram a um acordo que visa acelerar a redução das emissões. As previsões a AIE sobre a demanda por petróleo nas próximas três décadas dependem de até que ponto os governos cumprirão seus compromissos climáticos.
Traders de energia e analistas afirmam que a ômicron não causará o tipo de choque aos preços do petróleo desencadeado pelas primeiras paralisações forçadas pela pandemia, quando os preços do petróleo nos EUA chegaram a ficara negativos por um curto período de tempo. Um dos motivos é que a demanda por petróleo da indústria petroquímica está compensando a queda no consumo de combustíveis para aviões. Dando outro impulso à demanda por petróleo, um aumento dos preços do gás natural na Europa e Ásia tem levado as empresas a queimar óleo para gerar eletricidade.
Recentemente, investidores venderam petróleo para realizar lucros, derrubando os preços abaixo do justificado pelo provável efeito da ômicron sobre a demanda, segundo disse Rebecca Babin, trader sênior de energia da CIBC Private Wealth U.S. “Tivemos um ano incrível no setor de energia.”
Quedas na demanda podem ajudar a formar uma reserva de oferta. Cortes pela Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP) e a Rússia drenaram os estoques de países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), um grupo formado principalmente por países ricos, abaixo da média de cinco anos. Há dúvidas sobre a capacidade do cartel de desfazer essas restrições após uma queda nos gastos com produção durante a pandemia.
“Há países que simplesmente não têm capacidade ociosa”, diz Amrita Sen, sócia fundador da consultoria Energy Aspects. Enquanto isso, acrescenta ela, as chances de um acordo nuclear reformulado que derrube as sanções às exportações de petróleo pelo Irã parecem estar diminuindo.
Um país que está lutando para bombear petróleo é a Nigéria, maior fornecedora da África, cuja produção é importante no equilíbrio dos mercados internacionais. Ela produziu 1,29 milhão de barris por dia em novembro, 360 mil barris a menos que sua cota na OPEP, segundo a AIE. A agência disse que problemas operacionais, sabotagem e vazamentos em oleodutos poderão dificultar a recuperação da produção da Nigéria.
Mas a atividade de perfuração nos EUA vem aumentando. Na liderança estão os produtores privados que conquistaram participação de mercado de concorrentes de capital aberto que estão sob pressão de investidores para entregar dividendos, em vez de esbanjar dinheiro em poços. Isso, juntamente com o aumento da produção em países como Canadá e Brasil, deverá saciar a demanda por petróleo, segundo Edward Morse, diretor de análises de commodities do Citigroup.
Alguns bancos preveem outro aumento nos preços do petróleo nos próximos anos, provocado pelos investimentos insuficientes em combustíveis fósseis. Mas Morse do Citigroup está cético. Ele afirma que a maior adoção dos veículos elétricos, entre outros fatores, limitará o crescimento da demanda a partir de 2023 ou 2024.
Fonte: Valor