Ao ter o rating cortado pela Standard & Poor's (S&P), a Petrobras, que recebeu o grau de investimento há 10 anos, foi rebaixada a um rating inferior ao soberano por duas das três principais agências de ratings internacionais.
A S&P cortou ontem à noite a nota de crédito da petroleira em dois degraus abaixo do grau de investimento, para "BB", seguindo o exemplo da Moody's, que rebaixou a companhia para "Ba2" em fevereiro deste ano.
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Quando a Petrobras foi elevada a grau de investimento pela Moody's em outubro de 2005 - dois anos e meio antes do Brasil -, o então diretor financeiro Almir Barbassa disse que o selo de bom pagador ajudaria a reduzir o custo de dívida da companhia entre 0,50 ponto e 1 ponto percentual.
Apenas num exercício, a reversão dessa situação - com aumento dos juros cobrados em todos os seus empréstimos na mesma proporção na hora da rolagem -, elevaria a despesa anual da estatal com o serviço de sua dívida entre R$ 1,5 bilhão e R$ 3 bilhões.
A má notícia se soma a um cenário já bastante negativo para a empresa, que é alvo de investigações sobre corrupção, tem endividamento próximo de 5 vezes sua geração potencial de caixa e grande exposição ao dólar, que não para de se valorizar.
Na bolsa, as ações da Petrobras reagiram ontem com queda antes mesmo que o rebaixamento pela S&P fosse confirmado, embora já fosse uma expectativa. As ações preferenciais recuaram 5,01% e as ordinárias, 3,82%. Nos Estados Unidos, os papéis mais líquidos da estatal, que são os que tem direito a voto, caíram 6,80%.
Em relatório enviado a clientes, o Bank of America Merrill Lynch estimou que uma alta para 400 pontos base do risco país, ante patamar atual de 330 pontos base, deve reduzir o "valor justo" da Petrobras em 24%. A casa disse ainda que a maior depreciação do real, para além das estimativas atuais de R$ 3,80 para 2015 e R$ 4,10 para 2016, torna ainda mais necessário um aumento nos preços dos combustíveis para o equilíbrio das contas da estatal.
"O possível custo mais elevado de financiamento decorrente da perda do grau de investimento pode prejudicar os resultados da companhia e seu fluxo de caixa, apesar de acreditarmos que o funding continuará disponível", afirmam os analistas Frank McGann e Vicente Falanga Neto, do BofA, no relatório.
Apesar da avaliação, o BofA manteve a recomendação de compra das ações da Petrobras, com preço-alvo de R$ 14,40 para ordinárias e de R$ 15,70 para as preferenciais.
A equipe do HSBC também considera a Petrobras a mais afetada pela decisão da S&P, por conta da expressiva alavancagem da companhia. A dívida líquida da companhia em junho estava em R$ 324 bilhões.
A análise de sensibilidade do banco indica que um aumento de 50 pontos base no custo de dívida da petroleira diminui o valor da ação (valuation) em R$ 0,90, ou 10,4% do valor atual por ativo. Um aumento de 200 pontos base resultaria em uma mudança de R$ 3,40 por ação, ou queda de 36% no preço atual.
"Acreditamos que o mercado de 'high yield' [alto rendimento e também alto risco] possa ser pequeno demais para absorver as necessidades da Petrobras", firmam os analistas Luiz Carvalho e Filipe Gouveia em relatório do HSBC.
Traduzindo, os analistas entendem que as centenas de bilhões que a estatal vai precisar tomar de dívida talvez seja mais do que os investidores institucionais estrangeiros poderão alocar na compra de títulos de dívida de empresas sem grau de investimento, dada a existência de limites para aplicação nos papéis.
O Brasil Plural lembrou que os bônus da Petrobras já eram negociados abaixo dos níveis de companhias com grau de investimento, mesmo antes de a companhia perder o selo pela segunda agência. No entanto, segundo o banco, um impacto negativo ainda maior pode ser sentido com a pressão do câmbio, o acesso mais difícil à dívida externa e o risco dos credores atuais de anteciparem o vencimento da dívida.
A necessidade de capital da Petrobras para o período de 2016 a 2017 é de cerca de US$ 18 bilhões, e o Brasil Plural espera que uma piora no rating corporativo aumente ainda mais os custos ou torne mais difícil a captação. Venda de ativos, aumento dos preços de gasolina e diesel e uma capitalização são caminhos apontados para a Petrobras por essa instituição.
O HSBC tem recomendação neutra para as ações da estatal e preço-alvo de R$ 9 para as preferenciais. A Brasil Plural também está neutro, com preço-alvo de R$ 13 para ordinárias.
Outro ponto destacado pelos especialistas é que o corte da nota joga ainda mais pressão sobre a necessidade da venda de ativos. Para o analista da Planner Luiz Caetano, as perspectivas atuais colocam em pauta a necessidade de revisão do programa de venda de ativos e redução de custos da empresa, que promete gerar US$ 57,7 bilhões até 2018.
"Tendo que cuidar da sua alavancagem, é provável que ela tenha que atrasar alguns projetos e priorizar os investimentos de retorno mais rápido, para não prejudicar seu endividamento", explica Luiz Caetano.
Flavio Conde, da consultoria WhatsCall, destaca ainda que a perda do grau de investimento do país tende a desvalorizar os ativos da petroleira no mercado. "Os investidores vão querer pagar menos pelos ativos. A Petrobras está no pior dos mundos. Com o dólar aumentando, a dívida da companhia já ultrapassa os R$ 500 bilhões. Isso é cinco vezes o Ebitda da empresa", frisou.
Fonte: Valor Econômico/Daniela Meibak, André Ramalho, Camila Maia e Fernando Torres | De São Paulo e do R