O governo de Mendoza, no oeste da Argentina, sofre pressões para endurecer o jogo com a Vale. A companhia recebe críticas de empresários locais e a Câmara Provincial de Deputados, que ratificou a licença ambiental ao projeto para exploração de cloreto de potássio no rio Colorado, convocou representantes do Poder Executivo para prestar esclarecimentos. Nesta semana, a Comissão de Economia ouviu o diretor de Saneamento e Controle Ambiental de Mendoza, Ricardo Debandi, que acusou a mineradora brasileira de enviar informações "insuficientes para determinar se está cumprindo" o compromisso firmado de dar preferência à mão de obra e fornecedores locais.
Em novembro, conforme informou Debandi aos deputados, o governo de Mendoza cobrou a Vale pela primeira vez, mas só obteve respostas "parciais". "Vamos fazer cumprir a ata-acordo, essa é uma decisão de governo", afirmou o funcionário. Ele disse que a Universidade Nacional de Cuyo fará uma auditoria nas informações enviadas pela Vale.
Procurada pelo Valor, a mineradora se pronunciou por meio de um comunicado: "Segundo as regras da mineração local, os programas de investimentos e obras são apresentados nos momentos iniciais da exploração. No caso do Projeto Rio Colorado, isso ocorreu há muitos anos, razão pela qual estão sendo revisados os respectivos documentos. De qualquer forma, a informação solicitada [pelo governo de Mendoza] será completada em tempo, forma e nos pontos que requer a normativa, tal como se faz com toda a informação requerida à companhia".
Mendoza, onde fica o projeto, abriga 80% da produção de vinhos, que rendeu US$ 700 milhões em exportação em 2010
O projeto do rio Colorado, como é conhecido o investimento em Malargüe, prevê a exploração de 2,4 milhões de toneladas por ano de cloreto de potássio a partir de 2013. O volume deverá crescer gradualmente até atingir 4,3 milhões de toneladas anuais, voltadas à exportação, o que tornará a Argentina um dos cinco maiores vendedores mundiais.
Para executar o empreendimento, a Vale fechou contratos com três grandes empreiteiras brasileiras. A Odebrecht ficará responsável pela instalação da mina em si; a Camargo Corrêa cedeu parte de uma ferrovia que detém na Argentina e construirá um novo ramal de 368 quilômetros de trilhos; a Andrade Gutierrez erguerá um terminal próprio da Vale no porto de Bahía Blanca, que poderá receber navios de tamanho Panamax e com capacidade para movimentar até 1.600 toneladas por hora.
Em dezembro, a mineradora também assinou um contrato com a YPF Repsol para extrair gás não convencional das jazidas da petrolífera argentino-espanhola na Província vizinha de Neuquén. A Vale precisará de 1,5 milhão a 2 milhões de metros cúbicos por dia de gás para as suas operações em Mendoza, e não há outra fonte de energia disponível atualmente. Por isso, firmou essa parceria, com investimentos de US$ 150 milhões.
Obviamente, o governo de Mendoza não tem interesse em afastar o empreendimento da Vale, mas precisa lidar, além das queixas empresariais, com os temores da sociedade civil. Responsável por mais de 80% da produção argentina de vinhos, que rendeu exportações de quase US$ 700 milhões no ano passado, a Província tem apostado alto no turismo internacional.
A região da mina a ser explorada pela Vale, no sul de Mendoza, está longe dos centros turísticos e é pouco habitada. Mesmo assim, na primeira semana de março, centenas de manifestantes tomaram o centro da capital da Província e atrasaram em horas o início do festival que comemora todos os anos a chegada da colheita das uvas. Era uma passeata contra a mineração em geral, não contra a Vale em particular, e tinha à frente o deputado Pino Solanas, candidato à Presidência da República pela coalizão de esquerda Proyecto Sur. Pedia leis mais rígidas para a proteção das geleiras e acusava as mineradoras de contaminar a água consumida na região.
Fonte: Valor Econômico/Daniel Rittner | De Bueno Aires
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