Embora ainda não apresente superávit, a indústria de transformação deu grande contribuição para a balança comercial em 2015. Com a queda do superávit comercial nos produtos básicos, foram os produtos industriais que, com a redução de déficit, possibilitaram o aumento do saldo global de janeiro a setembro deste ano, na comparação com iguais meses de 2014, aponta levantamento do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).
"Quem diria, os produtos industriais lavaram a alma da balança comercial em 2015", diz Julio Gomes de Almeida, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica. Enquanto o superávit comercial dos produtos básicos caiu US$ 8,25 bilhões no acumulado até setembro, na comparação com igual período de 2014, o déficit da balança da indústria de transformação caiu US$ 19,2 bilhões, influenciado principalmente pela queda das importações de manufaturados. O saldo positivo global subiu US$ 10,25 bilhões.
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O déficit da indústria de transformação caiu de US$ 49,2 bilhões para US$ 30 bilhões nos três primeiros trimestres de 2014 para os mesmos meses deste ano. Para o período, trata-se do melhor resultado da indústria desde 2010, quando o déficit de janeiro a setembro foi de US$ 25,8 bilhões. Os dados foram levantados com base nos critérios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Os motivos para um déficit bem menor, porém, diz Almeida, não são os mais "nobres". A redução de saldo negativo resulta de uma queda das importações muita mais forte que o recuo das exportações. O recuo em ritmo mais forte das importações, diz Almeida, acontece porque elas são compostas majoritariamente de bens industriais sofisticados e de alto valor agregado, e que "servem" à produção de artigos que respondem mais rapidamente ao do mercado, para mais ou para menos. "Pode ser também que a recessão do país esteja se aprofundando, arrastando com ela as importações."
José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diz que o efeito do recuo das importações é muito maior sobre os manufaturados do que sobre os básicos. Isso porque os manufaturados respondem por 37% das exportações, mas, nas importações, essa fatia cresce consideravelmente, para 85%. "Ou seja, uma queda nas importações totais significa recuo duas vezes maior nos desembarques de manufaturados, o que contribui para um déficit menor na balança da indústria."
Nas exportações de produtos industriais, estima Almeida, a norma deste ano é a queda de valores, mas é possível que as taxas de declínio, atualmente em aumento gradativo, se desacelerem e, num prazo maior, haja crescimento. "O câmbio fez pouco efeito até agora, mas é possível que venha a fazer um pouco mais à frente."
Para Castro, mantido o nível de depreciação de câmbio atual, a exportação deve apresentar crescimento em 2016, estima. Ele ressalta, porém, que a base de comparação é muito baixa, em razão da perda de valores de embarques nos últimos anos. "Para se ter uma ideia, neste ano teremos valor de exportação menor do que o de 2006. Perdemos dez anos." Segundo ele, no ano que vem deve haver ligeira recuperação da exportação de automóveis a países sul-americanos, puxada pela Colômbia, por conta do recente acordo assinado na área comercial e de investimentos. Também há a perspectiva de manutenção de crescimento nos embarques para os americanos.
Muitos contratos estão sendo negociados, mas irão gerar embarques efetivos apenas a partir de 2016. "Se não conseguirmos elevar as exportações no ano que vem, é porque nossa credibilidade está muito baixa", diz Castro. As elevações serão pequenas, pondera ele, com longo caminho para recuperar o comércio perdido.
Segundo o o presidente da AEB, entre janeiro e setembro deste ano o Brasil conseguiu elevar exportações de manufaturados apenas para cinco países, na comparação com igual período de 2014, entre todo o universo de destinos de exportação do país. O crescimento aconteceu nas vendas para EUA, Rússia, Índia, China e África do Sul. "Mas tirando os americanos, a exportação de manufaturados para os demais países é muito baixa. Ou seja, o crescimento acontece por conta da baixa base de comparação", afirma Castro.
Entre os cinco, o mercado americano é, disparado, o destino mais importante de manufaturados, com embarques brasileiros de US$ 10,4 bilhões no acumulado até setembro. A seguir vem a China que, apesar de ser o maior parceiro comercial brasileiro nos básicos, comprou apenas US$ 1,4 bilhão em manufaturados brasileiros de janeiro a setembro.
Rafael Fagundes, economista do Iedi, ressalta que o levantamento analisou o desempenho da indústria dividida em quatro faixas, por intensidade tecnológica. A única que conseguiu elevar exportações no acumulado até setembro, ressalta, foi a de alta intensidade tecnológica, cujos embarques cresceram 1,9%, puxados pela indústria aeronáutica. Mesmo assim, houve déficit de US$ 18,8 bilhões até setembro.
Como de costume, a faixa dos segmentos de baixa intensidade tecnológica foi a única com superávit comercial dentre as quatro divisões - US$ 25,2 bilhões -, menor superávit para janeiro-setembro desde 2009.
Fonte: Valor Econômico/Marta Watanabe | De São Paulo