Enquanto julga o mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) abrirá espaço para outro assunto polêmico: o uso do amianto branco (crisotila) pela indústria brasileira. Em dois dias de audiência pública, serão ouvidas 35 pessoas contrárias ou favoráveis ao uso controlado do mineral, alvo de seis ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) e de duas arguições de descumprimento de preceito fundamental (ADPFs). Os debates começam amanhã e terminam no dia 31.
A audiência foi convocada pelo ministro Marco Aurélio, relator de uma Adin ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI) contra lei paulista que proibiu o uso do amianto. O relator atendeu a um pedido do Instituto Brasileiro do Crisotila (IBC), que defende um setor que movimenta cerca de R$ 3 bilhões por ano e emprega 170 mil pessoas.
Do outro lado estará, dentre outras organizações, a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), entidade que luta para banir o produto de todo o país. O mineral já é proibido em vários Estados. A discussão sobre os malefícios do amianto começou a partir do ajuizamento de inúmeras ações de trabalhadores que desenvolveram doenças pulmonares - especialmente a asbestose -, geralmente cerca de 20 a 30 anos após o primeiro contato com a fibra.
O amianto já foi banido em praticamente toda a Europa e nos Estados Unidos. O material europeu e americano, entretanto, é do tipo anfibólio - que seria mais nocivo - e não crisotila, que é extraído em jazidas brasileiras. O Brasil autoriza o uso controlado do crisotila por meio da Lei nº 9.055, de 1995.
Cinco das oito ações que tramitam no Supremo foram ajuizadas pela CNTI contra leis dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Rio Grande do Sul. Nos processos, o órgão defende que a questão é regulada por lei federal e, portanto, os governos estaduais não teriam competência para legislar sobre o assunto.
Tramita também uma ação contra a lei federal, protocolada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Os órgãos alegam que o amianto é prejudicial à saúde, que é um direito fundamental previsto na Constituição Federal. O assunto também é debatido pela Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística, que obteve no Supremo uma liminar para o transporte de amianto pelo Estado de São Paulo.
A audiência pública, de acordo com o ministro Marco Aurélio, irá analisar, do ponto de vista científico, a possibilidade ou não do uso seguro do amianto. Também será analisado o impacto econômico de seu banimento. "A audiência servirá para os ministros ouvirem elementos técnicos sobre a questão, trazidos pelos setores envolvidos", diz o relator. O Brasil é atualmente o terceiro maior produtor de amianto do mundo, perdendo apenas para a Rússia e a China.
De acordo com Marina Júlia de Aquino, presidente do IBC, a intenção da entidade é esclarecer aos ministros a possibilidade de uso controlado do amianto. Será demonstrado, segundo ela, que o produto é diferente do que era utilizado na Europa. "O crisotila é menos nocivo à saúde. Com a evolução tecnológica, é possível trabalhar com amianto sem prejudicar trabalhadores ou consumidores", afirma Marina.
Para o advogado Mauro Menezes, que atua para a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto, porém, a inalação do pó do amianto é nociva e causa três doenças: a asbestose, o câncer de pleura, conhecido como mesotelioma, e o câncer de pulmão. Ele não acredita que possa haver uso controlado do material. "Quando há demolição, telhas ou caixas d'água são destruídas, o que provoca a suspensão do pó do amianto. Existem casos de pessoas que nunca trabalharam na indústria do amianto e tiveram problemas de saúde", diz.
Segundo Menezes, dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) associam o amianto à morte de 107 mil trabalhadores por ano. "As doenças decorrentes da inalação do amianto aparecem após 20 ou 30 anos do contato com a substância. A Inglaterra baniu o amianto há 20 anos, e tem curva ascendente de adoecimentos e mortes", diz.
Para Adilson Santana, vice-presidente da Comissão Nacional dos Trabalhadores do Amianto, o ambiente de trabalho mudou muito após a promulgação da lei federal. "Ficou mais seguro. A norma estipula que ninguém pode estar exposto a mais de duas fibras de amianto por centímetro cúbico. Nós fizemos acordo e hoje todas as fábricas trabalham com 0,1 fibra por centímetro cúbico."
Fonte: Valor / Bárbara Mengardo
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