A empresa de energia francesa Total se tornou a primeira das grandes companhias de petróleo a cancelar sua filiação ao American Petroleum Institute (API), o poderoso grupo de lobby das gigantes petrolíferas em Washington, e citou como justificativa a posição do instituto sobre as mudanças climáticas e seu apoio a políticos que se opuseram ao Acordo de Paris, que prevê a redução de emissões de gases que provocam efeito estufa.
A inciativa expõe o fosso cada vez maior entre as principais empresas de petróleo dos Estados Unidos e da Europa com relação às políticas sobre mudanças climáticas e foi adotada poucos dias antes de o presidente eleito dos EUA, Joe Biden, entrar na Casa Branca, com a promessa de voltar a integrar o Acordo de Paris, reprimir a poluição da indústria do petróleo e começar uma revolução na oferta de energia limpa.
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Ao anunciar a decisão, a Total também citou a oposição do API aos subsídios para veículos elétricos e seu apoio no ano passado às medidas do governo Donald Trump que reverteram as regulamentações para limitar as emissões de metano, um potente gás de efeito estufa.
A Total está “empenhada em garantir, de forma transparente, que as associações do setor das quais faz parte adotem posições e mensagens alinhadas com as do grupo na luta contra as alterações climáticas”, afirmou seu presidente-executivo, Patrick Pouyanné.
Sua posição foi tomada na sequência de uma conferência do API nesta semana, na qual o grupo de lobby expôs as áreas de desacordo com o futuro governo Biden. Entre elas, as propostas do presidente eleito para restringir novas perfurações em terras de propriedade federal nos EUA.
Além de seu polêmico apoio à reversão das regulamentações para o metano adotadas durante o mandato do ex-presidente Barack Obama, o API foi favorável às iniciativas do governo Trump para abrir áreas sob proteção ambiental no Alasca para a perfuração de petróleo.
Grandes acionistas e ativistas ambientais, especialmente na Europa, têm criticado as grandes empresas petrolíferas, como a BP e a Royal Dutch Shell, por serem membros de organizações que têm posições de lobby que se contrapõem às promessas dessas empresas de reduzir emissões.
O principal fundo de pensão norueguês, o KLP, que administra US$ 80 bilhões, avaliou que a decisão da Total aumentaria a pressão sobre a Equinor, a Shell e a BP para que sigam seu exemplo.
“Simplesmente não há nenhuma justificativa para qualquer associação com grupos de lobby que são a favor de reverter a regulamentação sobre emissões e minam as ações urgentes contras as mudanças climáticas”, disse Jeanett Bergan, chefe de investimento responsável do KLP.
O executivo-chefe da BP, Bernard Looney, defendeu a adesão de sua empresa ao API em uma entrevista ao Financial Times no ano passado, e disse que a empresa petrolífera do Reino Unido ajudara a mudar a posição do grupo de lobby sobre algumas políticas.
“Embora você possa achar que eles não têm a política climática mais progressista do mundo, ela é muito mais progressista do que era”, disse Looney. “E isso é parte de nosso papel lá, ajudando e pressionando.”
Mas a decisão da Total dará ímpeto ao chamamento de ativistas para que outras empresas de petróleo europeias saiam do API. Juntamente com a BP e a Royal Dutch Shell, a Total já tinha abandonado sua filiação à American Fuel & Petrochemical Manufacturers, um grupo de lobby de refinarias.
Os negócios da Total nos EUA incluem operações de refino no Texas e de exploração e produção de petróleo bruto e gás natural no Golfo do México e em alguns campos de xisto. A empresa anunciou uma joint-venture esta semana com a 174 Power Global, uma unidade do grupo sul-coreano Hanwha, para instalar mais capacidade de armazenamento de energia solar e baterias nos EUA, como parte de sua tentativa de desenvolver uma empresa mundial de energia renovável.
O API defende já faz muito tempo os interesses das gigantes petrolíferas em Washington. Como no ano passado, por exemplo, quando o presidente Trump procurou proteger os produtores domésticos de petróleo de um colapso nos preços do petróleo bruto.
O instituto alega ter mais de 600 membros, que vão da ExxonMobil e da Chevron para baixo, e também define padrões de segurança para o setor. O API declarou que a saída da Total reflete a “diversidade” de pontos de vista no setor, mas ressalvou que não sustenta o que descreveu como “subsidiar energia”.
Em uma mensagem um pouco suavizada em face do novo governo Biden, o grupo também informou esta semana que estava “aberto à possibilidade” de mais regulamentações e de trabalhar com o novo administrador da Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA, de Environmental Protection Agency) e o futuro presidente “sobre como é possível fazer isso da maneira certa”.
Fonte: Valor