O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo proferiu uma importante decisão para empresas que operam em portos. Definiu que não precisam apenas contratar trabalhadores por meio do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo). Segundo os desembargadores, se os operadores divulgam as vagas previamente aos registrados na entidade e não encontram interessados, estão livres para recrutar funcionários no mercado.
Na decisão deste mês, a 11ª Turma derrubou um recurso em ação civil pública em que o Sindicato dos Operadores de Guindastes e Empilhadeiras (Sindogeesp) pedia R$ 3,9 milhões a título de danos morais. O motivo: a contratação, pela R.D Locação e Serviços, de trabalhadores fora do sistema Ogmo.
PUBLICIDADE
“A ausência de interesse de portuários inscritos no Ogmo é circunstância que tem o condão de viabilizar a contratação de trabalhadores fora do sistema”, diz, no voto, o relator do caso, desembargador Flavio Villani Macedo (processo nº 1001161-11.2019.5.02.0445).
Foi o que ocorreu no caso da R.D Locação e Serviços, que aluga máquinas e movimenta granéis em armazéns do porto de Santos (SP). A empresa teria divulgado vagas de emprego em 2007 e 2018. Nas duas ocasiões, nenhum trabalhador registrado no Ogmo quis ocupar os postos de trabalho.
“Inequívoco que não fora a requerida que se negou a dar cumprimento à norma legal, mas que os trabalhadores não se dispuseram a tanto”, afirma o relator. E acrescenta: “Se as razões de existir da exclusividade não se sustentam mais, por conseguinte, deve-se conferir plenitude ao princípio da livre iniciativa”.
O entendimento da turma, porém, não foi unânime. Para a desembargadora Wilma Gomes Hernandes, é ilegal a contratação de trabalhadores sem registro no Ogmo. Segundo ela, a empresa deveria pagar R$ 20 mil a títulos de danos morais coletivos por recrutar operários diretamente no mercado de trabalho.
“A permissão para a contratação de trabalhadores não registrados implicaria a majoração do número de trabalhadores avulsos disponíveis, reduzindo, por decorrência, a oferta de trabalho e os ganhos respectivos. Vale dizer, a contratação nos moldes realizados pela ré, além de não observar a disposição legal expressa, ainda acarreta a precarização do trabalho portuário”, diz ela, no voto vencido.
A discussão jurídica é sobre a interpretação do artigo 40, parágrafo 2º, da Lei dos Portos (nº 12.815, de 2013). Pelo dispositivo, “a contratação de trabalhadores portuários de capatazia, bloco, estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações com vínculo empregatício por prazo indeterminado será feita exclusivamente dentre trabalhadores portuários avulsos registrados”.
De acordo com o advogado Lucas Rênio, que representa a empresa no processo, a decisão é importante porque entendimento diverso acarretaria na demissão dos trabalhadores. “No caso, seriam cinco funcionários porque se trata de um operador de pequeno porte. Mas há processos em que há risco de demissão de 50 a 150 empregados”, afirma Rênio, sócio da Advocacia Ruy de Mello Miller.
Sócio trabalhista do Bichara Advogados, Jorge Matsumoto diz que a interpretação que prevaleceu no TRT está em sintonia com a Convenção 137 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que estipula a prioridade. “Se a própria OIT fala de prioridade e não exclusividade porque a lei deveria estabelecer condição mais engessada?”
O presidente do Sindogeesp, Paulo Antônio da Rocha, afirma que o sindicato vai recorrer da decisão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). “Temos confiança de reterver porque a lei é clara no sentido da exclusividade”, diz. Ele aponta ainda que os trabalhadores se interessam pelas vagas e “o problema é que as empresas oferecem salários aviltados”.
Em outubro do ano passado, a 16ª Turma do TRT anulou uma multa de R$ 195 mil aplicada contra um operador que contratou 29 trabalhadores sem intermediação do Ogmo. A interpretação dos julgadores foi na mesma linha, de que a contratação deve ser feita prioritariamente - e não exclusivamente - pelo órgão gestor (processo nº 10000795120195020442).
Fonte: Valor