Santos, no litoral de São Paulo, vive nova onda de desenvolvimento  econômico. Alçada à capital futura do pré-sal e sede do maior porto da  América Latina, o município tem pela frente seu maior desafio na década:  capacitar a população para acessar a riqueza.
 
 Trata-se da chance de redenção da cidade com seu povo, evitando o que  ocorreu na década de 90. A privatização de parte do polo siderúrgico em  Cubatão e dos serviços portuários extinguiu cerca de 20 mil postos de  trabalho. Em poucos meses, a cidade ganhou uma massa de desempregados  equivalente a 23% da população da época, conforme números do Núcleo de  Pesquisas e Estudos Socioeconômicos (Nese) da Universidade Santa  Cecília. Em março deste ano, o índice fechou em 10,1%.
 
 Será essa a pedra de toque das eleições de outubro, que promete ser uma  das mais disputadas da história da cidade. São nove candidatos, atrás  somente da eleição de 1984, que teve 11 postulantes ao Palácio José  Bonifácio, sede do governo que tem o nome do patrono da Independência,  nascido na cidade.
 
 "É preciso compartilhar essa riqueza com o cidadão. O maior desafio é a  qualificação", afirma o candidato Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), que  lidera a última pesquisa realizada na cidade até o fechamento desta  edição (antes da oficialização das candidaturas). Ele credita na sua  conta dois feitos: a transferência do curso de engenharia de petróleo da  Universidade de São Paulo (USP) para Santos, já em funcionamento com  dez vagas; e uma nova Faculdade de Tecnologia (Fatec) com cursos de  petróleo e gás, ainda inativa. E promete que o Via Rápida Emprego,  programa estadual de qualificação, atenderá mais de 5 mil pessoas quando  ficar pronto, na zona noroeste da cidade.
 
 Mas os problemas vão além. Os empreendedores que poderiam aproveitar as  oportunidades da cadeia do pré-sal não têm aderência a esse mercado. Até  o ano passado, somente 5% das compras corriqueiras da Petrobras para a  Bacia de Santos e Refinaria Presidente Bernardes (em Cubatão) -  avaliadas em R$ 200 milhões anuais - eram oriundas de empresas da  região.
 
 De acordo com o Sebrae-SP, 85,2% dos empresários da região têm interesse  em fornecer bens e serviços para a cadeia de petróleo e gás. Apenas  14%, contudo, buscam informações sobre como fazê-lo. O levantamento foi  feito com 600 micro e pequenas empresas das nove cidades que compõem a  Baixada Santista (Santos, Guarujá, São Vicente, Cubatão, Praia Grande,  Mongaguá, Itanhaém, Peruíbe e Bertioga) com potencial de fornecimento.
 
 "Avalio que uma geração foi perdida. Até hoje ainda não temos este  preparo. Isso significa menos postos de trabalho e menos arrecadação. É  preciso corrigir este cenário, com urgência, fazendo do poder público um  indutor do desenvolvimento de Santos e da nossa região metropolitana",  afirma a ex-prefeita Telma de Souza (PT).
 
 Concorrendo pela sexta vez ao cargo (que ocupou de 1989 a 1992), ela foi  alvo de deboche pelo então adversário Beto Mansur (PP) nas eleições de  2000, quando disse que havia petróleo na Bacia de Santos. "Fui  desqualificada injustamente e perdi a eleição. Não exclusivamente, mas  principalmente por causa disso. O resultado está aí: o pré-sal é uma  realidade e nós não temos jovens suficientemente capacitados para ocupar  os principais postos de trabalho que estão sendo gerados".
 
 Mansur, também concorrendo, recusa o mea culpa. "Eu disse que não ia ter  petróleo em Santos e não tem. O que existe é a escolha de Santos para  ser o centro logístico, a base desse pré-sal todo, que ainda levará  tempo para ser prospectado e produzido". E engrossa o coro da  capacitação. "O grande mote é procurar integrar a sociedade que vive na  zona noroeste, nos morros, para usufruir dessa riqueza".
 
 Hoje, o pré-sal está em fase inicial de exploração. "Os resultados são  coisa para dez anos", avalia Alcindo Gonçalves, do Instituto de  Pesquisas A Tribuna (IPAT).
 
 Daí a percepção de que, até agora, a exploração e produção nas camadas  mais profundas da Bacia de Santos lograram mais ônus do que bônus ao  cidadão. A começar pelo boom imobiliário e pelo aumento do custo de vida  verificado na região. O Índice de Preço do Consumidor da Cidade de  Santos (IPC-Nese) apresentou inflação de 3,15% neste ano até junho. No  mesmo período, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA),  que mede o efeito dos preços sobre o orçamento das famílias brasileiras,  apontou alta menor, de 2,24%. Em 2011, a mesma coisa. O custo de vida  em Santos aumentou 7,04% contra alta de 5,97% do IPCA. O coordenador de  pesquisas do Nese, Jorge Ferreira, avalia que em 2011 houve recuperação  de alguns indicativos, como aluguéis.
 
 "É controversa essa avaliação de que o custo de vida é caro em Santos. O  que é caro é o preço do imóvel. Como a cidade é uma ilha e não tem para  onde expandir, a tendência é que o metro quadrado se valorize a cada  dia", afirma Ferreira.
 
 Sérgio Aquino (PMDB), candidato da situação, avalia que o atual momento é  - mais uma vez - uma oportunidade resultante da posição estratégica de  Santos, facilitada pelo estuário. "A decisão da Petrobras de instalar a  sede em Santos foi em função da experiência da cidade com a atividade  logística. A Bacia precisará de apoio logístico entre terra e mar e as  plataformas ficam a 400 km da costa, não é pouca coisa". Aquino avalia  que reside aí a grande oportunidade econômica e de geração de empregos  qualificados.
 
 De olho no futuro, a Prefeitura gravou na revisão do plano diretor uma  área para criação de um parque tecnológico. São pouco mais de 3 milhões  de metros quadrados a serem destinados à instalação de empresas de  produção de ciência e tecnologia. Na mesma revisão, duplicou a região  apta a receber empreendimentos portuários e retroportuários na área  continental.
 
 Atualmente a Petrobras estuda como desenvolver sua base logística no  porto de Santos. Junto com a de Itaguaí (RJ), a unidade alimentará as  plataformas da Bacia em alto-mar.
 
 Fala-se em investimentos nos próximos dez anos de R$ 200 bilhões para a  região em razão do binômio petróleo-porto. "Hoje ainda não é possível  mensurar o retorno efetivo deste processo na massa salarial, na geração  de empregos, inclusive em função do cenário econômico internacional e  das restrições de ordem ambiental", afirma Rodolfo Amaral, da RAmaral  & Associados.
 
 De qualquer forma, não se deve esperar, para Santos, ampliação  significativa na receita de royalties, que hoje está em torno de R$ 2,5  milhões anuais, decorrente do corte do subsolo por dutos e do terminal  da Petrobras. Grande parte dos volumes de óleo do pré-sal de Santos  deverá ser escoada por refinarias em outros estados, especialmente no  Nordeste.
 
 Onde a cidade tem mais ganhar é na arrecadação de impostos advindos da  chegada de empresas. Multinacionais como Halliburton, Modec,  Schlumberger, para citar algumas, inauguraram recentemente escritórios  comerciais para ficar perto do raio de atuação da petrolífera.
 
 De investimento concreto em andamento em solo santista existe a  construção da sede da Petrobras para a Bacia de Santos, que recebe este  nome mas vai de Santa Catarina ao Rio de Janeiro. O investimento é de R$  380 milhões e compreende um complexo de três torres com capacidade para  mais de 6 mil funcionários a ser entregue até 2018. Elas serão erguidas  em fases - apenas as obras da primeira já começaram e devem terminar no  próximo ano.
 
 Hoje, o porto de Santos e as atividades correlatas (despacho aduaneiro,  agência de navegação, entre outros) ainda são a maior fonte de  arrecadação municipal, respondendo por quase 62% de toda a receita do  Imposto Sobre Serviços (ISS). Em 2011, o ISS cresceu 21,6%, chegando a  R$ 301,5 milhões, o equivalente a 46,4% das receitas tributárias.
 
 A ampliação da capacidade de movimentação de contêineres até o fim de  2013 deverá ter impacto mais direto tanto na arrecadação de impostos  quando na geração de empregos. Juntos, os novos terminais da BTP e  Embraport quase duplicarão a atual oferta de contêineres do porto. Com  alto grau de automação no embarque e desembarque de cargas, as empresas  buscam mão de obra especializada.
 
 Fábio Nunes (PSB), o professor Fabião, defende o que chama de visão  'holística' do desenvolvimento. Forjado no bojo da militância ambiental,  aderiu ao governo atual, de João Paulo Papa (PMDB), para ocupar a  cadeira de Meio Ambiente. "Costumo dizer que fui gerador de conflito,  hoje sou gestor", afirma. "A cidade está se preparando para atacar o  potencial dessa cadeia do pré-sal. O desafio é ter arranjos produtivos  locais e economia inclusiva".
 
 O vencedor das eleições em Santos administrará orçamento de R$ 1,5  bilhão; PIB de R$ 22,5 bilhões (a 7ª economia do Estado); e terá a  tarefa de integrar a zona leste, mais rica, e a zona noroeste e morros,  mais pobre, onde moram 100 mil habitantes - quase 24% da população.
 
 "Hoje existem duas cidades totalmente opostas. Mais de 7.500 famílias  vivem em condições sub-humanas de habitação, com menos de três  salários", aponta Barbosa.
 
 O novo prefeito tem de efetivar o programa da prefeitura que conta com  recursos das três esferas da federação para macrodrenagem, habitação e  infraestrutura, diz Fábio Nunes. Ao todo, serão investidos R$ 549  milhões entre 2011 e 2015
 
 "Não podemos fazer um centro de excelência financeira e técnica em  detrimento de outras cidades", diz Telma. Segundo ela, há problemas  comuns de educação, saúde e mobilidade urbana.
 
 Quarenta e dois por cento dos moradores apontam que a saúde deve ser  prioridade do próximo prefeito. Santos tem hoje 1.915 leitos  hospitalares, média de 4,5 leitos para cada mil habitantes. É mais do  que recomenda o Ministério da Saúde, que estabelece a relação mínima  ideal de 2,5 a 3 leitos para cada mil habitantes. Mas Santos recebe o  fluxo de moradores das cidades vizinhas, o que joga para baixo essa  relação.
 
 O dispêndio global do município para o setor, em 2010, foi de R$ 261,6  milhões, dos quais R$ 169,5 milhões com recursos próprios. A legislação  impõe investimento mínimo em saúde de 15%, mas Santos cumpre um índice  de 18,05%. O grande desafio do setor, em 2013, será a manutenção do novo  Hospital dos Estivadores, recém-adquirido pela Prefeitura e em fase de  aparelhamento para entrar em funcionamento. "A maior parte dos problemas  é metropolitana, então as soluções têm de ser metropolitanas", afirma  Barbosa.
 
 Fonte: Valor
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