O secretário de Políticas Econômicas do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, admitiu ontem que um artigo do projeto de lei que trata do modelo de exploração do petróleo da camada pré-sal (partilha de produção) pode ser interpretado - equivocadamente, segundo ele - como um benefício às empresas petrolíferas e, por isso, o governo estaria analisando se há necessidade de alteração do texto.
Em audiência pública realizada ontem no Senado, onde tramitam os quatro projetos do pré-sal, o presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras, Fernando Siqueira, afirmou que um artigo incluído pelo deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), relator da proposta da partilha, "desfigurou" a proposta original do governo e, se tornado lei, faria o Brasil "virar um imenso paraíso fiscal".
Trata-se do parágrafo 2º do artigo 42 do projeto, que assegura "ao contratado sob o regime de partilha de produção a restituição, em óleo, dos valores dos royalties pagos". Assim como as outras três propostas do marco regulatório do pré-sal (capitalização da Petrobras, criação de estatal para gerir os contratos de partilha e do fundo social), o projeto da partilha já foi aprovado na Câmara e está no Senado.
"O consórcio tem que pagar 15% de sua produção em royalties. O pagamento tem que ser feito em dinheiro. O royalty é um imposto. Quando a empresa recebe de volta, em petróleo, o equivalente ao valor pago (a título de royalties), ela tem dupla vantagem. Primeiro, deixa de pagar o imposto, já que é ressarcido. Segundo, recebe de volta no bem mais estratégico, que é o petróleo. Ela paga em reais e recebe em petróleo. E quem tiver petróleo cada dia tem mais poder de barganha no mercado internacional", disse Siqueira.
Para o engenheiro, o "absurdo completo" foi incluído no projeto da Câmara em resultado de "um lobby fortíssimo" em cima do relator do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP). Siqueira disse, ainda, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi informado da "gravidade da emenda" e garantiu a interlocutores que ela não passaria. A preocupação já havia sido manifestada pelos senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Francisco Dornelles (PP-RJ).
Nelson Barbosa afirmou que a intenção do governo não é beneficiar as petrolíferas. "O objetivo econômico é que a empresa pague royalties, obviamente. Se a redação não exprime isso claramente, podemos modificar". Ele admitiu que a emenda está sendo interpretada como forma de "neutralizar" o pagamento de royalties pelo consórcio e negou que essa tenha sido a intenção do governo. Segundo ele, o objetivo era tentar viabilizar o pagamento dos royalties pelo consórcio.
"No regime da partilha, o petróleo todo é da União. O agente extrai o petróleo e recebe a remuneração em custo. Só que o pagamento de royalties tem que ser feito em dinheiro. Como é que paga em dinheiro, se não tem petróleo? Você precisa, primeiro, receber o petróleo, para vender e fazer o pagamento (de royalties) em dinheiro. Essa é uma questão técnica que será resolvida."
Segundo Barbosa, uma solução pode ser a alteração do texto. Mas uma outra estaria sendo analisada em conjunto com o Ministério de Minas e Energia: a união fazer a repartição dos royalties, em vez de a empresa ter que receber para pagar.
Ontem, o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), afirmou que seu partido não irá mais se opor à realização de acordo com o governo para a votação dos projetos do pré-sal, deixando a questão da repartição dos royalties entre Estados e municípios para depois das eleições. O governo está disposto a retirar o regime de urgência constitucional da tramitação dos projetos (pelo qual eles trancam a pauta de votações não sendo votados em 45 dias), em troca de um calendário de votações no 1º semestre.
Fonte: Valor Econômico/ Raquel Ulhôa, de Brasília
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