Prefeitos contrários à nova regra de pagamento de royalties sobre petróleo, que determina o rateio de recursos a todos os municípios de acordo com a divisão do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) receberam com perplexidade a notícia da aprovação da proposta pela Câmara dos Deputados. O resultado do plenário da Câmara começou a ser divulgado ontem em Belo Horizonte quando participavam de um coquetel da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), que realizou sua reunião anual na capital mineira.
"Estava confiante que ia ser mantido o texto do deputado Antonio Palocci (PT-SP) que estabelecia uma regra de transição", comentou o presidente da Frente, o prefeito de Vitória (ES), João Coser (PT). "Isto não pode ser objeto de uma votação de fim de legislatura, em que os líderes partidários transferem a responsabilidade para um veto presidencial", comentou o prefeito de Joinville (SC), Carlito Merss.
A aprovação de um fundo de compensação aos Estados e municípios atingidos com a nova repartição, concentrados no Rio de Janeiro e no Espírito Santo é vista como insuficiente. "Quem garante que o Tesouro Nacional vai aportar recursos", perguntou o prefeito de Macaé (RJ), Riverton Mussi (PMDB), um dos que admitiram a possibilidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não vetar a nova lei, apesar do presidente ter garantido a diversos interlocutores que não sancionaria uma revisão de royalties que afetasse contratos já estabelecidos.
"Eu já estou com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADIN) pronta. A Constituição é clara em dizer que Estados e municípios produtores de petróleo e minérios precisam ter tratamento diferenciado. Não tenho culpa de meu município ter sido abençoado por Deus", disse Mussi. Os royalties do petróleo representam 36% do Orçamento de R$ 1,2 bilhão de Macaé, que conta com 210 mil habitantes.
Os pagamentos fazem com que a cidade da costa norte do Rio de Janeiro tenha uma capacidade incomum de investimento municipal: a prefeitura administra três faculdades e lançou um projeto de Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). "Tudo isso acaba da noite para o dia com o fim dos royalties. Não terei sequer como fazer custeio de saúde e educação", afirmou Mussi.
Para a maioria dos prefeitos de áreas mineradoras, a nova repartição de royalties também incomoda. "Estamos articulando a elevação de alíquotas para a Contribuição Financeira para a Exploração de Recursos Minerais (Cfem). Mas se prevalecer o entendimento de que as riquezas do petróleo têm que ser repartidas a todos os municípios, o mesmo valerá para as riquezas minerais", disse o prefeito de Congonhas (MG), Anderson Cabido (PT). Os royalties minerais têm hoje valores irrisórios se comparados aos do petróleo. Enquanto o Rio e seus municípios somam R$ 8 bilhões por ano pelo petróleo, os de Minas ganham cerca de R$ 300 milhões pelo de minério.
Os prefeitos a favor da nova repartição já pensam na mobilização pós-veto. "Eles não estão com a mesma força política que nós temos. Nós vamos a Brasília, talvez em uma marcha dos prefeitos, e temos como derrubar um veto", afirmou o prefeito de Aparecida de Goiânia, o ex-governador goiano Luiz Maguito Vilella (PMDB). Maguito calcula que a divisão de royalties de acordo com a repartição do FPM pode trazer R$ 1 milhão mensais para o seu município, que conta com uma receita de R$ 30 milhões por mês em média. "Percentualmente pode significar pouco, mas para nós faz uma grande diferença. A nossa receita per capita hoje é menos que a metade da média brasileira", disse.
Com 510 mil habitantes na periferia de Goiânia, Aparecida conta com uma receita que equivale a menos de um terço da de Macaé, a "abençoada por Deus" segundo o prefeito Mussi. "Temos 15% do município com rede de esgoto e somente 50% com água tratada. Metade da nossa rede viária não tem asfalto", queixou-se Maguito. Na mobilização para se manter o texto, não deverá haver um corte entre o governo e oposição. "Esta luta é a de dois ou três Estados com o resto do país", disse o político goiano. "Se a gente quer ser um país continental, com uma estratégia de redução de desigualdade, é no mínimo esquizofrênico privilegiar de maneira ilimitada os Estados produtores", confirmou a prefeita de Fortaleza (CE), Luizianne Lins.
Fonte: Valor Econômico/César Felício | De Belo Horizonte
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