Após entrar na disputa com grandes empreiteiras para obter contratos bilionários com a Petrobras nos últimos anos, a empresa paulista Tomé Engenharia diz estar vendo seu dinheiro em caixa secar. Além de alegar ter "um valor significativo" a receber da estatal por obras já executadas (devido a aditivos ainda não aprovados), a companhia não consegue mais acessar crédito no mercado. "Vamos encerrar as atividades até a metade do ano", afirma Carlos Alberto de Oliveira e Silva, presidente da companhia.
A empresa foi citada nas investigações da Operação Lava-Jato. Oliveira, como o executivo diz ser conhecido, concordou em conceder uma entrevista dizendo que "quem não deve não teme". Ele explica que vai fechar as portas porque, em breve, não contará com mais obras em carteira. "Vamos hibernar e suspender as atividades temporariamente", afirma. O último contrato em mãos tratava de trabalhos nas unidades de diesel da Refinaria Presidente Bernardes, da Petrobras. A obra fica em Cubatão, no litoral de São Paulo, mas passou de mãos.
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Sem caixa suficiente para investir, a Tomé (que tinha 51% do contrato) decidiu há 15 dias transferir sua parte ao sócio francês Technip (que tinha 49% e passou a deter 100%). "O valor da transação foi irrisório, tenho vergonha até de falar", diz. A Tomé continua trabalhando no local, mas apenas como subcontratada da Technip. A obra tem mais de 80% de conclusão, segundo ele.
A decisão de sair do contrato ocorreu depois de o consórcio ter de bancar vários investimentos do próprio bolso. O valor que a empresa tem a receber da Petrobras por esse contrato não foi revelado. Não é o único caso em que a Tomé enfrentou dificuldades para obter aditivos. "Todos os contratos com a Petrobras têm o mesmo problema", resume Oliveira. Casos semelhantes ocorrem com outras empresas.
Outro consórcio integrado pela Tomé também reivindica mais aditivos da Petrobras em um contrato para produzir módulos para plataformas replicantes (montadas de forma repetida, seguindo um mesmo projeto). Hoje, a Tomé Engenharia tem 55% do contrato. Sua sócia alemã, a alemã Ferrostaal, tem 45%. As parceiras já construíram no porto de Maceió (AL) a infraestrutura para produção dos módulos e já produziram as primeiras unidades do pacote 4 das plataformas replicantes.
Já na Refinaria Landulpho Alves de Mataripe (RLAM), na Bahia, há outros milhões em aditivos ainda não aprovados pela Petrobras em um contrato de fornecimento de materiais, equipamentos e outros serviços na unidade de gasolina. Os sócios são Alumini (ex-Alusa) e Galvão Engenharia. Nesse caso, as obras já estão concluídas há mais de um ano - e, inclusive, o ativo já está em operação.
A Tomé Engenharia tem mais de 40 anos de atuação e abriu suas portas fazendo o transporte de equipamentos industriais pesados e aluguel de guindastes. Há cerca de 15 anos, decidiu expandir os negócios e atuar também em engenharia e construção. Há cinco anos, começou a disputar as obras da Petrobras.
Agressiva nos preços, a empresa viu a carteira de obras aumentar - e a receita também. Em 2003, seu faturamento era de R$ 62 milhões. Em 2013, pulou para R$ 900 milhões. "Mas cadê o capital de giro? Não tem", afirma Oliveira. O executivo conta que já recorreu aos bancos várias vezes para obter empréstimos e continuar suas operações, mas agora o capital está mais escasso no mercado.
Além de todos os problemas de caixa que já vinha enfrentando, a Tomé foi alvo há cerca de duas semanas de uma sanção administrativa da Petrobras. Ela, além de outras 22 empresas, estão impedidas de assinar novos contratos com a estatal. A medida foi anunciada pela petroleira em 29 de dezembro com base nos depoimentos de Julio Camargo (do grupo Toyo), Augusto Ribeiro de Mendonça Neto (grupo Setal), Paulo Roberto Costa (ex-diretor da Petrobras) e Alberto Yousseff (doleiro) às autoridades. Segundo a Petrobras, os depoimentos "indicam como participantes de cartel" os 23 grupos econômicos citados.
Oliveira diz que não agia em combinação com outras empresas e chega a mostrar um processo administrativo de outra companhia (também citada como integrante do cartel), que contesta o resultado de uma das licitações vencidas pela Tomé. "Se agíamos em cartel, por que ela contestaria o resultado?", argumenta. Também diz que nem ele e nem outros executivos receberam qualquer pedido para pagamento de propinas. "Nem haveria dinheiro para isso", diz.
A empresa diz que o bloqueio feito pela Petrobras é nocivo sobretudo para a imagem da companhia. Oliveira conta que o acesso aos bancos ficou ainda mais difícil e que fornecedores tentam antecipar pagamentos. Na defesa à estatal, enviada nesta semana, a empresa diz não fazer parte do cartel e pede a derrubada do bloqueio. (Colaborou Olivia Alonso)
Fonte: Valor