O resultado da licitação internacional bilionária da Petrobras para a construção de dois navios-plataforma voltados à produção de petróleo do pré-sal poderia ter sido diferente caso mais empresas tivessem participado do processo, aumentando a concorrência, e reduzindo os preços das unidades, dizem fontes da indústria offshore. A licitação visa à construção das plataformas P-80 e P-82, para exploração de jazidas do pré-sal, no campo de Búzios. A concorrência foi vencida pela cingapuriana Keppel Shipyard, que ofereceu US$ 2,983 bilhões por unidade, o equivalente a R$ 15,48 bilhões pelo câmbio de ontem, de R$ 5,19 por dólar.
O custo total das duas plataformas para a Petrobras seria de mais de R$ 30,96 bilhões, valor considerado inédito para este tipo de encomendas, segundo fontes que falaram ao Valor na condição de anonimato. O edital prevê ainda a construção, pela Keppel, de outra FPSO, a P-83. A sigla FPSO designa unidades flutuantes que produzem, estocam e escoam petróleo e gás. Como referência, a Petrobras fechou recentemente, a compra das plataformas P-78 e P-79, contratadas a um custo de US$ 2,3 bilhões cada.
PUBLICIDADE
Com previsão de iniciar operação comercial em 2026, as plataformas P-80 e P-82 terão capacidade de processar diariamente 225 mil barris de petróleo e 12 milhões de metros cúbicos (m3) de gás natural. As unidades, mais a FPSO Almirante Tamandaré, da SBM, afretada para a Petrobras, serão as maiores plataformas do Brasil em capacidade de processamento.
Melhor proposta foi da Keppel no valor de US$ 2,983 bilhões, ou R$ 15,48 bilhões, por cada uma das unidades
A P-78 e a P-79 possuem porte menor, capazes de produzir 180 mil barris por dia de petróleo e 7,2 milhões de m3 de gás. Ainda assim, na avaliação das fontes ouvidas, a diferença de porte não justificaria o preço a mais praticado. O que explicaria a diferença de preço, segundo as fontes, é que a segunda colocada, a Sembcorp Marine Rigs & Floaters, apresentou proposta de US$ 3,660 bilhões para cada unidade, de acordo com o site Petroconect, que reúne as licitações da petroleira.
A Sembcorp está em processo de fusão com a Keppel no exterior - ambas possuem o mesmo controlador, o fundo de investimentos Temasek. A operação anunciada no fim de abril deste ano, na prática, unifica as atividades das duas empresas.
Além disso, uma das empresas habilitadas a apesentar na licitação, o Estaleiro Brasfels, de Angra dos Reis (RJ), também pertence à Keppel. Das seis empresas que se qualificaram na concorrência, três são do mesmo grupo: a Keppel. O Brasfels e outras três empresas terminaram desistindo de apresentar proposta na licitação.
Procurada pelo Valor, a Petrobras respondeu que não comenta processos de contratação em andamento, como é o caso das FPSOs P-80 e da P-82. A empresa confirmou o recebimento de duas propostas comerciais e afirmou que “a referida licitação está sendo conduzida em conformidade com a Lei 13.303/2016” (Lei das Estatais).
A Petrobras lançou a licitação internacional no fim de abril do ano passado, na modalidade conhecida como engenharia, suprimento e construção (EPC). O que se afirmava na época era que a empresa teria enfrentado dificuldades de atrair empresas para a licitação ao longo de 2021, levando a estatal a postergar o início de entrega das propostas para maio deste ano.
O reaquecimento do mercado de exploração e produção e a Guerra na Ucrânia, porém, podem ter influído na contratação das FPSOs. Uma fonte da indústria do petróleo avalia que o alto custo de matérias-primas e dos equipamentos levariam fornecedores a reavaliar estratégias, evitando participar dos leilões sem uma certa clareza do cenário futuro. Ou poderiam apresentar valores mais elevados como forma de seguro contra volatilidades. “A guerra criou incertezas sobre preços e prazos de entrega”, disse o executivo.
O cenário cria um paradoxo: se na década passada a prioridade era a construção de plataformas no Brasil, a dificuldade de desenvolver esses projetos no país mostrou que o caminho é a produção das unidades no exterior. A política de conteúdo nacional mínimo, adotada no governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, exigiu a construção e reforma de estaleiros e a preparação da indústria brasileira para atender a novas encomendas. Nos últimos anos, plataformas têm sido contratadas com fornecedores estrangeiros na Ásia, mais eficientes e baratos.
Fonte: Valor