Quem passa pela rodovia Rio-Santos (SP-055) não imagina que na altura do município de Bertioga existe uma pacata vila no pé da Serra do Mar em estilo inglês. Ela abriga a usina hidrelétrica de Itatinga, construída há 100 anos completados ontem para fornecer energia ao porto de Santos.
Concebida pelo engenheiro Guilherme Benjamim Weinschenck, a hidrelétrica faz de Santos o único porto do Brasil a contar com uma usina própria que lhe dá autonomia de voo. Uma obra visionária concluída em 1910 por homens que vislumbraram o potencial de crescimento do complexo. "Parece que naquela época o engenheiro Weinschenck já visualizava o porto operando nas duas margens do estuário a plena capacidade, como nos dias de hoje", diz Osvaldo Freitas Barbosa, engenheiro residente na vila de Itatinga entre 1973 e 1979. "Foram os melhores anos da minha vida", relata, ao apresentar o lugarejo com os olhos o tempo inteiro marejados.
A capacidade instalada da hidrelétrica é de 15 megawatts e garantiu a autossuficiência do porto até praticamente o fim da década passada, lembra o atual engenheiro responsável pela usina, Itamar Barbosa Gonçalves, há 22 anos trabalhando na unidade. Para dar uma ideia da visão de planejamento que resultou na obra, em 1910 o porto tinha pouco mais de 4,7 km de cais e crescia turbinado pelas exportações de café, tendo movimentado naquele ano cerca de 1,5 milhão de toneladas. Hoje, são 13 km acostáveis e a projeção é escoar 95 milhões de toneladas este ano.
Mesmo diante da expansão portuária no último século e sem qualquer obra de ampliação, Itatinga responde atualmente por 85% da energia consumida pelo complexo. Em épocas de pico, a exigência é de 23 megawatts. O excedente é comprado no mercado comum, num intercâmbio com a concessionária CPFL.
A Codesp (Cia. Docas do Estado de São Paulo), estatal que administra o porto, investirá R$ 18 milhões até 2012 para modernizar alguns processos de Itatinga, onde praticamente todos os equipamentos são originais. Com isso, a usina deverá elevar em 20% a atual capacidade de suprimento, alcançando 18 MW. Mas diante de seu maior ciclo de expansão, com novos terminais em desenvolvimento e a perspectiva de duplicação da área com a incorporação da região conhecida como Barnabé Bagres - que abrigará uma nova fronteira de terminais -, o porto terá necessidade energética de 50 MW, suficiente para suprir uma cidade de 167 mil habitantes. Essa demanda será completada no mercado.
"Nosso objetivo não é ganhar dinheiro com a usina. Hoje, ela tem um valor muito mais histórico e estratégico, podendo fornecer energia até para as regiões vizinhas em alguma situação excepcional", diz o presidente da Codesp, José Roberto Correia Serra.
Desde a inauguração de Itatinga, os empregados das docas passaram a residir na vila, que é acessada de barco pelo rio Itapanhaú e daí exclusivamente por trem, num trecho de 7 km em que o viajante é banhado por uma vegetação estonteante de montanhas cobertas por matas da encosta.
Até o fim dos anos 70, todos os funcionários da usina moravam na pequena vila que tem em torno de 60 casas. Nessa época, funcionou uma escola e ainda hoje há posto médico, uma padaria, anfiteatro, capela e o Itatinga Atlético Clube. Nos últimos anos, com a modernização e terceirização da manutenção dos serviços, o contingente de moradores reduziu-se bastante.
Fonte: Valor Econômico/Fernanda Pires | Para o Valor, de Bertioga
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