Palestrantes discutiram questões ambientais, regulatórias e operacionais sobre temas como água de lastro, combustíveis menos poluentes, tecnologias de monitoramento de óleo e eólicas offshore
A descarbonização, a transição energética e as melhorias na gestão de ativos já mobilizam significativamente o setor marítimo e ainda desafiam agentes públicos e privados a cumprir compromissos internacionais no curto e médio prazo. Além de adotar novos padrões, o setor precisa desenvolver novas tecnologias para se adequar às metas globais para redução de emissões. A expansão das atividades offshore nas próximas décadas também vai exigir a solidez de um arcabouço regulatório para dar segurança jurídica e operacional aos novos projetos. O cenário foi traçado a partir dos diferentes temas abordados pelos palestrantes no 2º dia do Ecobrasil — 16º Seminário Nacional sobre Indústria Marítima e Meio Ambiente.
A partir de setembro de 2024, todos os navios da frota mundial deverão ter instalado o sistema de tratamento de água de lastro cumprindo o padrão D2 de desempenho. A convenção internacional para o controle e gerenciamento da água de lastro e sedimentos dos navios entrou em vigor em 2017. A Normam 20 da autoridade marítima brasileira foi criada em 2005 e um decreto presidencial de 2022 promulgou a Convenção de Água de Lastro. Porém, na prática, foi um decreto 'pró-forma', já que o decreto legislativo já estava em vigor desde 2010.
A chefe do Departamento de Meio Ambiente na Zona Costeira e Águas Jurisdicionais Brasileiras da Diretoria de Portos e Costas (DPC), CF Maria Cecilia Trindade de Castro, destacou a necessidade de controlar os diversos vetores que podem trazer espécies exóticas. “Não adianta controlar apenas um vetor. O foco tem que ser nos múltiplos vetores”, recomendou. Ela explicou que o tema passa por um período de construção de experiências (EBP, na sigla em inglês) até o final de 2026, quando poderão ser apresentadas emendas à Convenção. Maria Cecilia acrescentou que a experiência dos port state controls vai contribuir com a análise de informações.
O professor adjunto da Escola de Engenharia Industrial Metalúrgica da Universidade Federal Fluminense (UFF), Newton Pereira, lembrou que a busca por uma solução para o problema da água de lastro vem desde a década de 1970. Ele observa que, hoje, existe uma grande oferta de sistemas de tratamento de água de lastro no mercado, os quais podem ser escolhidos pelo armador. Para o professor, o maior desafio para a adaptação à regra D2 está na contagem dos oroganismos por metro cúbico. "Os desafios do ponto de vista tecnológico devem ser vivenciados nos próximos espaços de tempo", projetou Pereira.
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Ele avalia que a instalação desses sistemas na frota de navios tenderá a trazer uma redução no risco de introdução de espécies exóticas por meio da água de lastro. Pereira apresentou uma estimativa que somente o tráfego de embarcações nos portos de Tubarão (ES), Ponta da Madeira (MA), além do complexo de Santos (SP) e dos portos da Bacia de Sepetiba representa uma grande acumulação de água de lastro. “Estimamos que estes clusters portuários têm importado mais de 100 milhões de m³ de água de lastro por ano”, disse.
O gerente de vendas sênior da Wärtsilä para América Latina, Mario Barbosa, lembrou que as metas globais para reduzir emissões também são ambiciosas, com objetivo de alcançar queda de 40% nos níveis de gases de efeito estufa (GEE) emitidos até 2030. Ele destacou que os armadores vêm confirmando que está ficando escassa a oferta de crédito para financiamento de embarcações ou demais ativos que não estejam alinhados com estes preceitos sustentáveis. Ele estima que quase 50% da frota mundial precisarão fazer algum tipo de redução de carbono.
O líder da área de energia eólica offshore da Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias (ABEEólica), Matheus Noronha, reforçou que a consolidação de um marco regulatório para a atividade desse tipo de geração em águas brasileiras é fundamental para confirmar o potencial de geração na costa brasileira, atrair investimentos e garantir o fortalecimento dessa indústria no país. Ele citou o recente roadmap da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), que apontou um potencial de 700 GW de geração offshore no Brasil em águas até 50 metros da costa. “É preciso um arcabouço regulatório o quanto antes para o desenvolvimento da indústria e de tecnologias para os próximos anos”, alertou.
O assessor técnico de segurança operacional e meio ambiente da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Alexandre Maciel Kosmalski Costa, considera que a indústria de O&G já possui um certo grau de sustentabilidade. Ele destacou que os contratos de operação já trazem aspectos sustentáveis e que os planos de desenvolvimento precisam ser pensados, cada vez mais, tratando eficiência energética e redução de emissões. Ele contou que esses critérios vêm sendo reforçados nas novas resoluções da agência reguladora. “As emissões já estão mais baixas na nossa indústria do que nos grandes produtores mundiais”, ressaltou.