A Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), responsável pela administração do porto de Santos, pode se ver obrigada a pagar uma indenização de R$ 68,6 milhões à Cargill. O valor foi calculado por perícia judicial, no âmbito de um processo que corre na 22ª Vara Federal de Brasília, no qual a multinacional americana pede indenização por benfeitorias realizadas em terminal de granéis sólidos e líquidos - conhecido como Tegran - na margem esquerda do porto.
Uma área que totaliza 39.600 metros quadrados foi arrendada pela companhia docas à Cargill, pela primeira vez, em dezembro de 1985. O contrato recebeu três aditivos e teve vigência até o fim de 2008, quando a Codesp finalmente conseguiu avançar no processo de licitação do terminal.
A Cargill reclama, na Justiça, o direito à indenização por obras civis e instalações marítimas que revertem ao patrimônio da União ao fim do contrato. São obras como acesso rodoviário pavimentado, um desvio ferroviário em bitola mista, máquinas e equipamentos. De acordo com a perícia, os investimentos feitos pela empresa somam R$ 184,3 milhões em valores atualizados, mas uma eventual indenização cai para R$ 68,6 milhões porque o restante foi depreciado. Ainda não há uma decisão a respeito.
O terminal, localizado no Guarujá, tem capacidade para armazenar 90 mil toneladas de grãos e embarcar até 2 mil toneladas por hora nos porões de navios. Pode receber 170 vagões ferroviários por dia, além de 270 caminhões.
Em 2009, o Tegran foi relicitado pela Codesp, com um novo prazo de arrendamento por 25 anos. Um consórcio formado pela própria Cargill e pela Louis Dreyfus venceu a disputa, com uma proposta de pagamento à vista de R$ 221 milhões. A Volcafé Ltda. ofereceu R$ 98,3 milhões e perdeu a licitação, mas recorreu judicialmente, apontando supostas falhas na proposta da concorrente. Em janeiro de 2010, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu a favor da Cargill e da Louis Dreyfus, acatando os argumentos de que uma suspensão da concorrência afetaria negativamente o agronegócio nacional - o porto de Santos escoa cerca de 30% de toda a soja exportada.
Apesar de continuar operando o terminal, a Cargill mantém a cobrança de indenização pelas benfeitorias feitas ao longo do primeiro contrato. Não está claro se ela poderá abater de seus pagamentos mensais à Codesp, pelo novo arrendamento do terminal, uma eventual indenização.
Procurada pelo Valor, a multinacional americana não se pronunciou até o fechamento desta edição. A Codesp informou "ter plena conviccção de que não cabe qualquer indenização" à Cargill, mas não entrou em detalhes.
Em Santos, outro problema diz respeito ao terminal de líquidos que era arrendado a Vopak desde 1986 e foi relicitado em maio deste ano. A Cattalini Terminais Marítimos venceu a VPK Participações, associada à Vopak, mas o Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região suspendeu a licitação da Codesp. Até agora, a Vopak continua operando o terminal.
Independentemente do resultado das ações judiciais, isso dá uma mostra das dificuldades que o governo encontrará se quiser levar adiante os planos de relicitar 98 terminais públicos arrendados à iniciativa privada antes da Lei dos Portos (8.630/93). "Esses dois casos indicam que a relicitação dos terminais pode ser não só complicada, mas gerar indenizações relevantes a serem pagas pelas companhias docas", avalia uma fonte do setor privado que acompanha as discussões.
De acordo com funcionários do governo, o tratamento a esses 98 terminais é a principal dúvida que ainda resta no desenho final do novo modelo de exploração dos portos, que será anunciado nas próximas semanas. Uma corrente do governo defende as relicitações. Essa ala é liderada pelo ministro-chefe da Secretaria de Portos, Leônidas Cristino. Outros representantes defendem uma forma de renovar os contratos desses terminais, exigindo um plano de investimentos em ampliação e modernização das instalações que estão arrendadas.
Uma das grandes preocupações é que muitos terminais são operados pela Petrobras ou por outras petrolíferas, podendo gerar problemas na distribuição de combustíveis, sobretudo no Norte e no Nordeste, dependendo do desfecho de eventuais relicitações.
Fonte: Valor / Daniel Rittner
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