Em 2022 os Portos do Arco Norte superaram pela primeira vez o Porto de Santos no volume de exportação de grãos e a tendência é a de que esses volumes aumentem ano a ano, se depender somente do agronegócio.
Entretanto, para que isso ocorra efetivamente, será necessário aumentar a infraestrutura logística disponível, em especial de armazenagem e transporte fluvial, uma vez que este é mais eficiente, sustentável e economicamente atraente do que o modal rodoviário.
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De fato, desde 2001 a infraestrutura de armazenagem (capacidade estática) é menor do que a produção de grãos nacional, o que se refletiu em perdas e nas filas intermináveis de caminhões à espera do momento do desembarque. Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) dão conta de que a capacidade de armazenagem de grãos no Brasil aumentou somente 76% no período entre 1980 e 2018, enquanto a produção cresceu 350%.
A defasagem é de fato ainda maior devido à sazonalidade, pois os números se referem à capacidade estática, que indica somente o volume de produto que pode ser armazenado, sem levar em consideração a capacidade dinâmica, que é a efetiva disponibilidade de armazenagem ao longo do tempo em diferentes localizações geográficas. Neste particular, os comboios de balsas de transporte fluvial de grãos e fertilizantes oferecem uma capacidade de armazenagem dinâmica muito mais atraente que os silos estáticos, dado que não ocupam necessariamente as áreas das propriedades rurais, nem as concorridas áreas de instalações portuárias.
Porém, neste período de taxas básicas de juros altíssimas, no qual o acesso a financiamento de infraestrutura de logística junto ao sistema bancário pode se mostrar proibitivo, é que a captação privada de recursos pode ser muito oportuna. Ou melhor, é nesse contexto de juros altos então que a Cédula de Produtor Rural (CPR) e o Certificado de Recebível do Agronegócio (CRA) surgem como alternativas de captação dos recursos necessários ao financiamento da ampliação e modernização da capacidade dinâmica de armazenagem para o agronegócio, em especial no Arco Norte.
Com efeito, a Lei Federal nº 14.421/2022 trouxe uma inovação e passou permitir que as empresas dedicadas à produção ou à comercialização de equipamentos de armazenagem tenha legitimidade para emitir CPRs, por meio de uma entidade autorizada pelo Banco Central do Brasil. Por sua vez, essas CPRs podem lastrear a emissão de CRAs por uma companhia securitizadora, que podem inclusive compor os ativos de um Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (FIAGRO), criado pela Lei Federal nº 14.130/2021, ampliando assim ainda mais as possibilidades de captação de recursos financeiros privados necessários à melhoria da infraestrutura logística de interesse do agronegócio.
De acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA), até abril de 2023, os FIAGROs atraíram mais de R$ 18 bilhões de ativos sob gestão, um aumento significativo em relação aos R$ 1,6 bilhão registrados em outubro de 2021, quando foram lançados. Isso representa um crescimento de mais de 1.025% em ativos sob gestão em apenas 18 meses.
Além do mais, os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o setor agroindustrial brasileiro continuou a expandir em 2022, com um aumento esperado de 2,5% no valor da produção agrícola. Crescimento este que deve continuar impulsionando a demanda por crédito no setor. Os resultados da safra de grãos 2022/2023, com projeções que chegam às 313 milhões de toneladas, confirmam a tendência identificada pela Confederação Nacional de Agricultura (CNA) de que a exportação de grãos pelo Arco Norte seguirá crescendo, num ritmo semelhante ao do período verificado entre 2009 e 2020 em que cresceu 487,5%.
Os dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) mostram que na navegação interior do Brasil foram transportadas 38.438.453 toneladas em 2022, um aumento de 5,36% em comparação a 2021, com destaque para as regiões hidrográficas do Amazonas do Araguaia-Tocantins, nas quais se verificou 76% do transporte fluvial do Brasil e onde houve um crescimento de 14,5% e 13,1% respectivamente da atividade.
Enquanto isso, de acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), o crédito fornecido pelo governo por meio do Programa Plano Safra em 2022 totalizou R$ 251,22 bilhões, um aumento de 14% em relação ao ano anterior. No entanto, esse valor ainda é insuficiente para atender à demanda por crédito no setor, estimada em cerca de R$ 850 bilhões.
Ou seja, os danos mostram que haverá uma demanda muito consistente para novas soluções de armazenagem e transporte fluvial ao longo de 2023 e nos anos seguintes, o que do ponto de vista do investidor é muito importante, pois sinaliza uma maior segurança no retorno do investimento feito nesses CRAs, CPRs e FIAGROs.
Não é por outro motivo que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), entidade reguladora do mercado de capitais brasileiro, está atenta ao crescimento do setor. Embora o agronegócio participe de 25% do Produto Interno Bruto (PIB), ocupa apenas cerca de 5% do mercado de capitais, com forte potencial de crescimento. No último mês de abril (18/4) a autarquia esteve presente no evento “O Agro e o Mercado de Capitais”, na feira Norte Show, em Sinop-MT, que é a principal feira do agronegócio da região, para apresentar as oportunidades disponíveis.
Há portanto, uma confluência positiva de fatores e, diante do forte e contínuo crescimento do setor agroindustrial no Brasil, é provável que o uso de crédito privado para a armazenagem e o transporte fluvial, através dos FIAGROs, CRAs e CPRs continue a aumentar, em especial como fonte alternativa de financiamento para o setor. Além disso, a presença de gestoras de recursos e bancos de investimento especializados cada vez mais no agronegócio facilitam o acesso a essas e outras operações mais estruturadas, permitindo que as empresas aproveitem ao máximo as oportunidades de crédito e investimentos.
Rafael Ferreira Filippin é advogado (OAB/PR nº 27.200) e sócio fundador da NFC Advogados rafael.filippin@nfcadvogados.com.br; Rodrigo Kredens Silva, é advogado e consultor jurídico da CGS Capital