A produção de petróleo no Brasil ocorre majoritariamente no mar, sustentada por uma vasta infraestrutura composta por plataformas, navios de operação e outras embarcações flutuantes. Como qualquer outro ativo, essas plataformas possuem uma vida útil limitada. Projeções indicam que muitas dessas estruturas estão se aproximando do fim de sua vida útil e precisarão ser descomissionadas nos próximos anos. Mas o que acontece quando essas plataformas chegam ao final de seu ciclo de vida?
O descomissionamento de plataformas de petróleo envolve o processo de desativação, desmontagem e remoção de instalações ao término de sua vida útil. A Baltic and International Maritime Council (BIMCO), uma organização privada do transporte marítimo internacional, estima que 95% de toda embarcação é reciclável. Uma vez tomada a decisão de descomissionar, é necessário seguir etapas rigorosas, começando pela preparação para o desmonte, que inclui o inventário de materiais, inspeções detalhadas, escolha do estaleiro e do método de desmantelamento.
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Globalmente, o descomissionamento de embarcações é marcado por métodos controversos. Muitos navios são desmontados em praias da Índia, Bangladesh e Paquistão, onde a segurança é frequentemente negligenciada, e são utilizadas mão-de-obra infantil e/ou análoga à escravidão. Além disso, essas estruturas contêm líquidos tóxicos e materiais perigosos que podem prejudicar o ecossistema local.
O desmanche é normalmente realizado por sucateiros internacionais, que adquirem a sucata das embarcações desativadas pelos grandes grupos econômicos, que, por não participarem diretamente do processo, “lavam as mãos” dos impactos ambientais e sociais decorrentes. Mais de 50 navios de armadores brasileiros foram vendidos para estaleiros de desmantelamento no sul da Ásia nos últimos 10 anos, contribuindo para esses impactos negativos.
Embora esse tipo de desmanche esteja se tornando obsoleto, ele ainda é adotado devido às suas vantagens econômicas e à menor rigidez nas regulamentações ambientais. Na Europa e nos Estados Unidos, são usados métodos mais seguros. No entanto, esses estaleiros não têm capacidade para atender toda a demanda mundial, abrindo espaço para os estaleiros brasileiros.
O mercado brasileiro apresenta inúmeras oportunidades para estaleiros nacionais. Há diversos navios, armadores e empresas internacionais que operam no mercado de óleo e gás no Brasil, muitos dos quais com equipamentos atingindo o final de sua vida útil. Muitos estaleiros estão operando abaixo de sua capacidade ou não estão em funcionamento, apresentando uma grande oportunidade para aquecer a demanda nacional por sucata de aço para reciclagem em usinas e empresas interessadas na gestão de resíduos. Portanto, é o momento perfeito para o Brasil impulsionar uma economia circular e criar empregos que contribuam para a preservação ou restauração da qualidade ambiental.
Existem apoios e incentivos fiscais durante a prestação de serviço no setor de óleo e gás, enquanto o poço está produtivo. Normas e regimes especiais, como o REPETRO e o DRAWBACK, garantem a redução e isenção de impostos na importação de equipamentos, sondas, plataformas e embarcações. Para enfrentar esses desafios, pode se tornarnecessário criar incentivos econômicos e fiscais por parte do governo brasileiro para que os estaleiros possam investir em suas estruturas e permitir a reciclagem segura e ambientalmente correta de navios e plataformas no Brasil. Isso garantiria a segurança dos trabalhadores, o controle de vazamentos de líquidos e a contenção de materiais perigosos, além do tratamento de resíduos durante o processo de reciclagem.
Embora já exista uma resolução sobre o descomissionamento de plataformas, a Resolução 817/2020, não há uma resolução focada no desmantelamento de embarcações que regule as atividades de desmonte e reciclagem no Brasil. Em razão da falta de clareza na legislação vigente, muitas empresas instaladas no Brasil optam por realizar o descomissionamento no exterior. Várias entidades, no entanto, apresentaram propostas que aguardam análise e aprovação pelas autoridades governamentais.
A implementação de uma cadeia de descomissionamento nacional robusta e sustentável pode fortalecer a indústria brasileira, aumentar a competitividade do país no cenário global e promover práticas ambientais responsáveis. Com o desenvolvimento de políticas e incentivos adequados, o Brasilpoderia se posicionar como um líder na economia circular do setor de óleo e gás.
Charles Lopes (esq) é mestrando em Administração no Ibmec Rio e gestor em Logística Internacional
Kenyth Freitas (dir) é doutor em Administração e professor no Mestrado do Ibmec-RJ