Os dados oficiais de setembro de 2021 do Governo Federal mostram um crescimento das importações brasileiras de 26,7% em Agropecuária, que somou US$ 0,42 bilhões; 262,4% em Indústria Extrativa, que chegou a US$ 1,12 bilhões e, crescimento de 57,1% em Indústria de Transformação, que alcançou US$ 17,80 bilhões.
Isso significa um ingresso cada vez maior de mercadorias nos portos e aeroportos brasileiros que, salvo as que são transportadas a granel, vêm geralmente acondicionadas em contêineres, apoiadas em cima de suportes e envolvidas em embalagens e calços de madeira.
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Segundo as Normas Internacionais de Medidas Fitossanitárias (NIMF) nº 15 vigentes, editadas no âmbito da Convenção Internacional para a Proteção dos Vegetais, da qual o Brasil é signatário (cf. Decreto Federal n. 5759/2006, pelo qual foi promulgado o texto aprovado na 29ª Conferência da ONU para Agricultura e Alimentação – FAO, em 17 de novembro de 1997), é absolutamente necessário controlar a entrada no país de produtos vegetais, como a madeira de suportes, calços e embalagens, para evitar a proliferação mundial de pragas que ameaçam a biodiversidade local.
Essas normas estão reguladas no nível nacional no art. 46, §3º, da Lei Federal nº 12.715/2012, com redação dada pela Lei Federal nº 13.097/2015, a qual prevê, em sintonia com as normas internacionais, duas alternativas para as madeiras que se encontram sem o carimbo e o atestado de tratamento feito no país de origem da carga: a destruição, ou a devolução ao país de origem.
De fato, a devolução é um procedimento não só custoso financeiramente, mas que, na prática, é muito difícil e burocrático de providenciar, na medida em os países de origem não aceitam receber essas madeiras de volta e os transportadores se recusam a levá-las sem que haja essa aceitação expressa. Assim sendo, a alternativa mais viável, usualmente, é a destruição das madeiras sem carimbo ou atestado válido de tratamento fitossanitário.
No entanto, desde a publicação da Instrução Normativa nº 32/2015 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a alternativa da destruição das madeiras sem carimbo ou atestado válido estava severamente dificultada, o que levou a uma judicialização de inúmeros casos por todo o país. Com efeito, o Poder Judiciário tem reconhecido reiteradas vezes desde então o direito dos importadores à destruição dessas madeiras, em sucessivas decisões liminares e de mérito, tanto na primeira, quanto na segunda instância.
Pois bem, é nesse contexto que a Secretaria de Defesa Agropecuária do MAPA publicou a Portaria nº 385/2021, em 25 de agosto, na qual enfim regulamentou o procedimento de destruição dessas madeiras, em linha com as normas em vigor tanto no nível internacional quanto no nível nacional. Ela estabelece uma séria de normas que abrangem não só os prestadores do serviço de destruição e destinação final adequada, como também os tomadores desses serviços, isto é, os importadores, além dos terminais e armazéns onde as mercadorias e suas embalagens ficam durante o desembaraço aduaneiro e regulatório.
É certo que, tanto esses prestadores de serviços, quanto os terminais e armazéns já tinham a obrigação de estar credenciados e habilitados junto ao MAPA, segundo a dicção da Instrução Normativa nº 39/2017, mas a nova portaria reitera essa obrigatoriedade e estabelece uma série de novas exigências.
Por exemplo, segundo o texto da Portaria nº 385/2021 do MAPA (art. 28), os prestadores do serviço de destruição de embalagens e suportes de madeira devem dispor de unidades de destruição fixa ou volante posicionadas em área sob controle aduaneiro de desembaraço da mercadoria. Por sua vez, os terminais portuários e aeroportuários, além dos armazéns alfandegados, devem disponibilizar uma área restrita, identificada e delimitada para essa atividade, que permita a segregação desses materiais e que deve ser hermeticamente fechada para a segregação, recepção e armazenamento do resíduo gerado durante a destruição, até que seja encaminhado para destinação final.
A propósito, essas exigências estão em linha com o que consta no item 25.3.2 na Norma Regulamentadora nº 25 (com redação dada pelas Portarias SIT nº 227 e 253/2011) que regulamenta a matéria de saúde e segurança dos trabalhadores que laboram nesses locais e determina que sejam devidamente treinados para tais atividades (item 25.5).
Além disso, a Portaria nº 385/2021 do MAPA responsabiliza pessoalmente os administradores de armazéns e terminais pelo cumprimento dessas exigências (Art. 91, §1º e §2º), o que recomenda que tenham um especial cuidado em relação à documentação relativa a esse tema, de modo que possam demonstrar o compliance que lhes cabe. Aliás, todos os agentes envolvidos, sejam prestadores de serviços, sejam terminais ou armazéns, devem se adaptar a essas exigências dentro do prazo de 180 dias, o que é essencial para se evitar infrações administrativas, conforme previstas no art. 98.
Por outro lado, até que todos esses agentes estejam adaptados às novas regras, o MAPA segue impondo aos importadores a obrigação de devolver ao exterior as embalagens, calços e suportes de madeira que não ostentem o carimbo/marca NIMF 15. Por isso, pode vir a ser necessário o recurso ao Poder Judiciário para que os importadores possam exercer o seu direito de destruir esses suportes de madeira enquanto todos os agentes se adaptam à nova realidade.
Enrico Miguel Nichetti é advogado, coordenador do Departamento de Direito do Trabalho da Andersen Ballão Advocacia, especialista em Direito do Trabalho Portuário.
Maicon Carlos Borba é advogado, coordenador do Departamento de Direito Aduaneiro da Andersen Ballão Advocacia, especialista em Direito do Comércio Exterior.
Rafael Ferreira Filippin é advogado, coordenador do Departamento de Direito Público da Andersen Ballão Advocacia, doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento.