A nova modalidade do Recof introduzida pela Instrução Normativa RFB nº 1.612/16: vantagens e desvantagens de adotar o “novo” Recof em substituição ao Drawback
Tanto o Regime de Entreposto Industrial sob Controle Aduaneiro Informatizado – RECOF , quanto o Regime de Drawback , são regimes aduaneiros especiais que representam mecanismos destinados a viabilizar a interferência do Poder Público na economia nacional por razões extrafiscais relevantes, tendo, neste caso, como objetivo primordial, o fomento às exportações de produtos, bem como o desenvolvimento da indústria nacional.
O regime de drawback foi introduzido através do Decreto-Lei nº 37/66, já o Recof foi criado por meio do Decreto nº 2.412/97 e, apesar de terem sido instituídos em momentos distintos, ambos sempre guardaram vasta semelhança, seja em razão da convergência dos objetivos pretendidos com a criação dos mesmos, sejam pelos instrumentos elaborados para garantir a operacionalidade e eficácia da implementação destes em meio ao regime jurídico-comercial brasileiro vigente.
PUBLICIDADE
Ocorre que, não obstante a semelhança existente entre ambos os regimes ora analisados, o drawback sempre foi, desde a sua criação, o regime aduaneiro especial mais utilizado pelos contribuintes brasileiros no que tange a incentivos fiscais criados para fomentar a exportação.
Apenas a título de informação, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – MDIC estimou que, apenas no mês de dezembro de 2015, as exportações amparadas pelo drawback atingiram US$ 5,3 bilhões, correspondendo a 31,3% do total exportado neste mês (US$ 16,8 bilhões). E de janeiro a dezembro de 2015, as exportações amparadas pelo drawback atingiram US$ 48,3 bilhões, montante correspondente a 25,2% do total exportado pelo país no período .
Diante de tais dados, torna-se quase inevitável à formulação da seguinte indagação: “Quais são as razões e os motivos que fazem com que a adoção do drawback tenha sido considerada mais vantajosa à adoção do Recof ao longo de todos esses anos?”.
Por óbvio, a resposta a esta pergunta se encontra nas pequenas especificidades inerentes a cada um destes regimes, que, se ambos fossem inteiramente idênticos, não haveria qualquer fundamento capaz de justificar a sua dupla existência.
No entanto, após a análise detalhada de ambos os regimes, a conclusão a que se chega é que a resposta à indagação formulada decorre de três características principais, quais sejam: (i) a natureza das operações que são abrangidas pelo Recof; (ii) os requisitos instrumentais previstos para tanto; e (iii) a necessidade de o beneficiário ser previamente habilitado ao “Despacho Aduaneiro Expresso” (Linha Azul) para, só então, requerer a sua habilitação ao Recof.
Em relação ao primeiro ponto, cabe esclarecer que a utilização do Recof era limitada a apenas alguns setores, como, por exemplo, o automotivo, o aeronáutico, de informática e semicondutores, enquanto para utilização do drawback, bastava que as empresas fossem industriais ou comerciais, tornando-se este último regime, portanto, capaz de atrair outros setores não contemplados pelo primeiro.
Além disso, para que o contribuinte pudesse se habilitar ao Recof, era necessário que este implementasse um sistema de ERP homologado pela RFB – que possibilitasse a interligação do controle das mercadorias submetidas ao regime com os sistemas informatizados de controle da RFB – o que acabava por exigir do contribuinte um elevado investimento para que pudesse, então, se beneficiar do regime.
Por fim, a RFB também exigia, como requisito para que o interessado pudesse se beneficiar do Recof, que este estivesse previamente habilitado ao “Despacho Aduaneiro Expresso” (Linha Azul), fato que tornava a habilitação ao Recof muito mais burocrática e dispendiosa.
Isso porque, para requerer a habilitação à Linha Azul, a Instrução Normativa SRF nº 476/04 determinava o cumprimento de diversas exigências e requisitos, como, por exemplo, possuir patrimônio líquido igual ou superior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), apresentação de relatório de auditoria, demonstração de ter realizado, no mínimo, 100 (cem) operações de comércio exterior cujo somatório represente montante igual ou superior a R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais) etc.
Ressalte-se que não pretendemos aqui afirmar que o regime de drawback prescinde de quaisquer entraves ou defeitos para sua fruição, pois tal afirmação, de certo, não seria verdadeira. O objetivo aqui é apenas elucidar as principais razões para que os contribuintes, na prática, tenham preferido, em geral, aplicar o drawback, em deterimento do Recof:
Diante do exposto, passemos à breve análise da nova modalidade do Recof – o Recof-Sped – criado através da Instrução Normativa RFB nº 1.612/16, e suas potenciais implicações sobre o cenário descrito acima.
O Recof-Sped foi criado com o objetivo de ampliar o acesso ao “antigo” Recof, resultando, simultaneamente, no aperfeiçoamento do regime e dos mecanismos tributários de apoio às exportações, sendo tal pretensão um dos pilares do Plano Nacional de Exportações 2015-2018, conforme divulgado pela RFB.
Adicionalmente, de forma a esclarecer os instrumentos a serem utilizados para viabilizar a fruição do regime, foi publicada em 08 de julho de 2016, a Portaria COANA nº 47, que dispõe sobre os procedimentos para habilitação e fruição do novo Recof-Sped, dando efetividade à nova modalidade de Recof.
Sob a perspectiva material, o Recof-Sped concede, basicamente, os mesmos benefícios do regime anterior, sendo o seu diferencial a simplificação de procedimentos e redução do custo de implementação e manutenção do regime.
Isso porque, ao contrário do antigo regime, o Recof-Sped requer apenas que o beneficiário realize os devidos registros nos seus livros contábeis digitais (Sistema Público de Escrituração Digital – Sped), o que não representa um custo adicional aos contribuintes, visto que já faz parte das obrigações normais dessas empresas.
A exigência de criação de sistema próprio de controle fazia com que as empresas, principalmente as de médio e pequeno porte, nem cogitassem a aplicação do Recof, tendo em vista a incapacidade de suportar os custos de tal implementação, motivo pelo qual o campo de aplicação do Recof acabou se revelando restrito desde a sua criação.
Cabe esclarecer que, mesmo antes da criação do Recof-Sped, já havia sido publicada a Instrução Normativa RFB nº 1.559/15 que, segundo a RFB, representou a primeira etapa do projeto de evolução do Recof.
Tal normativo flexibilizou alguns critérios para adesão, tais como a redução do patrimônio líquido exigido, que passou de R$ 25 milhões para R$ 10 milhões, o fim da obrigatoriedade de habilitação prévia na Linha Azul (Despacho Aduaneiro Expresso) e a redução no volume mínimo anual de exportações exigido, que passou de US$ 10 milhões para US$ 5 milhões.
Diante de todo o exposto, e considerando todas essas modificações ocorridas no Recof, cabe a pergunta: continuaria o drawback sendo o regime especial aduaneiro mais benéfico aos exportadores?
Em nossa percepção, ainda é cedo para afirmar se, de forma geral, as inovações trazidas pelo Recof-Sped farão com que este regime se torne mais atraente do que o drawback, mas decerto já se pode afirmar que o Recof-Sped deverá, a partir de agora, ser considerado em detida análise pelos contribuintes que utilizam apenas o drawback na execução de suas operações.
Isso porque, sem dúvidas, as inovações trazidas pelo Recof-Sped o tornarão alternativa mais interessante ao menos para parte dos contribuintes, sobretudo em face das também severas críticas sofridas pelo drawback no que se refere às condições e controles por ele exigidos.
Tiago Severini e Paloma Amorim são advogados especializados em matéria aduaneira do Vieira Rezende Advogados.