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Privatização do Porto de Santos - breves considerações

Muito se tem falado nos meios portuários sobre a privatização das várias companhias docas e, em especial, da Codesp – Companhia Docas do Estado de São Paulo que a partir das últimas administrações passou a ser designada de “SPA – Santos Port Authority”.

Duas considerações importantes se fazem necessárias para melhor compreensão da problemática envolvendo a privatização de Santos, uma de ordem regulatória e outra de ordem prática operacional.


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A primeira de ordem regulatória/institucional. A privatização em tela deve ser vista como espécie do gênero descentralização pois além da privatização podemos ter, também, outras formas de descentralização que resulte na retirada gradual da tutela direta do poder central sobre as operações portuárias regionais.

Claro, em decorrência dos artigos 21 e 22 da Constituição, a União continuará como o poder de supervisionar e legislar sobre matérias portuárias, mas a própria CF/88 oferece flexibilidade em relação a esse poder, o que abre um campo enorme de possibilidades para a descentralização.

Aqui, permitimo-nos saudar o governo federal que compreende que nada justifica os portos permanecerem sob a tutela direta do poder central em Brasília.

A segunda consideração, de ordem prática operacional, é que a maior parte da movimentação de cargas no Porto de Santos já é privatizada, efetuada seja por terminais públicos arrendados à iniciativa privada ou seja ainda por intermédio de terminais de uso privado (TUPs) que são aquelas instalações portuárias localizadas fora da área do porto organizado. Falaremos mais adiante sobre essa questão (jabuti) “porto organizado”.

Assim, em decorrência, estamos falando da privatização ou desestatização das administrações portuárias pois esse é, praticamente, o único setor que faltou para ser privatizado.

É sobre essa questão que passamos a tecer abaixo esses breves comentários que lançamos como teaser para discussão.

Qual o perfil que desejamos para essa nova entidade que irá administrar o complexo portuário de Santos? Cito apenas 7 (sete), a título exemplificativo.

(a) Total independência em relação aos atuais e futuros operadores portuários a fim de se evitar decisões que venham a privilegiar esse ou aquele player ou ainda, criar barreiras à entrada de novos operadores;

(b) Independência em relação a ingerências políticas-partidárias;

(c) Visão macro para compreender que a hinterlândia do porto santista abrange vários estados que dependem de Santos para escoamento das produções agrícolas e industriais. É sabido que fluxo de cargas traz desenvolvimento regional, assim acreditamos que não correremos o risco grande de a futura administração criar empecilhos para o escoamento de cargas advindas de outras regiões do país;

(d) Capacidade para atuar como poder moderador em caso de eventuais conflitos entre os operadores;

(e) Tenha experiência em logística e intermodalidade pois porto é apenas um elo de uma cadeia que, para funcionar bem, precisa de interação com os modais ferroviário e/ou rodoviário. Parece óbvio, mas a verdade é que são poucos governos regionais que têm essa percepção. Que o diga os representantes das entidades privadas com assento nos CAPs.

(f) Liberdade para empreender e promover outras atividades, além das portuárias, nas respectivas áreas de administração; e

(g) Seja assegurada fluxo de recursos financeiros suficientes para levar adiante os planos de desenvolvimento. Tudo o que não queremos é uma entidade falida que para se capitalizar venha a ser obrigada a abrir mão da sua independência.

Temos consciência que estamos a exigir muito da futura administração, descentralizada, mas também sabemos que não estamos propondo o equivalente a solução de um sistema de 2 equações com 3 incógnitas pois outros países já enfrentaram problemas semelhantes e conseguiram resolver a contento. Citamos abaixo alguns modelos de administração possíveis.

Tomemos por exemplo os Estados Unidos. Lá temos o sistema dos “Port Authority”, entidade formada por representantes da sociedade civil, entidades privadas e autoridades públicas municipais e estaduais. É possível criar algo semelhante no Brasil? Sim, mas não no momento político atual que vivemos no país. Mas podemos usar aquele modelo como “benchmark” e aproveitar, no que couber, aquela experiência.

Outra possibilidade é uma entidade 100% privada sair vencedora da licitação. Mas aí, surge outra questão: como evitar que que essa entidade venha a ser absorvida por operadores portuários locais e aí, comprometer sua independência? Não temos resposta a essa questão.

Vejam, estamos falando de um modelo de concessão que não guarda paralelo com nada do que se fez, até agora, no país. Nos outros modais submetidos a privatização, rodoviário e aeroportuário, por exemplo, o concessionário vencedor é administrador e, ao mesmo tempo, operador. Aqui, na área portuária, o concessionário vencedor deverá ser administrador, mas nunca o operador, pelas razões acima citadas.

Por fim, por que não criar uma empresa com ações na bolsa e garantir a capitalização e pulverização do controle acionário? Algo também para se pensar. No mundo temos hoje duas coisas em abundância, infelizmente: dinheiro e pobreza convivendo, lado a lado. Já imaginaram um IPO lançado na Bolsa de NY para o Santos Port Authority? Sucesso garantido! O maior problema dos investidores endinheirados no mundo é onde investir e o maior exemplo disso é que eles aceitam investir em títulos do governo alemão, por exemplo, que oferecem juros negativos. Ou seja, o investidor paga para manter a custódia dos seus ativos com o fito de dar segurança aos seus investimentos.

Prometemos acima falar sobre o “jabuti” dos portos organizados. Muito rapidamente, porto organizado é tudo aquilo que se encontra dentro de uma poligonal traçada pelo governante. Assim, todas as atividades que que se encontram dentro do porto organizado submetem-se a regimes jurídicos operacionais totalmente distintos daquelas atividades situadas fora da poligonal. Mas amanhã, essa poligonal pode ser totalmente alterada pelo novo governante. E qual a justificativa para essas poligonais? Hoje, nenhuma! Apenas contribui para criar polêmicas envolvendo “assimetrias concorrenciais” entre as operações que estão dentro e aquelas localizadas fora da poligonal. Em todo caso, essa é uma questão que precisa ser solucionada para poder dar segurança às novas entidades privatizadas.

Encerramos por aqui essas breves considerações na esperança de ter contribuído, ainda que minimamente, para as discussões sobre privatização das Companhias Docas no país.

24 de junho de 2021.

Elias GedeonElias Gedeon é engenheiro civil/UFBA e advogado/PUC/SP

 

 

 

 

 

 

 

 

 






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