A Agência Nacional do Petróleo (ANP) realiza, amanhã, um novo leilão pelo modelo de oferta permanente - modalidade que funciona como uma espécie de oferta “on demand” de áreas de óleo e gás. Esta será a primeira licitação da ANP desde a eclosão da pandemia de covid-19 e a única rodada marcada para 2020, no Brasil, em meio ao choque de preços do petróleo que levou empresas a cortarem investimentos e o governo brasileiro a adiar o calendário de leilões.
A oferta permanente consiste num mecanismo pelo qual a ANP coloca à disposição do mercado, permanentemente, um pacote de ativos para compra sob demanda - incluindo campos de baixa produção (devolvidos à União) e blocos exploratórios ofertados sem sucesso em rodadas anteriores. Atualmente, o cardápio contém 708 blocos, dos quais 327 vão, de fato, a leilão nesta sexta-feira.
PUBLICIDADE
Pelas regras, as empresas podem, a qualquer momento, manifestar interesse pelas áreas disponíveis. Confirmado o interesse, a ANP convoca uma sessão pública de ofertas, para que outras empresas possam competir. A agência inaugurou a modalidade em 2019 e promove, agora, o que ela chama de 2º ciclo da oferta permanente.
As petroleiras poderão fazer, amanhã, propostas por 327 blocos exploratórios e dois campos inativos (Juruá/AM e Miranga Leste/BA), em dez bacias terrestres (Amazonas, Paraná, Potiguar, Recôncavo, Sergipe-Alagoas, Solimões e Tucano) e marítimas (Campos e Santos). No Espírito Santo, haverá opções tanto offshore quanto onshore. Isso não quer dizer que todos esses 329 ativos sejam cobiçados, já que a ANP leiloa não só aqueles blocos pelos quais houve interesse, mas todas as áreas que estão dentro da mesma região de um bloco desejado.
Com base no bônus de assinatura mínimo, se todos os 329 ativos que vão a leilão esta semana forem arrematados, a União poderá arrecadar R$ 297,5 milhões - patamar baixo, se comparado aos bônus bilionários das rodadas do pré-sal. A hipótese de que todas as áreas sejam arrematadas, porém, é pouco provável. O grande mérito da oferta permanente, no entanto, não está na arrecadação, mas no seu potencial de atrair investimentos, sobretudo para as áreas em terra.
Ao todo, 63 empresas estão inscritas - o que também não quer dizer que todas elas participarão ativamente, já que elas se inscrevem não para uma sessão específica, mas para um cadastro permanente. A ANP espera que, a exemplo da primeira edição, de setembro de 2019, as pequenas e médias petroleiras, com foco em terra, assumam o protagonismo.
“Considerando que teremos em 2021 a 17ª Rodada de concessões e, possivelmente, a 2ª licitação dos volumes excedentes da cessão onerosa, algumas empresas, notadamente as ‘majors’ [as gigantes], podem direcionar seus investimentos para as futuras licitações. Entretanto, não descartamos a participação de grandes empresas nesse certame [com foco em mar]”, destacou a ANP, em nota.
O presidente da empresa EnP, Márcio Félix, diz que a oferta permanente tende a atrair o interesse de parte dos compradores dos campos maduros da Petrobras, em águas rasas e em terra. “Pode ser que esses produtores olhem ao redor dos ativos que compraram e adquiram blocos exploratórios no entorno deles”, afirmou Félix.
A oferta permanente foi concebida de olho na abertura da indústria, proporcionada pelos desinvestimentos da Petrobras. Desde 2019, novos produtores despontaram no Brasil, como a Trident Energy, Perenco, 3R Petroleum, Karoon e Karavan Oil. Félix confirmou ainda que a EnP, também estreante, vai participar do leilão.
Outra petroleira que monitora a oferta permanente é a Karoon. A australiana comprou da Petrobras o campo de Baúna, no pós-sal de Santos, e mira oportunidades próximas ao novo ativo. “O ideal seria termos uma estratégia exploratória ao redor da plataforma de Baúna. Então, conforme a produção do campo caia nos próximos anos, poderemos conectar novas descobertas”, disse o diretor-geral da Karoon para a América do Sul, Tim Hosking, ao Valor, em novembro.
Já a Eneva é candidata a comprar Juruá - campo inativo da Bacia do Solimões, no Amazonas, mesmo Estado onde a empresa desenvolve o projeto de gás de Azulão, comprado da Petrobras. “Com certeza olhamos com interesse tanto as áreas no entorno de onde atuamos, como outras. [Juruá] está num Estado onde a companhia já vem desenvolvendo projetos, então é dever de ofício analisarmos”, disse o vice-presidente de exploração e produção da Eneva, Lino Cançado, em novembro.
O secretário-executivo da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo (Abpip), Anabal Santos Jr., acredita que, mesmo num cenário de cortes de investimentos no setor, a oferta permanente deve atrair interessados. “Não acredito que a oferta permanente será um sucesso retumbante, nem um fracasso. Os bônus, menores, também abrem espaço para que empresas menores se posicionem”, comentou.
Entre as grandes petroleiras, há dúvidas sobre a disposição delas de entrar na rodada, em meio a um ano de cortes nos orçamentos. Em evento on-line, esta semana, a diretora de operações da Repsol Sinopec no Brasil, Lorena Dominguez, afirmou que, diante da transição energética para uma economia de baixo carbono e dos compromissos vultosos assumidos nos leilões dos últimos anos, no Brasil, a expectativa é que haja “um pouco de desaceleração” das empresas nas rodadas futuras no país.
Fonte: Valor