Depois de dois dias de reuniões, os governos do Brasil e da Argentina chegaram a um impasse nas tentativas de derrubar as barreiras mútuas que impuseram ao comércio bilateral. As licenças não automáticas de importação serão mantidas como estavam e os dois países se comprometeram a retomar as discussões em até duas semanas, em São Paulo ou no Rio de Janeiro. "Não houve avanço prático de curto prazo", resumiu o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Alessandro Teixeira.
Ele admitiu que, para os exportadores brasileiros prejudicados pelo estouro argentino no prazo de liberação das licenças, a situação permanece relativamente igual. Os dois lados ficaram de "liberar gradualmente" as licenças que estão pendentes, mas evitaram se amarrar a prazos, quantidades ou valores. Insistiram na necessidade de ter "gestos de boa vontade" um com o outro. E foi só. "Gestos não são acordos", esclareceu Teixeira.
O secretário de Indústria da Argentina, Eduardo Bianchi, pediu a retirada das licenças não automáticas adotadas pelo governo brasileiro para veículos importados. Cerca de 7 mil automóveis argentinos são enviados ao mercado brasileiro todas as semanas. No início da tarde, já havia ficado claro para os negociadores que um acordo era impossível. Para ceder, o Brasil tentou arrancar uma medida concreta dos argentinos. Deixou claro que não se satisfazia com o eventual compromisso de liberar as licenças em 60 dias. Esse é o prazo que a Organização Mundial do Comércio (OMC) permite para a análise do documento, mas vem sendo descumprido seguidamente pela Argentina. Negociadores brasileiros mencionaram o caso de produtos que aguardam licenças há 450 dias.
Diante do impasse, Bianchi chegou a deixar a reunião para conversar a sós com a ministra Débora Giorgi, sua chefe, na tentativa de obter sinal verde para avançar. Enquanto isso, um funcionário argentino comentava, com ar de decepção: "A cada episódio como esse, há uma deterioração no grau de barreiras comerciais que aplicamos uns aos outros." Cerca de uma hora depois, houve apenas o compromisso vago de mais celeridade na liberação das licenças. "Não podemos perder o sentido de proporcionalidade", disse um integrante da delegação brasileira, explicando que o governo só pretende retirar a barreira aos automóveis quando a Argentina tiver algo melhor para oferecer.
Ao sair da reunião, Teixeira se esforçou em minimizar a falta de entendimentos com os argentinos. "Não estabelecemos um pré-acordo para vir à reunião. O compromisso de ambos os países é que o comércio não seja freado", disse. Ele informou que voltará a encontrar-se com Bianchi em até 15 dias, com uma pauta que incluirá temas como o desvio de comércio a mercadorias chinesas, integração das cadeias produtivas e harmonização de dados estatísticos. Houve divergências em números usados nos setores de equipamentos agrícolas e de linha branca.
De acordo com Teixeira, o licenciamento não automático de veículos está mantido por prazo indeterminado, com a promessa de "ficar dentro dos 60 dias (de análise)". Ele insistiu em que a medida foi adotada para monitorar o aumento das importações de automóveis como um todo, não apenas da Argentina, mas de fornecedores como Coreia e China. Contrariou, assim, até mesmo o que foi dito pelo assessor de assuntos internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, quem havia admitido que as licenças foram uma "minirrepresália" às barreiras argentinas. Calçados, pneus e baterias são os setores mais afetados das exportações brasileiras ao país vizinho.
Fonte: Valor Econômico/Daniel Rittner | De Buenos Aires
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