O mapa dos investimentos globais pode estar mudando novamente, depois de a China tornar-se o parque industrial do planeta. Os custos de produção deram uma guinada nos últimos dez anos, colocando em xeque premissas que já se estavam cristalizando em dogmas. Fabricar um produto nos Estados Unidos continua sendo mais caro que na China, mas agora bem pouco. Estados Unidos e México são as estrelas em ascensão de estudo do Boston Consulting Group sobre competitividade da produção em 25 países exportadores de manufaturados, responsáveis por 90% da oferta global. O Brasil não vai bem na comparação e está entre os países "sob pressão", ao lado da China, Rússia, Polônia e República Checa. A desvantagem competitiva tornou-se aguda a ponto de os custos de produção no país serem hoje 23% superiores ao dos EUA (Valor, 29/4).
A consultoria considerou no estudo a evolução dos salários, da produtividade, as variações cambiais e os custos de energia. Todos eles pesaram contra o Brasil. No período considerado, os salários dobraram na indústria, o câmbio se valorizou em 20%, o custo da eletricidade aumentou 90% e o do gás, 60%. A produtividade, porém, chama a atenção, com crescimento de apenas 3%, diante da média de 27% dos 25 países. A consultoria mediu a "produtividade absoluta", levando em consideração a produção manufatureira bruta por trabalhador e o valor adicionado por trabalhador. Se pode ser um consolo, há países em pior situação competitiva, como a Austrália, cuja diferença de custos com os EUA é a maior (30%) e a França (24%).
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Apesar de seis entre os dez países com custos industriais mais competitivos estarem na Ásia, há hoje dispersão geográfica das boas oportunidades de investimento, com disparidades significativas dentro dos continentes e não só entre eles. O Reino Unido é o país que produz com menor despesa na Europa Ocidental, mantendo constante sua diferença em relação aos EUA, ao lado da Holanda. Por outro lado, França, Itália, Bélgica e até a Alemanha foram ficando para trás. Os países do Leste Europeu evoluíram e alcançaram custos comparáveis ao da produção americana.
Na América Latina, enquanto o Brasil teve sua posição erodida gravemente, o México brilhou. Segundo o BCG, o país hoje é mais competitivo que a China - seus custos correspondem a 91% dos dispêndios de produção nos EUA, diante dos 96% dos chineses. Na China, os custos trabalhistas quase triplicaram (187%), enquanto que os preços do gás aumentaram 138% e o da energia, 66%.
O avanço de EUA e México na competitividade industrial se deve ao crescimento bem abaixo da média dos salários (27% nos EUA ante 71% da média dos 25 maiores exportadores) e à impressionante queda dos custos da energia, causada pela revolução do gás de xisto. Por isso, a pesquisa da BCG necessita de qualificações. O preço do gás natural americano é hoje um terço do europeu e um quarto do asiático. Por isso, enquanto caiu 25% nos EUA (e, por tabela, no México), quase dobrou nos demais exportadores considerados, que tiveram alta média de 98%.
Ainda que essa vantagem seja real, ela é tão grande que pode desfocar a comparação dos outros indicadores. Há, além disso, dúvidas se o recém-conquistado baixo custo da energia nos EUA pode ser considerado uma mudança estrutural nos preços de produção do país ou se é fator reversível a médio prazo. Da mesma forma, a evolução dos salários nos EUA foi contida por uma enorme recessão e uma recuperação cambaleante, algo absolutamente fora dos padrões. Já os salários subiram mais nos países emergentes, que cresceram no período a altas taxas e puxaram no início a recuperação mundial.
Ainda que o peso da energia amplie a vantagem americana, a comparação dos custos mostra que países baratos para a produção deixaram de sê-lo, o que é especialmente preocupante para o Brasil. A conta de anos seguidos de valorização cambial chegou e a indústria pagou o mais pesado preço. A esmagadora maioria dos concorrentes que exportam manufaturados estão em melhor situação que o Brasil, pelo estudo da BCG. E ele não considera outras desvantagens brasileiras, como uma precária infraestrutura e uma carga tributária avantajada. O retrato traçado pela consultoria reforça o diagnóstico de grande parte dos analistas domésticos: do aumento da produtividade depende crucialmente a performance futura do país.
Fonte: Valor Econômico